A folha, a árvore, a floresta e Jair Bolsonaro A folha, a árvore, a floresta e Jair Bolsonaro
O Antagonista

A folha, a árvore, a floresta e Jair Bolsonaro

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Ricardo Kertzman
6 minutos de leitura 21.11.2024 12:29 comentários
Análise

A folha, a árvore, a floresta e Jair Bolsonaro

Provas não faltam contra Bolsonaro e um monte de gente. Ânimo por parte do Supremo Tribunal Federal, sobretudo Alexandre de Moraes, tampouco

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Ricardo Kertzman
6 minutos de leitura 21.11.2024 12:29 comentários 10
A folha, a árvore, a floresta e Jair Bolsonaro
Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil

Algumas das coisas que mais me perturbam são vídeos sobre astronomia – assunto que gosto muito, aliás – mostrando as relações de tamanho e grandeza entre corpos no universo observável. O sentimento de insignificância que me bate – e me abate – quando constato que sou absolutamente nada perante o cosmos, é avassalador e mais ou menos curável após muitos Carajillos (um drink à base de licor e café expresso).

E com quase tudo é assim. Até mesmo com uma simples cebola, se vista (cortada) do alto. Quanto mais nos afastamos, mais conseguimos identificar as linhas, ou camadas, a partir do seu núcleo. Para entendermos bem o que se passou na porção conspiracionista e golpista da sociedade brasileira nos últimos anos, precisamos nos distanciar e observar “por cima” a floresta, depois a árvore e, finalmente, a folha.

A pré-campanha eleitoral de 2018 já dava mostras do que teríamos pela frente. Durante a campanha, propriamente dita, o então candidato à Presidência da República, Jair Bolsonaro, falava abertamente em “Fuzilar a petralhada”, até ser vítima, ele mesmo, de uma facada em Juiz de Fora (MG), asquerosamente chamada de “fakeada” pela esquerda. Ali, eu diria, se iniciava uma escalada de cisão, rancor e ódio irreversível.

Pregação golpista

Ao vencer as eleições, em seus discursos de posse no Congresso Nacional e no Palácio do Planalto, Bolsonaro deu continuidade à crispação ideológica. Pior. Alguns meses depois, começou a apoiar abertamente movimentos golpistas que pediam o fechamento do Congresso e do STF. Frequentou manifestações, sobrevoou a Praça dos Três Poderes e apontou o dedo para o Supremo (as imagens, à época, falavam por si).

Antes mesmo do primeiro turno das eleições de 2018, Eduardo Bolsonaro, vulgo Dudu Bananinha, já dizia que bastava um cabo e um soldado para fechar o STF. Mas a investida bolsonarista contra a ordem democrática iniciou-se de verdade a partir da ira contra o deputado federal Rodrigo Maia, presidente da Câmara. Em seguida, com a pandemia do coronavírus e as decisões da Suprema Corte, o caldo entornou de vez.

Aos trancos e barrancos, o Brasil chegou à pré-campanha de 2022. Após tudo o que fez de grotescamente desastroso ao país – inclusive aliar-se ao que havia de “mais centrão”, e também a uma parte da alta casta do Judiciário (Aras, Toffoli, Mendes, Lindôra e companhia), para salvar o senador e filho “Flavinho Wonka”, Jair Bolsonaro tinha agora como rival Lula da Silva, solto e ficha-limpa, em boa parte por sua própria culpa. 

Bateu o desespero

Em meio a um Brasil – e mundo – pós-pandemia, com muito mais incertezas que certezas, medo que esperança, desorganização econômica e um ambiente político absolutamente tóxico, tendo centenas de milhares de mortos por Covid-19 espetados na conta, o “mito” e sua turba golpista foram dando passos cada vez mais aloprados, principalmente com o início da campanha eleitoral e os indícios de que seriam derrotados.

As lives patéticas, as manifestações de 7 de setembro, os atos ministeriais, o uso eleitoral descarado da máquina pública, o financiamento de blogueiros sujos e veículos de imprensa, aliados políticos fora de controle (Daniel Silveira, Carla Zambelli, Roberto Jefferson), tudo foi se somando e se misturando de forma indissociável, criando um arcabouço ilegal de toda sorte (eleitoral, criminal, cível) ao redor do “imbrochável, incomível e imorrível”.

Reuniões gravadas em que se discutia abertamente crimes – de responsabilidade e comuns -, desde o uso da Polícia Federal em favor do presidente à formas de governo após um possível golpe de Estado, advogados pessoais envolvidos com criminosos, milicianos e assassinos de aluguel ao redor da família presidencial, mansões, rachadinhas… Bolsonaro fez a própria cama como ninguém mais poderia fazer. E nela acabou deitando.

Aloprando de vez

Derrotado nas urnas, que amaldiçoou mundo afora, perdido, isolado de cabeças minimamente pensantes e cercado de idiotas de todos os tipos, deprimido, descolado da realidade, sabedor de tudo o que fez nos verões passados, já com um tal de Xandão nos calcanhares, ao que tudo indica, o patriarca do clã das rachadinhas sucumbiu ao plano – que, agora sabemos, já não era não mais uma ideia apenas – de tomar o poder à força.

Há uma sucessão de fatos, declarações, atos, enfim, tudo gravado em vídeos, que quando organizados de forma objetiva e cronológica, somados à todas as provas materiais já obtidas pela Justiça desde então, impedirão qualquer dissociação de Jair Bolsonaro e boa parte do seu “núcleo duro” de uma lista enorme de crimes contra o Estado Democrático de Direito, que certamente lhes renderá pesadas condenações.

Toda essa “floresta” descrita acima é gigantesca e cheia de árvores (capítulos), e como em toda floresta, as árvores estão interligadas por um emaranhado de raízes e solo em que habitam espécies diversas: políticos, militares, servidores públicos, empresários, jornalistas, blogueiros, militantes, enfim, “folhas” que se misturaram e balançaram ao sabor dos ventos golpistas emanados de uma fonte, de uma chama, de um líder: o centro da cebola. 

Nada do que foi será

Provas não faltam contra Jair Bolsonaro e um monte de gente. Ânimo por parte do Supremo Tribunal Federal, em especial de Alexandre de Moraes, tampouco. E o governo de turno é liderado por um ex-presidiário, condenado por corrupção e lavagem de dinheiro, que sonha, dia sim e outro também, em se vingar de tudo e de todos que combateram os bilionários esquemas de corrupção protagonizados pelo PT.

Sim, tem muita coisa errada acontecendo. Bandidos tendo o passado criminoso reescrito por juízes complacentes, empresários corruptos sendo novamente beneficiados pelo governo, parte do Judiciário caminhando no sentido autoritário e até mesmo, segundo alguns, inconstitucional, ministros nos papeis de vítima, investigador, acusador e julgador, contas públicas estouradas, política externa desastrosa, enfim, o Brasil sendo Brasil.

Porém, nada do que está errado justifica, valida ou elimina os crimes que estão sendo desnudados. O “mito”, que prometia nos salvar e redimir, chafurdou na mais profunda lama do que ele mesmo chama de sistema. E deixou o DNA de 64 – aquele que defende tortura e eliminação do pensamento divergente – tomar conta do presidente eleito, que tinha tudo para, definitivamente e dentro da lei, figurativamente falando, extirpar a má esquerda do país.

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Ricardo Kertzman

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Comentários (10)

Marcelo José Dias Baratta

21.11.2024 19:01

Parabéns. Gostei do sentido figurado da floresta e o exercício de abstração proposto. Corroboro com tudo que escreveste. Onde vai dar tudo isso, não sei. Sei que boa coisa, pode não dar. Hoje recebi uma fala do Senador e general Mourão, há ali, claramente, um clamor público, isso é sério demais. Tomara Deus que os ânimos se aclamem, digo que, quem cometeu crime, tem que ser punido exemplarmente, Todos, sem exceção, seja crime de corrupção, seja outro crime, inclusive, acho (achar é ignorar) que o STF, seus membros devem ter limites de atuação e esses limites, ou o descumprimento deles, motivo de destituição imediata de quem prevaricou.


Marcelo José Dias Baratta

21.11.2024 19:01

Parabéns. Gostei do sentido figurado da floresta e o exercício de abstração proposto. Corroboro com tudo que escreveste. Onde vai dar tudo isso, não sei. Sei que boa coisa, pode não dar. Hoje recebi uma fala do Senador e general Mourão, há ali, claramente, um clamor público, isso é sério demais. Tomara Deus que os ânimos se aclamem, digo que, quem cometeu crime, tem que ser punido exemplarmente, Todos, sem exceção, seja crime de corrupção, seja outro crime, inclusive, acho (achar é ignorar) que o STF, seus membros devem ter limites de atuação e esses limites, ou o descumprimento deles, motivo de destituição imediata de quem prevaricou.


Vera Regina Raposo Lourenço

21.11.2024 18:34

Nossa! Que artigo maravilhoso. Parabéns


Paulo Pires

21.11.2024 15:11

Deus te ouça, Márcio!!!


Márcio Roberto Jorcovix

21.11.2024 14:20

Vamos olhar o futuro com otimismo. O Bozo vai preso, Marçal se tornará inelegível; e aí sobra espaço para um nao maluco e não ladrao se eleger, tipo Ratinho Júnior, Zema, Tarcísio e por aí vai. Viajei muito na maionese ??


Paulo Pires

21.11.2024 14:19

Perfeito! O nefasto Bozo não só não extirpou a esquerda como fortaleceu-a. Essa praga tem que ficar inelegível para ficarmos livre do Nine em 2026!!!


Rosa

21.11.2024 13:33

Parabéns, um artigo muito bom!!! Claro e cronológico, a gente esquece, mas você não


Paulo Pinto

21.11.2024 13:32

Provas não faltam contra…. neste lero-lero todo o autor não mostra uma única prova. Dois anos de investigação. E a direita só crescendo.


Luis Eduardo Rezende Caracik

21.11.2024 13:17

Mas, se me permite, Ketzman, a coisa mais errada continua sendo o judiciário complacente e prostituído, que atua guiado por leis que visam a impunidade. Já antevejo os julgamentos seguidos de embargos infringentes que demorarão anos a fio, e que envenenarão ainda mais a já altamente tóxica política brasileira. Veja o exemplo de Fenando Collor agora mesmo.


Marian

21.11.2024 13:06

Mas quem está no poder agora? Quem está preso? Com vozes silenciadas, a verdade custa aparecer, mas aparece um dia.


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