Meu heterodoxo favorito
Ninguém gostou de ouvir que Marcio Pochmann vai assumir o IBGE — com exceção de alguns petistas. É muito curioso que o presidente Lula tenha feito questão de impor o economista da Unicamp à ministra Simone Tebet. A repercussão...
Ninguém gostou de ouvir que Marcio Pochmann vai assumir o IBGE — com exceção de alguns petistas. É muito curioso que o presidente Lula tenha feito questão de impor o economista da Unicamp à ministra Simone Tebet. A repercussão da indicação fala por si. Elena Landau está de luto, Edmar Bacha levou para o lado pessoal e os juros futuros se animaram.
Os governistas argumentam que é injusto. Exibem o currículo de Pochmann, recheado de artigos e livros publicados, como se as críticas dirigidas ao economista tratassem da quantidade, e não da qualidade do que ele fez ou escreveu. E ainda escreve. O heterodoxo deixou em 2012 o comando do Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada (Ipea), que chefiou por cinco anos, sob péssima impressão. Desde então, tentou se eleger prefeito de Campinas por duas vezes (2912 e 2016), e não conseguiu nem o cargo de deputado federal, em 2018.
As postagens de Pochmann no Twitter entram automaticamente para o anedotário nacional. Em 2020, ele enxergou no Pix “mais um passo na via neocolonial”. Em 2021, defendeu em entrevista a exploração espacial brasileira, em nome da autonomia nacional. Na mesma entrevista, minimizou o benefício de uma inflação estável. Também já sugeriu a adoção de jornadas de trabalho de apenas quatro horas diárias e três dias por semana.
Tudo isso é dito e proposto de forma genuína, quase ingênua. É divertida essa tentativa de inventar a roda. E muito menos perigosa do que o carisma de Maria da Conceição Tavares, cujo pensamento sobrevive à base de memes nas redes sociais, ou do que as novas ideias de Andre Lara Resende, que, independente de onde venham e para onde vão, sempre se apoiarão no sucesso do Plano Real. Pochmann é meu heterodoxo favorito. Pensou tão fora da caixa que se perdeu no caminho e virou um símbolo. Ou, como diria Lula, virou uma ideia (errada).
Piadas à parte, há espaço para esse tipo de discussão especulativa — de onde, ainda que raramente, pode sair alguma coisa —, mas esse lugar certamente não é um instituto de estatística. O grande mérito da carreira de Pochmann foi expor os efeitos de um pensamento dogmático na prática sem precisar causar uma carnificina, como no século passado. É impossível errar no papel, mas muito difícil acertar na vida real.
A partir da posse do professor da Unicamp, 100% dos números divulgados pelo IBGE estarão sob desconfiança, ainda que não haja nada de errado com eles, como garante a ministra do Planejamento. Essa estatística, feliz ou infelizmente, não será possível manipular.
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