Um teste simples para propostas de reforma do STF
O Congresso está no ataque, procurando forçar o Supremo Tribunal Federal (STF) a recolher suas asas e agir com mais cautela quando opera na fronteira que separa o Poder Judiciário do Poder Legislativo...
O Congresso está no ataque, procurando forçar o Supremo Tribunal Federal (STF) a recolher suas asas e agir com mais cautela quando opera na fronteira que separa o Poder Judiciário do Poder Legislativo.
Nesta quarta-feira (4), como relatou o Antagonista, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado (foto) levou menos de um minuto para dar parecer favorável a uma PEC que restringe o poder dos ministros do STF de proferir decisões monocráticas.
Há várias outras iniciativas, que podem ser divididas em dois tipos.
De um lado, estão aquelas que procuram retirar algum assunto da alçada de decisão do Supremo.
Um exemplo é o projeto de lei que reinstitui o marco temporal para a demarcação de terras indígenas recentemente derrubado pela corte.
Outro, a proposta de emenda constitucional que derruba a distinção, também recém-estabelecida pelo STF, entre posse de drogas para tráfico ou consumo próprio com base no peso do produto apreendido.
E ainda ideia de um plebiscito que transfira do plenário de onze ministros para todo o eleitorado o poder de deliberar sobre a ampliação das hipóteses legais de aborto no Brasil.
Não vejo como estabelecer uma regra prévia sobre cada assunto, exceto a de que o STF deveria buscar, tanto quanto possível, a autocontenção. Mas o tribunal também tem um dever constitucional de “prestar jurisdição”, ou seja, não pode se abster de decidir apenas porque o tema é polêmico. Tudo vai depender do caminho que o processo percorreu até chegar à corte e da existência, ou não, de vácuo legal criado por uma deliberada e injustificável inação do Congresso diante daquele assunto.
O outro tipo de medida diz respeito ao desenho institucional do STF e ao seu funcionamento interno. Para esses casos, acho que existe um teste simples sobre aquilo que merece ser discutido ou deveria ser descartado desde o início. Já chego lá.
Antes disso, observo que projetos como o aprovado na manhã de hoje pela CCJ do Senado também podem ser vistos como uma interferência de um poder no funcionamento do outro. O Congresso ditar como o STF distribui internamente os processos, para decisão de um único ministro, das turmas ou do plenário, equivale ao STF querer arbitrar sobre os prazos regimentais da Câmara ou o funcionamento das comissões do Senado.
Se o projeto discutido nesta quarta virar lei no futuro, o STF terá um bom argumento para declará-lo inconstitucional por representar… uma violação da divisão entre Poderes.
Mas isso não significa que o Congresso deva se abster de discutir e votar projetos como esse. Esse é um modo de constranger o STF e forçá-lo a repensar práticas que vêm minando a sua própria legitimidade – como é o caso, precisamente, do excesso de decisões monocráticas.
Dou agora dois exemplos de propostas que os brasileiros não deveriam deixar prosperar no Congresso em nenhuma circunstância.
Uma é aquela que autoriza os parlamentares a suspender a eficácia de decisões não unânimes do Supremo. Outra, pretende modificar o processo de escolha de ministros, de tal modo que o presidente da República e o Congresso se alternariam nas indicações.
As duas, sob o pretexto de restaurar o equilíbrio entre Poderes, na verdade buscam ampliar a força dos parlamentares. Essa é uma das tônicas da atuação recente do Congresso brasileiro. Tornando obrigatória a execução das emendas parlamentares, ele conseguiu aumentar sua autonomia em relação ao Executivo. Agora, parece buscar maneiras de se impor sobre o STF.
Este é o teste: se um projeto qualquer de lei significa aumentar ainda mais a força de um Congresso que não hesita em legislar em causa própria (lembremos da PEC da Anistia) diante dos outros Poderes, ele não pode passar. Simples assim.
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