A culpa é do eleitor (carta aberta aos fascistas e extrema-direita)
Agora é continuar nessa luta incansável contra as trevas. Persistir fazendo as mesmas coisas, o que as pessoas do lado certo da história sempre fazem
(((AVISO: este texto é uma carta aberta fictícia da esquerda brasileira pós-eleições. Contém ironia e sarcasmo)))
A culpa só pode ser do eleitor. Afinal, a esquerda fez tudo certo. O amor venceu. A democracia foi preservada. A esquerda não tem culpa da existência de tanto burro e fascista.
Durante todos esses anos a esquerda apontou o fascismo e os fascistas. Não faz o “L”? Fascista. Não é fã da Janja? Fascista. Se recusa a falar todEs? Fascista. A esquerda apontou fascismo até em barraquinha de cachorro-quente. Afinal, se há 10 pessoas na mesa e se senta um fascista ou as demais se levantam ou são 11 fascistas. Então é preciso nomear os fascistas.
Depois do primeiro turno, a esquerda dá a eles a oportunidade de provar que não são fascistas. Boulos fez até live com o Pablo Marçal. Os eleitores fazem o quê? Votam no Nunes. Bem feito. Tomara que fiquem sem luz. Não dá para acreditar que exista pobre de direita.
A parte da esquerda foi feita. Veja a campanha de Guilherme Boulos.
Em 2020, gastou R$ 7,74 milhões para conseguir 40,6% dos votos. Agora gastou R$ 57,27 milhões para conseguir a mesmíssima coisa. Foi o candidato em que o PT mais investiu no país, recebeu R$ 44 milhões do partido. O valor é mais que a soma destinada aos 4 candidatos do PT que disputavam segunro turno em capitais.
Guilherme Boulos não foi eleito.
Aliás, ele conseguiu ficar em terceiro lugar numa eleição que só tinha dois candidatos. A abstenção teve mais eleitores. O mesmo ocorreu com Maria do Rosário, em Porto Alegre. A esquerda até se arrependeu de ter mandado água e cobertor na enchente, deviam ter morrido afogados Janja apoiou os dois candidatos, ou seja, o eleitor não tinha nenhuma razão para escolher outros, os fascistas.
Por que o voto do eleitor foi majoritariamente conservador e predominantemente contra a esquerda? Simples, o eleitor brasileiro é reaça não sabe votar. É por isso que oportunistas estão aí. O eleitor decide com base em fake news. Pior, tem os evangélicos que votam em quem o pastor manda. Como se não bastasse, ainda surgiram os coaches picaretas na eleição. A fascistada se aproveita da ignorância.
Tudo o que interessa ao povo brasileiro foi oferecido ao eleitor pela esquerda. Não tem como negar e eu provo para vocês.
Comecemos pela principal pauta do Brasil, o gênere neutre. Teve até no hine nacional da campanha de Boules. Teve parlamentar querendo trocar a palavra mãe por “pessoa que gesta”. Ou pessoe que geste, ainda estou em desconstrução. Por que o povo não reconhece esses esforços de inclusão? Analfabetismo funcional. Ou fascismo, como apontamos diariamente nas redes sociais.
Aliás, essas mesmas redes foram utilizadas em muitos esforços de conscientização. Felipe Neto, por exemplo, foi um guerreiro incansável contra o ódio. Os artistas do Leblon e da Vila Madalena, cujas opiniões são tão valorizadas pelo povo brasileiro, também fizeram sua parte. Amigos da Paula Lavigne e de Caetano gravaram vídeos educativos indicando os nomes dos candidatos que o povo deveria escolher.
A elite que faz cosplay de MST desceu do salto e virou influencer, instruindo o povo. Senhores de meia idade que colecionam carro importado e são casados com mulheres 30 anos mais novas ensinavam que ou você vota no Boulos ou é fascista lobotomizado. Socialites sustentadas pelo marido explicavam que a justiça social só viria se você votasse em Boulos contra o fascismo.
Che Guevaras de apartamento acordavam cedo, por volta das 11h, para xingar todo mundo de bolsonarista no Twitter. Usando perfis falsos, claro, para poder xingar também os amigos dos pais. É um verdadeiro trabalho de guerrilha, comparável apenas aos esforços dos vietnamitas que venceram os Estados Unidos na guerra do Vietnã. Por que o povo não ouviu esses guerreiros? Ignorância.
Os artistas foram incansáveis. Principalmente esses queridos pelo público, que frequentam o apartamento de Caetano e Paula Lavigne. Gravaram diversos vídeos de apoio ao Boulos. Inclusive o pessoal que nem mora em São Paulo, maioria da turma, fez esse esforço. Nem assim o eleitorado conseguiu entender em quem era para votar.
A Janja entrou em campo para apoiar diversos candidatos. Em São Paulo, ela tomou coragem de lançar um manifesto de sororidade só de mulheres empoderades. Elas alertavam que seria um perigo para as mulheres de São Paulo ter Nunes como prefeito. Afinal, a mulher dele fez um boletim de ocorrência de violência psicológica contra ele. E isso não é um mal menor que a violência física.
A fascistada já tentou diminuir a história. E por que não falaram do Silvio Almeida? Por que não falaram do Lulinha acusado de agressão pela ex-mulher? Por que não falaram do Lulinha e da ex chamando a Janja de p*ta? Simples, para evitar revitimização. Quem tem de decidir falar é a vítima. Expor a vítima chama revitimização e é coisa que só a extrema-direita faz.
Isso foi suficiente para que as mulheres entendessem que só a esquerda respeita a existência delas? Não. Impossível entender o que mais é possível fazer para mulheres se sentirem valorizadas.
O clima fascista do país faz com que aceitem migalhas. A direita, a centro-direita e o centrão fizeram muitas mulheres prefeitas. Das 728 prefeitas eleitas este ano, 348 são de direita e centro-direita, 251 de centão e apenas 129 de centro-esquerda e esquerda. O que são prefeituras perto do privilégio de uma primeira-dama empoderade e amigue de Érika Hilton, nossa diva pop? Mas o povo é iletrado, não entende o que é representatividade, se ilude muito.
As fake news contra a esquerda não param. E tem gente que acredita. Nas eleições presidenciais, tinha bolsomínion dizendo que, num governo Lula, as universidades iam ter travesti mostrando o c* e proibiriam leitura da Bíblia. Felizmente a maioria não acreditou e fez o L, única saída para provar que não são de extrema-direita.
Como se não bastasse tudo isso já feito para mostrar ao eleitor que a extrema-direita não presta e que a esquerda é o lado certo da história, ainda teve o vira-voto. Teve música de vira-voto, vídeo para convencer marçalete, as pessoas foram gentis com Uber e motoboy, serviram o tradicional café com bolo, explicaram que o fascismo não leva a nada.
Infelizmente, num país extremista, a gratidão e a gentileza são desvalorizadas. Quando abriu a urna, nem a Vila Madalena tinha votado no Boulos. Orgulho apenas do pessoal samambaia e chão de taco de Santa Cecília que jamais trairia o movimento. Agora é continuar nessa luta incansável contra as trevas. Persistir fazendo as mesmas coisas, o que as pessoas do lado certo da história sempre fazem.
A esquerda ofereceu tude que o eleitor queria. Ofereceu todes em quem ele poderia votar. Não tem culpa da derrota. Obviamente, a culpa é do eleitor. Ou eleitore.
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