Dino já promoveu politização da segurança, falta promover solução
Politizar questões complexas de segurança pode ser algo tentador para o tuiteiro, mas não deveria ser para um ministro de Estado...
Politizar questões complexas de segurança pode ser algo tentador para o tuiteiro, mas não deveria ser para um ministro de Estado. Aqui não entro nem na questão moral, fico apenas no pragmatismo. É algo que rende poucos dividendos políticos e cobra um preço muito alto, o custo-benefício não compensa.
Na onda de demonizar o governador de São Paulo, foi perdido tempo precioso para tratar de forma nacionalizada e adulta a chaga da criminalidade organizada.
Tivemos, ao mesmo tempo, conflitos sangrentos com a polícia em São Paulo, Rio de Janeiro e Bahia. A primeira aposta política foi canalha: colocar na conta de Tarcísio de Freitas, focando na associação com o bolsonarismo. Isso envolveu políticos governistas, influencers e até mesmo parte da imprensa.
A realidade se impôs na opinião pública. Conforme as semanas se passavam, até mesmo gente muito simpática ao PT começou a cobrar um posicionamento sobre o ocorrido na Bahia.
Essa demora custou caro e sinalizou ao crime organizado que havia uma brecha para agir. Estamos diante de um problema grave e complexo, que exige união de todas as forças políticas. A atuação precisa ser sistêmica, já que envolve todo o país e facções que ganharam relevância internacional.
Houve o lançamento de um plano de enfrentamento ao crime organizado com foco em soluções nos estados. Uma das medidas era fornecer verba para a segurança pública da Bahia, algo criticado por especialistas. De forma isolada, investir mais no que já está problemático não soluciona a situação; pode inclusive fazer com que ela persista.
O ocorrido agora no Rio de Janeiro é de um absurdo que desafia nossa capacidade de acreditar no que vemos. O assassinato dos médicos no quiosque da Barra da Tijuca é o símbolo do esculacho do crime organizado sobre o poder estabelecido. Na prática, o crime conseguiu exercer muito mais poder que as nossas instituições.
Em tese, é algo que ocorre há tempos. Dessa forma, no entanto, não. A gravidade da afronta tem de fazer com que ela seja um ponto de inflexão no sentido da união por soluções efetivas.
É duro demais precisar encarar a realidade da morte por engano. Ser parecido com um criminoso virou fator de risco para assassinato. Ter um familiar morto por engano é algo para que não se pode obter um senso de justiça mesmo com a punição dos culpados. Não faz sentido, é como se a vida humana e nada fossem a mesma coisa.
Aqui não falamos de pessoas realmente iguais, com alguma característica única que fosse possível confundir. São dois homens um pouco gordinhos, carecas, de barba rala e óculos. Parecidos com eles há milhares, é um tipo físico absolutamente comum.
Os bandidos não tiveram nem o cuidado de checar. Matam antes para perguntar depois. Fazem num lugar lotado, movimentado, sem preocupação. E a história ainda piora.
Um tribunal do crime condenou os homens à morte. A operação envolveu até uma videoconferência com bandidos presos. É um escárnio.
Na prática, criminosos presos conseguem exercer mais poder do que forças policiais compostas por gente preparada. Eles acharam os criminosos antes da própria polícia. Mais que isso, conseguiram torturar e executar gente procurada sem que fossem interrompidos. É distópico.
O ministro Flavio Dino, mesmo diante de tudo isso, insistiu na polarização com o bolsonarismo. É inadequado. Colocar um problema tão antigo e complexo só na conta do bolsonarismo, além de ser um diagnóstico questionável, não ajuda na solução.
Precisamos encarar que o crime organizado soube encontrar na polarização política as brechas para ocupar espaços de poder. É preciso reverter isso. O primeiro passo é querer.
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