Orlando Tosetto na Crusoé: Acenda e puxe — mas não prenda nem passe
Doravante, é permitido portar o que é proibido comprar. Que os deuses da Democracia me perdoem, mas... ficou meio esquisito, não ficou?
Em sua coluna semanal para Crusoé, Orlando Tosetto Junior escreveu sobre a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que autorizou usuários de drogas a portar até 40 gramas de entorpecentes sem serem criminalizados.
Venho de saber que o STF, aquele coven de pessoas excelentes, magníficas mesmo, que nos dias de muito calor exsudam democracia e amor junto com o suor, e nos de frio esfregam as mãos enquanto ostentam a severidade saudável dos grandes guardiões, esse pessoal lindo, eu dizia, achou que tá tudo bem as pessoas andarem por aí “portando” maconha. Aliás, um dos preclaros foi mais longe e deixou claro que, por ele, não só a maconha, mas toda e qualquer outra das chamadas “substâncias entorpecentes” pode ser portada por aí sem problemas. É o tipo da notícia que me deixa meio espantado, e o espanto mostra o quanto envelheci: está entranhado em mim o medo antigo, que vem da adolescência nos anos 80, de ser pego pela polícia com maconha ou qualquer outra substância dita entorpecente.
O fato é que a gente – os adolescentes dos anos 80 – tinha muito medo de ser surpreendida com as parangas ou os “cigarrinhos de artista” num bolso da calça ou da camisa, ou até dentro do tênis (a polícia andava pelas ruas com cães farejadores; o chulé ajudava a enganar o faro dos pastores-alemães). A juventude e os tiozões prafrentex hodiernos doravante andarão bem mais descansados do que nós andávamos lá por 1985. Sorte deles.
Digressão (eu sempre faço uma digressão; hoje acho que vou fazer mais de uma): o verbo “portar” está certinho quando o assunto é maconha, documento, cheque, promissória, pastinha 007, medalhinha da Santa, camisa aberta no peito, colarzão grosso de ouro ou passaporte e convite para palooza legalista em Lisboa, já que “portar” quer dizer “trazer consigo, transportar, trajar”. Já não é tão bem usado quando se fala em “portar deficiência física”, porque rara é a deficiência que tem conserto, que pode deixar de ser levada daqui pra lá por quem a tem, ou entregue a outrem.
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