Governo "gourmetiza" o calote, diz tributarista, sobre PEC dos Precatórios Governo "gourmetiza" o calote, diz tributarista, sobre PEC dos Precatórios
O Antagonista

Governo “gourmetiza” o calote, diz tributarista, sobre PEC dos Precatórios

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Gabriela Coelho
7 minutos de leitura 13.11.2021 16:00 comentários
Entrevista

Governo “gourmetiza” o calote, diz tributarista, sobre PEC dos Precatórios

A votação da PEC dos Precatórios foi concluída na Câmara na última terça-feira (9). Com abusos, a matéria segue, agora, para a análise do Senado e pode abrir um espaço de R$ 91,6 bilhões no orçamento de 2022...

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Gabriela Coelho
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Governo “gourmetiza” o calote, diz tributarista, sobre PEC dos Precatórios
Divulgação

A votação da PEC dos Precatórios foi concluída na Câmara na última terça-feira (9). Com abusos, a matéria segue, agora, para a análise do Senado e pode abrir um espaço de R$ 91,6 bilhões no orçamento de 2022.

Em 9 de novembro, a ministra Rosa Weber, do STF, negou pedido de deputados para suspender a tramitação da proposta.

O Antagonista, o tributarista Renato Gomes afirma que a proposta de alteração da forma de cálculo para o pagamento dos precatórios é legal do ponto de vista jurídico, o problema é que a alteração que está sendo feita, e do jeito que está sendo feita, é, no mínimo, “afobada” e que “o governo está gourmetizando o calote”

“O governo está deixando de pagar uma dívida reconhecida pela Justiça. Pois o precatório é uma dívida do governo aos credores, já reconhecida judicialmente. Então, agora, o governo limitará os pagamentos dessas dívidas e, ainda mais, vai alterar a forma de cálculo de atualização desse débito, para que ele seja atualizado a menor”, diz. 

Segundo o especialista, existe uma previsão orçamentária para pagamento dos precatórios que abre um espaço de um valor previsto em orçamento para se pagar o Auxílio Brasil.

Leia a íntegra da entrevista:

O básico: todos falam de precatórios, mas a maioria não sabe o que são. Afinal, o que são precatórios?
São dívidas que o governo  possui, os entes públicos possuem, sejam eles o governo federal, estadual, município, que possuem dívidas por várias questões: uma desapropriação, uma ação judicial que perderam, às vezes até ações tributárias. Após todo o julgamento, quando não há mais recurso para o governo discutir essa decisão, que lhe é contrária, aí se tem a criação do precatório. Todos sabem que as decisões judiciais podem se arrastar por muito tempo. Então, muitas vezes, uma pessoa detém um precatório que existe há muito tempo, coisa de 15, 20 anos. E, mesmo assim, em alguns casos, o governo propõe ação rescisória, que pode ter uma discussão arrastada por mais dez anos. Olha aí, uma discussão judicial que pode levar 30 anos  para então haver o direito de constituir o crédito de precatório. A partir deste momento, o governo em vez de fazer o pagamento de maneira integral, devida, orçamentar, há a demora também de dois anos. Aí sim vem o pagamento. Estamos falando de uma dívida que demora.

O que a PEC dos Precatórios apresenta?
O governo tem política de atrasar o pagamento de precatórios, justamente pela questão orçamentária. Infelizmente é comum esse atraso. Eles pagam esse precatório de anos anteriores e há um atraso para a pessoa começar a receber e recebe em dez prestações. O governo está propondo isso: sabe esse precatório que demora mais de 30 anos? Vai alongar mais ainda essa dívida. Vamos aumentar esse parcelamento do valor e isso significa que a pessoa que esperou anos para definição vai ter que esperar mais. Por conta dessa demora, é comum as pessoas venderem os precatórios e até os credores podem ser afetados. 

Quais são os pontos ruins da PEC?
A proposta de alteração da forma de cálculo para o pagamento dos precatórios é legal do ponto de vista jurídico. Não há problema em haver alteração na forma desse cálculo, em princípio. O problema é que a alteração que está sendo feita, e do jeito que está sendo feita, é, no mínimo, afobada. Então, agora, o governo limitará os pagamentos dessas dívidas e, ainda mais, vai alterar a forma de cálculo de atualização desse débito, para que ele seja atualizado. Para que haja todo esse esforço para encaixar o auxílio Brasil que o governo está pretendendo, talvez seja sacrificado o orçamento dos anos posteriores. O que a gente percebe é que a ideia de furar o teto pegou muito mal no mercado, o dólar explodiu, e o governo está buscando uma saída que não seja furar o teto. Ou seja, existe uma previsão orçamentária para pagamento dos precatórios, e limitando, colocando um teto para pagar essas dívidas, e alterando a forma de cálculo da correção monetária desses débitos, abre-se um espaço de um valor previsto em orçamento para se pagar o Auxílio Brasil. No final das contas, é dar um calote em alguns credores para cobrir esse programa do governo. Veja, como esse espaço orçamentário se abre nesse momento por uma questão bem peculiar, provocando uma redução no valor dos precatórios nesse momento, não dá para o governo atrelar o Auxílio Brasil, como programa, à essa manobra. Ele vai impactar em 2022, ano eleitoral. No entanto, o governo não consegue prever se isso se fará verdadeiro em 2023 e nos anos seguintes. De forma que, para os próximos anos, deverá haver alguma forma de buscar recursos para manutenção desse programa social da forma que ele está sendo pensando. É por isso que, a princípio, nos parece que a tributação de dividendos deve manter-se em pauta. A gente sabe que a movimentação política perdeu força, principalmente junto ao empresariado. Mas, talvez, esse tema volte a ser debatido com mais intensidade.

Há pontos bons?
O único ponto bom que a gente percebe nessa negociação é o fato de o governo estar buscando uma legitimação legal para fazer esse parcelamento. Alguns até defendem que não é calote, mas a maioria entende que é calote. A gente compreende a posição, mas na medida em que o governo não negocia com a sociedade, passando essa legislação que o autoriza pagar essa dívida, ou seja, mudando a regra do jogo com o jogo em andamento. Aquele jogo em andamento, que já estava com uma vitória garantida pro cidadão, e o governo fala que vai ter mais um tempo. Então, é um ponto positivo se avaliar que o governo não está dizendo que não vai pagar. Isso impactaria na economia, uma classificação de risco, aí seria o calote efetivo. O governo está “gourmetizando” o calote. 

A ministra Rosa Weber negou a liminar pra suspender e pediu informações ao MP e à Câmara. A PEC vai agora ao Senado. Como o senhor vê essa decisão? Não pode perder o timing?

O STF está buscando realizar sua função e está deixando o Legislativo legislar. O STF não poderia impedir isso? Não, de fato, o poder legislativo tem autonomia para estabelecer e mudar leis. Óbvio que existem questionamentos sobre o processo legislativo, o fato de ter havido autorizações de última hora, mas existem brechas no regulamento. É uma discussão válida. Agora, não perde o timing. O que for irregular nessa PEC poderá ser analisado pelo STF em ações particulares, credores que se sentirem lesados podem ir ao Poder Judiciário. 

E se nesse meio tempo o STF mandar suspender? Não seria uma questão interna?

Seria estranha a interferência do STF, a não ser que houvesse uma irregularidade procedimental, mas o Legislativo pode estabelecer esse novo regramento. 

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Gabriela Coelho

É jornalista formada pelo UniCEUB, em Brasília. Tem especialização em gestão de crise e redes sociais. Passou pelas redações do Jornal de Brasília, Globo, Revista Consultor Jurídico e CNN Brasil. Conhece o mundo do Judiciário há alguns anos, desde quando ainda era estagiária do TSE. Gosta dessa adrenalina jurídica entre pedidos e decisões. Brasiliense, cobriu as eleições nacionais de 2010, 2014 e 2018 e municipais de 2012 e 2020.

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