Lula mantém sigilos da mesma forma que Bolsonaro
Petista prometeu na campanha "um revogaço desse sigilo que Bolsonaro está criando para defender os amigos”, mas seu governo negou quase o mesmo número de pedidos de informação que o antecessor
Durante a campanha presidencial de 2022, mais precisamente em junho, Lula (foto) prometeu o seguinte: “É uma coisa que nós vamos ter que fazer: um decreto, um revogaço desse sigilo que Bolsonaro está criando para defender os amigos”.
O Estadão revela nesta quinta-feira, 21, que, em seu primeiro ano de governo, o petista negou praticamente o mesmo número de pedidos de informação que o antecessor no último ano de gestão.
Segundo o jornal, o governo Lula negou 1.339 pedidos de informações em 2023, sob a justificativa de que as solicitações tocariam em dados pessoais. “Entre as informações colocadas em sigilo centenário pela gestão Lula estão a agenda da primeira-dama, Rosângela da Silva, a Janja; comunicações diplomáticas sobre o ex-jogador Robinho, condenado na Itália por estupro; e a lista dos militares do Batalhão de Guarda Presidencial que estavam de plantão durante o ataque à Praça dos Três Poderes no dia 8 de janeiro de 2023”, diz o Estadão.
O governo Lula negou em 2023 sete pedidos de informação a mais do que os 1.332 negados pelo governo Bolsonaro em 2022. “O levantamento considerou todos os pedidos negados cujo motivo da decisão foi ‘dados pessoais’, conforme o sistema da CGU. O artigo 31 da Lei de Acesso à informação diz que ‘informações pessoais relativas à intimidade, vida privada, honra e imagem terão seu acesso restrito pelo prazo máximo de 100 anos a contar da sua data de produção'”, explicou o Estadão.
Sigilo dos outros
Durante a campanha, Lula usou muito a questão dos sigilos para machucar o adversário. “Qualquer pessoa podia saber o que acontecia no nosso governo. Agora, o Bolsonaro, não. O Bolsonaro dizia que não tem corrupção, mas decreta sigilo de 100 anos para qualquer denúncia contra ele. Decreta sigilo de 100 anos para o filho, para os amigos, para o [ex-ministro da Educação e hoje deputado Eduardo] Pazuello. Nada dele é investigado. Toma aqui 100 anos, para quando ele não existir mais”, reclamou à época.
Em janeiro de 2023, o governo levantou sigilos sobre visitas recebidas pela ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro no Palácio da Alvorada. Agora, mantém em segredo as visitas recebidas pela primeira-dama Janja na residência oficial e no Palácio do Planalto.
O Estadão destaca ainda que “o Exército também impôs sigilo centenário sobre a lista dos integrantes alocados no Batalhão da Guarda Presidencial durante o 8 de janeiro e sobre a ficha militar do tenente-coronel Mauro Cid, ex-braço direito de Bolsonaro”.
Revisão
A pedido do governo Lula, a Controladoria Geral da União (CGU) reviu os sigilos impostos pelo governo Bolsonaro e identificou “252 casos de sigilo aplicados indevidamente”.
“A partir desse levantamento, foi possível verificar que o governo anterior invocava a proteção a dados pessoais e o artigo 31 da LAI como pretexto para deixar de divulgar informações que, pela Lei, deveriam ser públicas. Isso é o que ocorreu, por exemplo, em casos de agendas públicas, registros de entradas e saídas de prédios públicos, processos administrativos, entre outros que se notabilizaram no último governo.”, informou a CGU em nota.
“Qualquer coisinha“
Ouvida pelo Estadão, a diretora de programas da Transparência Brasil, Marina Atoji, criticou o uso indiscriminado do sigilo de 100 anos previsto na lei brasileira:
“A formalização, por meio do Decreto 11.257/2023 e dos enunciados, do entendimento de que esse sigilo não é de aplicação automática e nem deve depender do humor da pessoa que decide sobre a concessão de acesso, foi um passo muito importante. A questão agora é introjetar essa interpretação em todo o governo federal, fazer isso funcionar de fato – algo que caminha a passos lentos”.
Pelo jeito, o que Lula disse em um dos debates com Bolsonaro na eleição passada segue valendo: “Hoje, qualquer coisinha é um sigilo de 100 anos”.
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