“Síndico justiceiro”: os riscos de síndicos que abusam do poder
Como os moradores podem reagir a excesso de notificações e punições indevidas
Em tempos de polarização, disputas internas e redes sociais acaloradas, a figura do síndico nos condomínios tem ganhado contornos cada vez mais delicados.
Em alguns edifícios, ele deixou de ser um administrador para se tornar uma espécie de “síndico justiceiro”, aplicando advertências e multas de forma arbitrária, sem o devido respaldo legal e ignorando os limites do seu papel.
De acordo com o advogado Felipe Faustino, especialista em Direito Condominial e sócio do escritório Faustino & Teles, “o síndico tem o dever de cumprir e fazer cumprir a convenção, o regimento interno e as deliberações da assembleia. Contudo, isso não significa que ele possa agir com autoritarismo ou fora dos parâmetros da legalidade. Síndico não é delegado, juiz ou legislador.”
Quando a autoridade se transforma em abuso
Casos de abuso de poder têm se tornado mais frequentes. Moradores relatam o uso de câmeras para “vigiar” vizinhos, aplicação de multas sem notificação prévia, proibições verbais não respaldadas em regimento interno, e até bloqueio de acesso a áreas comuns sem deliberação da assembleia.
Segundo dados do Instituto Brasileiro de Direito Imobiliário (Ibradim), denúncias contra síndicos cresceram 18% em 2024, sendo a maioria delas por abuso de autoridade e ausência de transparência nas decisões.
“É comum vermos síndicos que notificam moradores por barulhos subjetivos, por exemplo, ou determinam o fechamento da piscina fora das regras internas. Essas ações, quando não respaldadas por previsão legal ou deliberação assemblear, podem ser anuladas judicialmente”, afirma Felipe Faustino.
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Como os moradores podem reagir?
Diante de um síndico autoritário ou que comete abusos, os moradores têm alternativas legais e administrativas:
- Solicitar prestação de contas e acesso a documentos: O Código Civil garante esse direito aos condôminos. Se o síndico se recusar, a Justiça pode obrigá-lo.
- Formalizar reclamações: toda notificação indevida deve ser contestada por escrito, com base na convenção e regimento interno.
- Convocar assembleia: com apoio de 1/4 dos condôminos, é possível convocar reunião para discutir a conduta do síndico.
- Ajuizar ação judicial: em casos graves, como abuso reiterado, é possível entrar com ação pedindo a destituição do síndico, conforme o artigo 1.349 do Código Civil.
O risco da omissão e o papel da coletividade
Síndicos autoritários prosperam onde há omissão. A ausência de participação dos moradores em assembleias e a falta de fiscalização tornam o ambiente propício para medidas arbitrárias.
“É fundamental que os condôminos participem ativamente das decisões. O condomínio é coletivo, e não propriedade particular do síndico”, alerta Faustino.
Além disso, é recomendável que o condomínio mantenha uma comissão fiscal ativa, ata das reuniões arquivadas corretamente e regras claras sobre advertências e multas, sempre respeitando o direito à ampla defesa.
O síndico tem papel fundamental na gestão condominial, mas sua autoridade tem limites. Quando o poder se torna abuso, o condomínio perde sua harmonia e legalidade. Cabe aos moradores exercerem seu direito de fiscalização, participação e reação e, se necessário, acionar a Justiça para restaurar o equilíbrio.
“Síndico que governa pelo medo e não pela lei transforma o condomínio num ambiente opressor. E isso é inaceitável num Estado Democrático de Direito”, afirmou Felipe Faustino.
Por Rafael Bernardes, CEO do Síndicolab, e Felipe Faustino, advogado no escritório Faustino & Teles
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