Como Lula e Bolsonaro fortaleceram o Centrão do STF
“Jair Bolsonaro é a cortina de fumaça do sistema” foi o título do meu artigo publicado em 10 de agosto de 2021, mais de um ano antes da eleição vencida por Lula. O mercado da comunicação estava dividido entre...
“Jair Bolsonaro é a cortina de fumaça do sistema” foi o título do meu artigo publicado em 10 de agosto de 2021, mais de um ano antes da eleição vencida por Lula.
O mercado da comunicação estava dividido entre a ala lulista, que só apontava o perigo da extrema-direita, e a ala bolsonarista, que só apontava o perigo do Tribunal Superior Eleitoral. A realidade, no entanto, não era binária.
A dupla Gilmar Mendes e Arthur Lira comandava no STF e na Câmara dos Deputados, com apoio de Dom Bolsonaro del Centrão, o desmantelamento do combate à corrupção e o fortalecimento do toma lá dá cá, enquanto posava de defensora “da moderação e da democracia” diante dos arroubos do então presidente contra urnas eletrônicas, Alexandre de Moraes, Luis Roberto Barroso e moinhos de vento.
Bolsonaro, com seu filho Flávio denunciado, já havia buscado “aliança, café e pizza com Dias Toffoli e Gilmar”, garantindo blindagem mútua contra a CPI da Lava Toga e investigações de peculato, não sem distribuir boquinhas a aliados dos ministros, como André Mendonça e José Levi, no governo; ao primo do decano, Francisval Dias Mendes, na Secretaria Nacional do Consumidor, do Ministério da Justiça; e ao advogado dele, Rodrigo de Bittencourt Mudrovitsch, em grupo da Corte IDH.
“A frente ampla pela impunidade une a família Bolsonaro, Lula, outros petistas, velhos tucanos, o Centrão e alas de tribunais superiores e da imprensa, mas ataques ostensivos e caricaturais ao processo democrático, não. Por isso, Dom Bolsonaro – o presidente que mais paga emendas ao Congresso (41,1 bilhões de reais) e o que menos aprova projetos (83) – é a cortina de fumaça ideal da velha política e de seus protetores. Porque, quixotesco, ele ataca, por fora, o sistema que ele próprio fortalece por dentro.”
O tempo só confirmou que o sistema fortalecido por Bolsonaro foi usando cada vez mais a cortina de fumaça fornecida por ele e potencializada pelo 8 de janeiro para encobrir seus escambos transinstitucionais, aceitos como arranjos naturais da democracia ou tolerados como compensação devida pelo seu alegado salvamento.
Em 31 de maio de 2023, resumi no X o primeiro ano do quinto mandato petista: “Os ministros responsáveis pela ‘articulação política’ do governo Lula são do Supremo.”
De lá para cá, frisando que o oposto do golpe de Estado não é o conchavo, fiz outras análises dos lobbies entre Lula e STF, apontando as nomeações de aliados de Moraes no TSE, de Gilmar no Cade, de ambos na PGR e de Kassio Nunes Marques no TRF-1, bem como a atuação governista do Supremo, por exemplo contra a lei das estatais.
O empresariado não ficou de fora do jogo. No artigo “O eixo Lula-Joesley-Lewandowski”, publicado em 11 de dezembro, afirmei que “Joesley Batista sabe escolher advogados, consultores e juízes. Quem paga caro é o Brasil.” Nove dias depois, Dias Toffoli entrou no eixo, decidindo aliviar a multa de R$ 10,3 bilhões da J&F, que, além de contar com o ministro aposentado Ricardo Lewandowski como parecerista, conta com a esposa do próprio Toffoli, Roberta Rangel, em seu quadro de advogados.
Em agosto, o ministro do STF havia votado a favor da possibilidade de juízes julgarem casos de clientes de suas esposas, o que fora descrito pela ex-ministra do STJ Eliana Calmon, no Papo Antagonista, como o “acasalamento perfeito” entre poder econômico no escritório e político no Judiciário. Em 2018, Crusoé já havia publicado uma matéria de capa, “A mesada de Toffoli”, apontando que sua esposa repassava 100 mil reais a ele todo mês em uma conta do Banco Mercantil. Foi no inquérito das fake news, aberto de ofício pelo próprio ministro, que o relator Moraes suspendeu, em 2019, uma apuração da Receita que poderia detalhar as transações financeiras de Roberta.
A ala da opinião pública manipulada pela propaganda do sistema, que espalha sua fumaça por meio de emissoras de TV e rádio, não consegue entrever a relação entre todos esses fatos e episódios. Quem lê o jornalismo independente, no entanto, sabe que, desde o momento em que políticos investigados passaram a depender do Supremo, a democracia vem sendo vorazmente corroída por dentro, por trás de todas as cortinas.
Os ministros responsáveis pela “articulação política” do governo Lula são do Supremo.
— Felipe Moura Brasil (@FMouraBrasil) June 1, 2023
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