Há algo de podre no reino do Bolsa Família
Sou a favor do Bolsa Família como programa assistencial transitório, e não como vem, há décadas, sendo utilizado por todos os governos
Extraída da brilhante obra de Shakespeare, Hamlet, a frase “Há algo de podre no reino da Dinamarca” tornou-se mundialmente famosa, e expressão de que “algo não vai bem” em algum lugar. No Brasil, temos uma frase semelhante: “Algo de muito errado não está certo”. Sensacional. Bem melhor do que a nobreza inglesa.
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Essa história de apostas online, as tais bets, ainda vai dar muito o que falar. E deveria. Pois envolve uma atividade importante para a economia (impostos, empregos, renda etc.), mas com grandes impactos negativos (sociais, criminalidade, comércio etc.). A linha entre proibir, regulamentar e deixar como está, é absurdamente tênue.
Mas isso é assunto para uma outra – detalhada e enorme – coluna. O tema, aqui, é Bolsa Família, e justamente por causa das apostas. Segundo dados do Banco Central, que vieram à tona após um estudo do Ministério do Desenvolvimento Social, órgão responsável pelo programa, 25% dos assistidos gastam dinheiro em jogos online.
Lavagem de dinheiro
Os números são alarmantes. Dos cerca de 20 milhões de beneficiários, algo como cinco milhões gastaram, apenas em agosto deste ano, perto de três bilhões de reais, ou seja, aproximadamente 600 reais por CPF beneficiado É realmente assustador, sobretudo porque, em média, o benefício é também de 600 reais mensais.
Das duas, uma: ou tem gente recebendo Bolsa Família indevidamente, o que é: 1) fraude e 2) falha grotesca do governo, ou há um gigantesco esquema para se lavar dinheiro em casas de apostas. Utiliza-se o nome e o CPF de uma pessoa, gasta-se fortunas em apostas e leva-se (lava-se) dinheiro sujo para um CNPJ, em tese, regular.
Os números não fecham. Se o Banco Central não errou, o Brasil tem muito menos gente pobre do que os dados indicam. Não dá para receber 600 reais de Bolsa Família e gastar tudo em apostas. Mas dá para um bicheiro, traficante ou contrabandista apostar seu dinheiro sujo, em nome de terceiros, e recebê-lo de volta – com deságio – de uma empresa de jogos.
Mudança radical
Sou francamente a favor do Bolsa Família como programa assistencial transitório, e não como vem, há décadas, sendo utilizado – eleitoralmente, indefinidamente e fraudulentamente – por todos os governos. Não é matando de fome uma família pobre, que iremos corrigir os desvios do programa, por isso, não aceito a ideia de que tem de ser extinto.
Defendo uma mudança radical no programa, desde a forma de financiamento ao objetivo final, que deveria ser “dar um tempo” para o beneficiário conseguir caminhar com as próprias pernas, no caso, com o próprio bolso. O programa deveria ser gerido por uma Parceria Público-Privada (PPP), com rigorosos sistemas de controle e metas definidas.
Estamos falando de cerca de 170 bilhões de reais por ano e 20 milhões de pessoas, hoje à mercê de políticos populistas e trambiqueiros de toda sorte. Mas estamos falando, igualmente, de todos os contribuintes brasileiros, que, compulsoriamente, financiam o programa e, possivelmente, essa farra toda envolvendo as apostas online.
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