Cérebros colonizados Cérebros colonizados
O Antagonista

Cérebros colonizados

avatar
Carlos Graieb
5 minutos de leitura 13.10.2023 14:00 comentários
Opinião

Cérebros colonizados

A relutância em condenar os ataques do Hamas por aquilo que eles são – terrorismo – está ligada a uma visão de mundo resumida à perfeição pelo parágrafo final de um artigo publicado nesta sexta-feira (13)...

avatar
Carlos Graieb
5 minutos de leitura 13.10.2023 14:00 comentários 0
Cérebros colonizados
Foto: Reprodução

A relutância em condenar os ataques do Hamas (foto) por aquilo que eles são – terrorismo – está ligada a uma visão de mundo resumida à perfeição no parágrafo final de um artigo publicado nesta sexta-feira (13) pelo site The Intercept:

“Será somente com o combate à ordem internacional liderada pelos EUA, que permite que esse regime de apartheid colonial se mantenha de pé, que virá a libertação da Palestina. Essa é a importância de trazer à tona a lógica colonial que estrutura a violência opressora contra os povos indígenas na Palestina e em diferentes localidades do mundo, para construir novas alianças internacionais de solidariedade capazes de mover a descolonização.”

Trocando em miúdos, temos que:

1.Israel é uma engrenagem na ordem internacional imperialista liderada pelos Estados Unidos.

2.Nessa ordem, diferentes regiões do mundo são colonizadas e oprimidas. Na Palestina haveria, inclusive, um sistema de apartheid.

3.Denunciar a lógica colonial é missão necessária para construir alianças internacionais e fundar um novo mundo, baseado na solidariedade.

As ideias um e três são bem conhecidas de qualquer pessoa que tenha prestado atenção, ainda que passageira, em discursos de Lula e documentos do PT sobre política internacional. Sabemos inclusive quem são os parceiros prioritários para fundar essa nova ordem mundial, livre de farsas como a democracia e banhada pela luz do amor:  Rússia, China, Irã. E você aí, não está animado por quê?

A novidade relativa está no item dois, a descrição de Israel como um “regime de apartheid colonial”. Essa ideia colonizou cérebros nos últimos quinze ou vinte anos e, da universidade, começa a se espalhar também na imprensa e nas redes sociais.

Um dos maiores expoentes dessa narrativa é o prolífico historiador israelense Ilan Pappé. Seu livro Dez Mitos Sobre Israel ganhou tradução no ano passado pela editora Tabla, que nesta semana disponibilizou o e-book de graça nas livrarias digitais. Há outros textos de Pappé lançados como panfletos eletrônicos em português, entre eles capítulos do seu livro mais conhecido, The Ethnic Cleansing of Palestine (A Limpeza Étnica da Palestina),

Segundo Pappé, a criação do Estado de Israel foi precedida por um plano deliberado de limpeza étnica, que se traduziu no massacre e na expulsão de 800.000 pessoas entre os anos de 1947 e 1948. Desde então, a população árabe teria sido submetida a um estado permanente de “terror militar”, “crueldade sistemática” e segregação racial. Sobre esse último ponto, o autor já escreveu que é desnecessário debater a existência ou não de uma forma de apartheid em Israel: a tarefa se resume a apontar as similaridades e dissimilaridades com o que houve na África do Sul.

Pappé, que há tempos se mudou para a Inglaterra, é ligado às franjas radicais do comunismo em Israel. A ideologia condiciona o seu trabalho de historiador, como ele mesmo confessou numa entrevista ao jornal belga Le Soir em 1999: “Estou menos  interessado naquilo que aconteceu do que em como as pessoas veem o que aconteceu”, disse ele. “Admito que minha ideologia influencia meus escritos históricos (…) Aliás, a luta é ideológica, não sobre fatos. Quem sabe o que são os fatos? Tentamos convencer o máximo de pessoas de que nossa interpretação é a correta e fazemos isso por razões ideológicas, não porque buscamos a verdade”.

Esse desprezo pelos fatos foi documentado em dezenas de instâncias, em especial por Benny Morris, outro conhecido historiador israelense, que pertence à mesma geração de Pappé e se mantém alerta para abusos cometidos pelos governos de Israel. Um ensaio sobre três livros de Pappé escrito em 2011 para a revista americana (progressista) The New Republic começa com o seguinte julgamento: “Na melhor das hipóteses, Ilan Pappé deve ser um dos historiadores mais descuidados do mundo; na pior das hipóteses, um dos mais desonestos.” Morris relata em detalhes o escândalo que mais manchou a reputação acadêmica de Pappé: seu endosso a uma tese universitária que denunciou o “massacre desconhecido” de cerca 250 palestinos no vilarejo de Tantura, em 1948, e que depois se revelou uma fabricação.

Pappé propõe a dissolução de Israel. A solução para o impasse entre judeus e palestinos, diz ele, é a formação de um estado único, “uma Palestina dessionizada, liberta e democrática do rio ao mar; uma Palestina que acolha de volta os refugiados e construa uma sociedade que não discrimine com base na cultura, religião ou etnia. Esse novo Estado trabalharia para corrigir, tanto quanto possível, os males do passado, em termos de desigualdade econômica, roubo de propriedade e negação de direitos. Isso pode anunciar um novo amanhecer para todo o Oriente Médio”.

O texto acima foi publicado na última quarta-feira (11) no Brasil pelo site da revista Fórum. Nele, Pappé também defende “a coragem dos combatentes palestinos” do Hamas e critica a “hipocrisia” de quem acha que a Ucrânia é a vítima na guerra de agressão iniciada pela Rússia. Surpresa nenhuma. Na imaginação fantástica de Ilan Pappé e seus admiradores, cabe ao fundamentalismo islâmico e a Vladimir Putin construir a democracia do futuro.

  • Mais lidas
  • Mais comentadas
  • Últimas notícias
1

Janja quer passar a perna em Paulo Pimenta

Visualizar notícia
2

Musk denuncia perseguição e debocha de CVM americana

Visualizar notícia
3

A explicação da Embratur para seus ‘fantasminhas’

Visualizar notícia
4

Crusoé: Supremo controle

Visualizar notícia
5

Crusoé: Os interesses conflitantes expostos pela internação de Lula

Visualizar notícia
6

Crusoé: Tarcísio reconhece o erro

Visualizar notícia
7

Crusoé: O horror do regime de Bashar Assad

Visualizar notícia
8

Rússia lança ataque com mais de 90 mísseis contra a Ucrânia

Visualizar notícia
9

Maioria acredita que houve tentativa de golpe em 2022, indica Quaest

Visualizar notícia
10

“Não há como” governo Lula impedir uso de Bolsa Família em bets, diz AGU

Visualizar notícia
1

‘Queimadas do amor’: Toffoli é internado com inflamação no pulmão

Visualizar notícia
2

Sim, Dino assumiu a presidência

Visualizar notícia
3

O pedido de desculpas de Pablo Marçal a Tabata Amaral

Visualizar notícia
4

"Só falta ocuparem nossos gabinetes", diz senador sobre ministros do Supremo

Visualizar notícia
5

Explosões em dispositivos eletrônicos ferem mais de 2.500 no Líbano

Visualizar notícia
6

Datena a Marçal: “Eu não bato em covarde duas vezes”; haja testosterona

Visualizar notícia
7

Governo prepara anúncio de medidas para conter queimadas

Visualizar notícia
8

Crusoé: Missão da ONU conclui que Maduro adotou repressão "sem precedentes"

Visualizar notícia
9

Cadeirada de Datena representa ápice da baixaria nos debates em São Paulo

Visualizar notícia
10

Deputado apresenta PL Pablo Marçal, para conter agressões em debates

Visualizar notícia
1

Lula e Seripieri: capitalismo de compadrio?

Visualizar notícia
2

Justiça eleitoral forma maioria para cassar mandato de Zambelli

Visualizar notícia
3

Toffoli requenta retaliação à Transparência Internacional

Visualizar notícia
4

As boquinhas cruzadas das mulheres Dino e Jerry

Visualizar notícia
5

Roberto Jefferson condenado: mereceu?

Visualizar notícia
6

Crusoé: Maduro prende militar argentino acusado de espionagem

Visualizar notícia
7

O que esperar da terceira temporada de House of the Dragon?

Visualizar notícia
8

Amor, o que você quer de Natal? Uma vaga vitalícia no Tribunal de Contas

Visualizar notícia
9

Mendonça vira voto vencido em recurso de Bolsonaro contra Moraes

Visualizar notícia
10

Nunes Marques vota para manter Moraes em inquérito sobre golpe

Visualizar notícia

Assine nossa newsletter

Inscreva-se e receba o conteúdo do O Antagonista em primeira mão!

Tags relacionadas

esquerda Hamas Israel Palestina Terrorismo
< Notícia Anterior

Ivan Sant'Anna na Crusoé: “E se o Hamas tivesse atacado num dia útil?”

13.10.2023 00:00 4 minutos de leitura
Próxima notícia >

Nasa lança missão inovadora para explorar asteroide metálico

13.10.2023 00:00 4 minutos de leitura
avatar

Carlos Graieb

Carlos Graieb é jornalista formado em Direito, editor sênior do portal O Antagonista e da revista Crusoé. Atuou em veículos como Estadão e Veja. Foi secretário de comunicação do Estado de São Paulo (2017-2018). Cursa a pós-graduação em Filosofia do Direito, da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP).

Os comentários não representam a opinião do site; a responsabilidade pelo conteúdo postado é do autor da mensagem.

Comentários (0)

Torne-se um assinante para comentar

Notícias relacionadas

Amor, o que você quer de Natal? Uma vaga vitalícia no Tribunal de Contas

Amor, o que você quer de Natal? Uma vaga vitalícia no Tribunal de Contas

Madeleine Lacsko Visualizar notícia
Crusoé: O olhar parcial do Itamaraty ataca novamente no Oriente Médio

Crusoé: O olhar parcial do Itamaraty ataca novamente no Oriente Médio

Duda Teixeira Visualizar notícia
A direita que a esquerda gosta está babando para derrubar Caiado

A direita que a esquerda gosta está babando para derrubar Caiado

Madeleine Lacsko Visualizar notícia
Por que o STF é quem decide se policiais de São Paulo usam câmeras?

Por que o STF é quem decide se policiais de São Paulo usam câmeras?

Madeleine Lacsko Visualizar notícia
Icone casa

Seja nosso assinante

E tenha acesso exclusivo aos nossos conteúdos

Apoie o jornalismo independente. Assine O Antagonista e a Revista Crusoé.