Marilena Chauí entra em lista de professores negros da USP. O que isso significa?

07.03.2025

logo-crusoe-new
O Antagonista

Marilena Chauí entra em lista de professores negros da USP. O que isso significa?

avatar
Madeleine Lacsko
4 minutos de leitura 25.11.2024 20:07 comentários
Narrativas Antagonista

Marilena Chauí entra em lista de professores negros da USP. O que isso significa?

A verdade é que essas políticas, aplicadas de forma tão desordenada, não contribuem para a inclusão

avatar
Madeleine Lacsko
4 minutos de leitura 25.11.2024 20:07 comentários 0
Marilena Chauí entra em lista de professores negros da USP. O que isso significa?
Arte: O Antagonista

A inclusão de Marilena Chaui, uma das figuras mais influentes da esquerda brasileira, na lista de professores negros da FFLCH-USP é mais do que um episódio curioso. Ela simboliza a confusão identitária e o desrespeito ao rigor acadêmico que têm tomado conta de nossas universidades. O caso levanta uma questão que vai além de classificações pessoais: como um espaço que deveria primar pela excelência se tornou palco de contradições tão flagrantes?

Marilena Chaui, com seu histórico de poder e prestígio, jamais precisou de rótulos para se firmar. Sua escolha de se declarar negra não é um ato isolado. Ela reflete uma tendência crescente de transformar a autoidentificação em um recurso político e acadêmico. Essa dinâmica se torna ainda mais absurda quando vemos, no mesmo contexto, uma professora de ascendência japonesa também sendo reconhecida como negra. Enquanto isso, alunos pardos – que deveriam ser contemplados pelas políticas de cotas – enfrentam bancas rigorosas que, muitas vezes, negam suas autodeclarações, mesmo com evidências familiares e culturais de sua origem. São obrigados a recorrer à justiça e comprovar laços familiares para obter vagas por cota. O que explica esses critérios elásticos?

O problema se agrava quando entendemos a origem dessas práticas. A lógica que permite classificar uma pessoa como negra apenas por uma “única gota” de ancestralidade negra, a chamada one drop rule, não nasceu de movimentos antirracistas. Ela foi uma invenção de ideologias supremacistas brancas, como as promovidas pelo Ku Klux Klan nos Estados Unidos. A teoria estabelece que qualquer pessoa com o menor traço de ascendência negra é automaticamente negra, negando a possibilidade de existirem mestiços. Era uma ferramenta de exclusão e segregação, destinada a reforçar uma rígida hierarquia racial e marginalizar quem não fosse “puramente” branco.

No Brasil, país marcado pela miscigenação, adotar essa visão é uma aberração histórica e social. Aqui, ser mestiço não é uma exceção, mas uma realidade majoritária. Uma pesquisa recente do Datafolha mostra que cerca de 60% dos pardos no Brasil se identificam como mestiços, reconhecem em si mesmos uma identidade híbrida, que reflete a complexidade de sua herança familiar. Mas isso é negado por movimentos que insistem em forçar categorias raciais rígidas.

O que está por trás dessa negação? É a tentativa de moldar identidades conforme conveniências ideológicas. Para certos grupos, a mestiçagem é um problema porque dificulta narrativas binárias de opressor e oprimido. Por isso, a insistência em aplicar a lógica do one drop rule de forma acrítica. O resultado é a desvalorização de uma identidade própria, a mestiça, em prol de um enquadramento que serve mais ao discurso do que à realidade das pessoas.

Esse contexto expõe a contradição na USP. Como pode a universidade mais prestigiada do Brasil abraçar essa rigidez ao mesmo tempo em que é flexível ao extremo para seus quadros docentes? Enquanto alunos são submetidos a critérios implacáveis, Marilena Chaui e outros professores conseguem autoidentificar-se como quiserem, sem o mesmo nível de escrutínio. Esse duplo padrão não é apenas uma falta de seriedade, mas um ataque à credibilidade da instituição.

A verdade é que essas políticas, aplicadas de forma tão desordenada, não contribuem para a inclusão. Elas criam uma atmosfera de confusão e ressentimento. Ao negar a complexidade da mestiçagem e aplicar teorias importadas de contextos raciais completamente diferentes do brasileiro, estamos não apenas falhando em enfrentar o racismo, mas também em compreender nossa própria história.

Se a USP e outras universidades desejam liderar o debate sobre questões raciais, precisam fazê-lo com base na realidade, não em modismos ou em lógicas importadas que não fazem sentido no Brasil. Incluir é necessário, e é algo que precisa ser feito com seriedade e respeito ao contexto brasileiro. Caso contrário, o que se cria não é inclusão, mas uma caricatura dela. O preço disso será pago não pelas elites acadêmicas, mas pelos alunos que mais precisam de oportunidades reais.

  • Mais lidas
  • Mais comentadas
  • Últimas notícias
1

Lindbergh tem um plano para salvar o governo Lula

Visualizar notícia
2

Crusoé: Acabou a lua de mel dos americanos com Trump?

Visualizar notícia
3

Crusoé: A dinâmica da provocação russa contra a França

Visualizar notícia
4

Manifestantes anti-Israel causam caos em universidade de elite após ameaça de bomba

Visualizar notícia
5

“Um tiro no pé” do governo Lula

Visualizar notícia
6

OpenAI lança “agentes” com planos de até R$ 100 mil mensais

Visualizar notícia
7

Um novo limite para o Pix

Visualizar notícia
8

PT vai à PGR por tornozeleira eletrônica em Bolsonaro

Visualizar notícia
9

Líder do PL quer aumentar blindagem do Congresso

Visualizar notícia
10

Trump prestes a deportar 240 mil ucranianos?

Visualizar notícia
1

Lindbergh tem um plano para salvar o governo Lula

Visualizar notícia
2

As relagias para assessores do Senado na nova 'era Alcolumbre'

Visualizar notícia
3

Líder do PL quer aumentar blindagem do Congresso

Visualizar notícia
4

Janones faz acordo com PGR por rachadinhas

Visualizar notícia
5

Nem Ciro Gomes tirou o nome dele do SPC

Visualizar notícia
6

Com Gleisi ministra, Lula faz golaço para a direita

Visualizar notícia
7

PT vai à PGR por tornozeleira eletrônica em Bolsonaro

Visualizar notícia
8

Crusoé: Acabou a lua de mel dos americanos com Trump?

Visualizar notícia
9

Um novo limite para o Pix

Visualizar notícia
10

Romênia acusa simpatizantes da Rússia de tentativa de golpe

Visualizar notícia
1

Governo Lula anuncia medidas para tentar baixar preço dos alimentos

Visualizar notícia
2

Dallagnol critica acordo da PGR com Janones sobre “rachadinha”

Visualizar notícia
3

Macron sobe o tom contra Putin

Visualizar notícia
4

STF prejudica Brasil em ranking da democracia

Visualizar notícia
5

Defesa pede que Bolsonaro seja julgado pelo plenário do STF

Visualizar notícia
6

Bolsonaro chama investigação sobre golpe de ilegal e critica parcialidade de Moraes

Visualizar notícia
7

“Terraplanismo argumentativo”, diz defesa de Heleno sobre PGR

Visualizar notícia
8

Em defesa, Cid nega que foi coagido em delação e fala que era apenas ‘ajudante’

Visualizar notícia
9

Janones faz acordo com PGR por rachadinhas

Visualizar notícia
10

Trump volta a usar “astronautas abandonados” contra Biden

Visualizar notícia

Assine nossa newsletter Inscreva-se e receba o conteúdo do O Antagonista em primeira mão!

Tags relacionadas

Marilena Chauí
< Notícia Anterior

Lana Del Rey anuncia álbum inédito para 2025

25.11.2024 00:00 4 minutos de leitura
Próxima notícia >

Namorada de Liam Payne revela conversas antigas do cantor

25.11.2024 00:00 4 minutos de leitura
avatar

Madeleine Lacsko

Os comentários não representam a opinião do site; a responsabilidade pelo conteúdo postado é do autor da mensagem.

Comentários (0)

Torne-se um assinante para comentar

Notícias relacionadas

Com Gleisi ministra, Lula faz golaço para a direita

Com Gleisi ministra, Lula faz golaço para a direita

Madeleine Lacsko Visualizar notícia
Leonardo Barreto na Crusoé: Até o limite e além

Leonardo Barreto na Crusoé: Até o limite e além

Visualizar notícia
Isentões agora são maioria: mais um dia difícil na vida dos inimigos

Isentões agora são maioria: mais um dia difícil na vida dos inimigos

Madeleine Lacsko Visualizar notícia
Haddad acusa Globo de produzir fake news bolsonarista no Jornal Nacional

Haddad acusa Globo de produzir fake news bolsonarista no Jornal Nacional

Madeleine Lacsko Visualizar notícia
Icone casa

Seja nosso assinante

E tenha acesso exclusivo aos nossos conteúdos

Apoie o jornalismo independente. Assine O Antagonista e a Revista Crusoé.