Josias Teófilo na Crusoé: A ditadura da informalidade
Pensamento que põe tudo o que é marginal no centro da cultura brasileira não parou até hoje e está na origem do esquecimento de importantes artistas
Joaquim Pedro de Andrade, quando era um jovem cineasta, no final dos anos 1950, fez um documentário sobre Manuel Bandeira e Gilberto Freyre financiado pelo Instituto Nacional do Livro. O filme, chamado inicialmente de O Mestre de Apipucos e O Poeta do Castelo (1959), mostrava os dois personagens em seus respectivos lares, com narração em off. Porém, enquanto Manuel Bandeira morava num apartamento simples no centro do Rio de Janeiro, Gilberto Freyre habitava uma grande casa histórica no bairro de Apipucos, no Recife. E enquanto Bandeira recitava um poema, Freyre falava da sua rotina e de sua casa. Na primeira exibição do filme o contraste ficou muito evidente, Freyre foi visto como um esnobe.
À época, Gilberto Freyre escreveu um artigo comentando o curta e rebatendo as críticas que recebeu. A solução de Joaquim Pedro de Andrade foi separar o filme em dois – mas a polêmica estava instaurada. E aparentemente deixou mágoas, uma vez que Gilberto Freyre (ou sua família) não incluiu o filme no resumo biográfico publicado nos livros de sua autoria. O que, aliás, precisa ser corrigido, esses dois filmes são duas preciosidades, tanto pela relevância central dos personagens na cultura brasileira como pelo refinamento da linguagem cinematográfica.
Luciana Corrêa de Araújo escreveu no livro Joaquim Pedro de Andrade: Primeiros Tempos que o contraste entre os personagens é uma “evidente contraposição entre os dois escritores, na qual cabem a Bandeira os valores positivos”. E mais: “Seu despojamento [do poeta] ganha valoração muitos pontos acima da exuberância de Freyre, vista sob a ótica da vaidade e do elitismo”. Só que a interpretação da pesquisadora não encontra confirmação em nenhum comentário de Joaquim Pedro. Na verdade, ele trata Freyre – que era amigo pessoal do seu pai, o criador do Iphan, Rodrigo Melo Franco de Andrade – com grande reverência, chamando-o de “mestre”. E no final da vida escreveu um roteiro baseado em Casa Grande & Senzala, com autorização do mestre, e o filme não foi realizado apenas porque ele adoeceu e veio a falecer.
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