STF vai com escalação completa ‘contra’ Bolsonaro
Ministros do Supremo perderam mais uma oportunidade de enfraquecer a alegação de que o ex-presidente está sendo vítima de uma perseguição

O Supremo Tribunal Federal (STF) rejeitou afastar Alexandre de Moraes, Flávio Dino e Cristiano Zanin do julgamento da denúncia apresentada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) por tentativa de golpe de Estado contra Jair Bolsonaro, entre outros aliados.
O único dos 11 ministros do STF a votar pelo impedimento de Moraes e Dino foi André Mendonça, indicado para o tribunal por Bolsonaro. O outro indicado pelo ex-presidente, Kassio Nunes Marques, seguiu o resto dos colegas ao rejeitar o pleito das defesas dos denunciados.
É de se questionar também se Mendonça, advogado-geral da União no governo Bolsonaro, deveria participar desse tipo de deliberação, assim como questionou-se se Dias Toffoli, advogado-geral da União no governo Lula e ex-advogado do PT, deveria participar do julgamento do mensalão — e ele participou.
Esse é o tamanho do drama vivido hoje pelo STF, que tenta emplacar uma agenda positiva enquanto boa parte de seus ministros se desgasta em pendengas políticas.
“Risco de se gerar desconfiança”
Mendonça defendeu em seu voto divergente sobre a participação de Moraes e Dino no julgamento da denúncia de Bolsonaro que “basta haver o risco ou a possibilidade de se gerar desconfiança baseada em motivo fundado para que o juiz não participe do processo”.
Ele não enxergou problema em Zanin participar do julgamento marcado para 25 de março na Primeira Turma do STF (foto), apesar de o ministro ter sido advogado pessoal de Lula e ter composto a campanha presidencial do petista contra Bolsonaro, em 2022.
“Ação contra a parte”
No caso de Dino, Mendonça chamou atenção para o inciso nono do artigo 144 do Código de Processo Civil, segundo o qual “há impedimento do juiz, sendo-lhe vedado exercer suas funções no processo, quando promover ação contra a parte ou seu advogado”.
Dino foi autor de uma queixa-crime contra Bolsonaro quando era ministro da Justiça e Segurança Pública de Lula, além de protagonizar embates acalorados com a base bolsonarista na Câmara e participar ativamente da investigação (e de questionamentos) sobre a depredação do 8 de janeiro de 2023, parte do enredo da denúncia da PGR.
Para o relator do pedido de impedimento, Luís Roberto Barroso, contudo, o Código de Processo Penal não prevê esse tipo de impedimento. Em seu relatório, Barroso, presidente do STF e voto vencedor no caso, cita Dino, que disse o seguinte ao defender sua própria participação no julgamento:
“Há de se lembrar que estamos em sede de demanda de cunho penal, sendo incabível invocar a incidência de hipótese de impedimento prevista no Código de Processo Civil, por interpretação ampliativa”.
“Diretamente interessado”
No caso de Moraes, Mendonça disse em seu voto divergente que “ao constatar que o eminente Ministro arguido sofreria, direta e imediatamente, consequências graves e tangíveis, como prisão – ou até mesmo morte–, se os relatados intentos dos investigados fossem levados a cabo, parece-me presente a condição de ‘diretamente interessado’, tal como exigido pelo art. 252, IV, do CPP”,
Mendonça se refere ao plano “Punhal verde amarelo”, por meio do qual aliados de Bolsonaro teriam planejado “neutralizar” Moraes, Lula e Geraldo Alckmin após a derrota na eleição de 2022, como parte da trama para tentar permanecer no poder.
O inciso quarto do artigo 252 do Código de Processo Penal, citado por Mendonça, diz que “o juiz não poderá exercer jurisdição no processo em que ele próprio ou seu cônjuge ou parente, consangüíneo ou afim em linha reta ou colateral até o terceiro grau, inclusive, for parte ou diretamente interessado no feito”.
“Inimigo capital”
Para Barroso e a maioria de seus colegas de STF, contudo, “os argumentos apresentados pela defesa não permitem considerar que a autoridade arguida [Moraes] esteja na condição de ‘inimigo capital (mortal) do Gen. Braga Netto’, como sustentado pelo arguente”.
“A notícia de que haveria um plano para o homicídio do relator, e até mesmo de outras autoridades públicas, não acarreta automaticamente a suspeição de S. Exa. no âmbito técnico-jurídico exigido pela cláusula de suspeição do art. 254, I, do CPP”, argumentou Barroso.
É uma posição diferente do que o que o STF definiu no caso de Lula na Operação Lava Jato, quando a maioria dos ministros votou pela suspeição de Sergio Moro aludindo a questões como o fato de Moro ter assumido o Ministério da Justiça de Bolsonaro anos após condenar Lula e a mensagens que foram fruto de crime, e não poderiam, portanto, ser usadas judicialmente.
A comparação da rigidez do STF com Bolsonaro e seus aliados com a leniência do tribunal em relação aos condenados pela Lava Jato é um constrangimento para os ministros que começarão a julgar o ex-presidente, e serve como mais um dos argumentos para os investigados alegarem perseguição.
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Perseguição?
Esse questionamento formal sobre a suspeição de Moraes, Dino e Zanin foi a última oportunidade que o STF teve para tentar enfraquecer de alguma forma a alegação de que Bolsonaro está sendo vítima de uma perseguição.
O ideal seria que Moraes tivesse deixado a relatoria do processo no momento em que seu nome apareceu entre as potenciais vítimas da trama golpista. Não tendo o feito, que pelo menos abdicasse de participar do julgamento. Em último caso, que Dino se declarasse impedido.
Mas o STF não fez nenhuma concessão em um processo tumultuado por uma série de investigações diferentes — cartão de vacina, joias sauditas, etc — e poluído pela conduta de Moraes em outros casos, como o revelado pela Vaza Toga, que expôs uma conduta heterodoxa, para dizer o mínimo, na condução de processos abertos e sustentados em nome da defesa do próprio STF antes mesmo de surgir a suspeita sobre uma trama golpista.
Defesa
Os advogados de Bolsonaro alegam que não tiveram acesso a todas as provas colhidas na investigação, mas apenas àquelas usadas para incriminar o ex-presidente. Também questionam o fato de ele estar sendo julgado no STF mesmo sem ter foro por prerrogativa de função, e de não ter tido tempo para preparar a defesa direito, já que o processo corre muito rápido.
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Bolsonaro participou de uma reunião (gravada) onde se falava em “virar a mesa” antes da eleição de 2022. E, segundo depoimentos, um comandante chegou a ameaçar lhe dar voz de prisão caso seguisse sendo assediado para participar de um golpe, Há algo pelo que o ex-presidente deve pagar, portanto, assim como seus aliados, que puseram a mão na massa, como indicam as provas colhidas.
Mas, por conta da conduta dos ministros do STF, Bolsonaro e seus aliados têm um espaço muito amplo para alegar perseguição, como fez o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP) nesta semana, ao se licenciar da Câmara em tom dramático, para permanecer nos Estados Unidos.
Ninguém aposta que o provável julgamento por tentativa de golpe de Estado terá como desfecho a absolvição de Bolsonaro e de seus aliados. Mas a sentença desse caso virá poluída por suspeitas que os próprios ministros do STF alimentaram desde o início dos julgamentos pelo 8 de janeiro.
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Comentários (7)
Amaury G Feitosa
24.03.2025 11:45Qualquer idiota sabe bem que Bolsonaro será massacrado e será julgado à revelia pois estará exilado estando claro que o filho foi pros EUA para preparar seu asilo politico, a DITADURA ASSASSINA que está sendo freada não pôde matá-lo por sujo serviço de um assassino amador quer prendê-lo em vingança por não ter assaltado a nação como fez seu criminoso sucessor condenado em três instâncias como ladrão do erário ... são fatos jamais narrativas para idiotas.
David Maximo
23.03.2025 12:32já se foi a época em que o Antagonista era um jornal imparcial. Muito chato perceber o viés petista nas confusas linhas de vários artigos, como este. Sinto até vergonha de ter deixado que renovassem minha assinatura.
Um_velho_na_janela
23.03.2025 09:34No entender deste leigo, "pero no mucho" a alegação de perseguição me parece incongruente e até ridícula na boca de jurisconsultos, não seria a persecução criminal ante a suspeita de crimes cometidos, obrigação inalienável do Estado?
Maraci Rubin
22.03.2025 23:22O stf, com minúsculas mesmo, é um tribunal ditatorial. Fora, stf!
Claudemir Silvestre
22.03.2025 17:03Clayton … concordo 100 % …. O STF se transformou em um gabinete de advocacia do PT !!!
Clayton De Souza pontes
22.03.2025 16:56A comparação com a Lava Jato, e a parcialidade atribuida ao Moro, destaca a hipocrisia desses ministros. O STF serve somente pra blindar corruptos amigos e perseguir desafetos
JEAN PAULO NIERO MAZON
22.03.2025 16:01Suprema imparcialidade