Mais gente precisa defender a Lava Jato
A "Folha de S. Paulo" publicou neste domingo uma entrevista importante com o diretor da Transparência Internacional no Brasil, o economista Bruno Brandão. Trata-se de uma voz independente fazendo aquilo que quase ninguém tem feito: um contraponto aos críticos hiperativos da Lava Jato, políticos e advogados que enriqueceram defendendo políticos, que tentam emplacar a tese de que a operação nada mais foi do que um projeto de poder de Sergio Moro e alguns procuradores...
A “Folha de S. Paulo” publicou neste domingo uma entrevista importante com o diretor da Transparência Internacional no Brasil, o economista Bruno Brandão. Trata-se de uma voz independente fazendo aquilo que quase ninguém tem feito: um contraponto aos críticos hiperativos da Lava Jato, políticos e advogados que enriqueceram defendendo políticos, que tentam emplacar a tese de que a operação nada mais foi do que um projeto de poder de Sergio Moro e alguns procuradores.
Sobre as motivações do núcleo original de protagonistas da Lava Jato, Brandão lembra que eram todos integrantes do Judiciário, do Ministério Público e da Polícia Federal que já tinham larga experiência e muitas frustrações no combate aos crimes de colarinho branco: “são agentes que dedicaram suas vidas a essa causa e experimentaram a realidade do nosso sistema de impunidade”, diz o economista.
Nunca é demais lembrar que o alvo original da Lava Jato não foi nenhum político, mas um doleiro, Alberto Youssef, que já era velho conhecido da polícia federal. Quando foram atrás de Youssef, e mesmo quando descobriram, meio que por acaso, que ele tinha ligações com um ex-diretor da Petrobras, os investigadores não esperavam encontrar um esquema de corrupção que envolvia diversos partidos e as maiores empreiteiras do país. Imaginavam estar na trilha de um caso clássico de lavagem de dinheiro.
Sobre a “politização” da Lava Jato, Brandão faz uma observação certeira: “a operação parece ter feito cálculos políticos em alguns de seus movimentos porque as defesas eram políticas”. De fato, não existe lugar comum maior entre donos de mandato, mesmo aqueles que são apanhados com dinheiro em uma mala ou enfiado na cueca, do que dizer que estão sendo alvo de uma “armação de inimigos políticos”. Ao mesmo tempo, eles vão buscar abrigo no corporativismo, em que amigos e inimigos se irmanam em favor da blindagem de todos. Foi assim com a Lava Jato desde o instante em que ela descobriu o primeiro vínculo entre o dinheiro da Petrobras e os chefões de partidos políticos.
Pode-se discutir se a resposta da operação às manobras de seus alvos políticos foi a melhor a longo prazo, do ponto de vista institucional. Brandão acha que os cálculos políticos levaram a “grandes erros”. O que não se pode dizer é que a motivação política estava presente no momento em que um inquérito sobre Youssef foi retirado de uma pilha empoeirada de papéis, dando origem à Lava Jato.
O outro ponto fundamental da entrevista do diretor da Transparência Internacional é que a resposta do Legislativo à Lava Jato (e eu acrescentaria aqui, também a resposta do STF, especialmente sua Segunda Turma (foto)), não foi no sentido de aprimorar as ferramentas de combate à corrupção. “O que nós vimos não foi uma correção de erros, foi um desmanche”, diz Brandão.
Ele faz uma comparação perfeita entre a reação do meio empresarial e a do meio político à Lava Jato. O primeiro, tratou de criar mecanismos de conformidade, ou seja, adaptou suas regras internas para tornar a corrupção mais difícil de ser praticada e mais custosa para os desonestos. O segundo, aprovou uma nova Lei de Improbidade e ainda pretende aprovar um novo Código Eleitoral – ambos mais brandos, mais lenientes com políticos e partidos. “Os partidos não mudaram suas práticas, a democracia interna, a transparência. Ao contrário: passaram leis que reduziram ainda os controles sobre a utilização de recursos públicos”, diz Brandão. A resistência do Congresso a revelar o caminho do dinheiro gasto nas emendas de relator fala por si própria.
Há pouco na entrevista sobre o Judiciário. Mas o discurso dos advogados do Clube do Charuto sobre a Lava Jato é desonesto – e a maneira como vários juízes do STF deixam que esse discurso se propague é vergonhosa.
A Lava Jato usou leis sobre corrupção que haviam sido aprovadas pouco tempo antes, e sempre leva tempo para que o uso de novos instrumentos jurídicos assuma formas estáveis. O tamanho da operação criou situações sobre as quais não havia precedentes, e muitos entendimentos sobre regras processuais foram mudando com o carro em movimento. Mas tudo que resultou de hesitações, justificáveis ou não, do Supremo, hoje aparece como “culpa” de Moro e do MPF.
A questão da competência da 13a. Vara de Curitiba é um exemplo disso: o STF levou sete anos para decidir que Moro não deveria ter julgado certos casos, mas nenhum dos ministros faz qualquer objeção quando os advogados de Lula enchem a boca para dizer que ele foi condenado por um juiz “incompetente”. É como se STF tivesse sido enganado ou induzido ao erro pelo magistrado ardiloso da primeira instância.
Isso precisa acabar, e nem é por causa de Sergio Moro. É para que as coisas voltem a ter sua devida proporção: os instrumentos de combate à corrupção deixem de ser vistos como inimigos do desenvolvimento do país (como quer o ministro Ricardo Lewandowski) e a própria corrupção, como invenção de uma trupe de Curitiba. Mais gente precisa falar como Bruno Brandão fez hoje.
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