Leonardo Barreto na Crusoé: Os riscos de uma lumpendemocracia
Certa vez, uma pesquisa realizada com eleitores de uma cidade periférica de Brasília – com índices altos de pobreza – mostrou que o...
Certa vez, uma pesquisa realizada com eleitores de uma cidade periférica de Brasília – com índices altos de pobreza – mostrou que o principal item que definiria o voto em uma determinada eleição seria a “educação”. O responsável pela análise ficou impressionado porque não era comum essa relação, pois pessoas carentes tendem a apontar necessidades mais urgentes como prioridades políticas, tais como emprego e saúde, por exemplo, enquanto a educação fica em uma prateleira mais acima.
Curioso com o resultado, o analista então pediu que se realizasse uma pesquisa complementar, um grupo focal, no qual eleitores típicos foram convidados para uma conversa mediada por um especialista que tinha a missão de buscar as crenças dominantes naquela sociedade. Assim, o mistério pôde ser resolvido. Na cidade havia duas escolas, uma com merenda e outra sem lanche e os candidatos a vereador estavam prometendo vagas para as mães no estabelecimento onde suas crianças poderiam ser alimentadas.
O exemplo, infelizmente real, mostra a dinâmica do voto em populações com carência material elementar. Quando o básico não está universalizado, ele é distribuído assimetricamente para gerar dependência política. Vai ter gente que vai acessar os serviços públicos e outros que não vão, e são os políticos que decidem de que lado a sorte estará.
Essa questão está longe de ser uma novidade para qualquer um no Brasil, mas serve de atalho para uma discussão de primeira necessidade que é a relação entre dependência econômica e qualidade do voto. Antes, no entanto, é preciso fazer uma ressalva. Pessoas pobres e ricas são igualmente racionais para decidir seu voto, isto é, são totalmente capazes de agir conectando meios e fins. O que faz a diferença é o incentivo que molda o comportamento na hora de enfrentar a urna: quem estiver em estado de necessidade tende a buscar resolvê-lo na maneira que puder e ponto. Qualquer coisa diferente disso é fantasia.
O número de beneficiários do Bolsa Família, nesse sentido, é uma medida objetiva para avaliar o contexto de incentivos que influencia como vota boa parte dos eleitores brasileiros. Pode-se imaginar que pessoas nessas condições têm interesse focado no valor do auxílio que receberão, no seu poder de compra (principalmente de alimentos), são mais expostas à violência, à situação de desorganização familiar e suas expectativas estão fortemente ligadas a mais políticas distributivas, como moradia, tarifas sociais de água e de luz e outros programas fornecidos por governadores e prefeitos.
A relação do eleitor com o Estado se dá principalmente via…
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