Existe lugar no mundo para as pessoas introvertidas?
Neste planeta barulhento, a introversão tem sido tratada como patologia ou inadequação social

Em um planeta povoado por coachs, influenciadores, celebridades, sub-celebridades, ex-sub-celebridades, além dos primeiros eliminados do Big Brother Brasil e dos últimos eliminados de A Fazenda, como é que ficam os introvertidos? Há lugar no ambiente de trabalho pra quem não faz muita questão de publicar vídeos, compartilhar intimidades, distribuir abraços? Uma pesquisa feita por Mallory McCord na Old Dominion University (2025) trata dessa questão.
O estudo sugere que o principal obstáculo enfrentado pelos introvertidos não é resultado de suas características, mas dos estereótipos negativos relacionados à introversão. A pesquisa de McCord se baseia no conceito de que as pessoas são avaliadas (ou mal avaliadas) em duas dimensões principais: “calor humano” e “competência”.
De acordo com a hipótese, a suposta falta de calor humano insinua falta de capacidade. É quase – mas quase mesmo – como se as pessoas dissessem que o introvertido é um esquisitão e, sendo esquisitão, deve ser burro. Por isso ele fica no canto e evita interações sociais. Quem nunca sofreu ou cogitou um tipo parecido de julgamento? O mundo nunca foi tão hostil para os introvertidos.
A personalidade enquanto commodity
Hoje, mais do que nunca, a extroversão é tratada como um valor moral, uma habilidade que se tem ou se desenvolve. “Falar bem” já não significa a capacidade de se comunicar com eficiência e precisão, mas a técnica de impressionar ou persuadir. De, literal e metaforicamente, falar alto. Somos avaliados cada vez mais pela nossa performance (pública ou no ambiente de trabalho). Você é o seu branding.
Entre os americanos, público-alvo da pesquisa, o problema é ainda maior. Os EUA são um país que premia a extroversão e pune a introversão. No mínimo, de maneira simbólica. O introvertido é tratado em séries de tevê, filmes e livros como um “loser”, um perdedor, um estranho, e não existe forma de vida mais primitiva em um país como os EUA que a vida de um perdedor. Aquele que não chegou lá. Aquele que ainda mora na mesma cidade em que nasceu. Introvertidos – que não cantam, não dançam, não jogam basquete, não são “populares” – estão a um milímetro do ostracismo social.
Qual é o problema de quem não gosta de se exibir?
Considerem que uma pesquisa realizada pelo jornal Sunday Times mostrou que “o temor de falar em público, ou a glossofobia, é mais forte do que o medo da própria morte para 41% dos ingleses”, e outro estudo, elaborado no Programa de Pós-Graduação em Ciências Fonoaudiológicas da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), indicou que 60% dos estudantes brasileiros também sofrem com o mesmo pavor.
Uma coisa é certa: introversão não é frescurinha.
O que isso implica? Depende de como se vê o problema. Uma opção não é – ou não deveria ser – que os introvertidos se vissem obrigados a “ficar no armário” e fingir socialmente o que não são subjetivamente. Isso é mais doloroso psiquicamente do que parece. Cursos de aperfeiçoamento social, expressão corporal, teatro, dança, retórica e persuasão para se adequar?
Defendo (e a pesquisa defende) que não. Considerando obviamente os casos não-patológicos, em que a introversão é, na verdade, fobia social incapacitante, talvez as escolas, universidades e empresas pudessem agir para criar um ambiente em que a introversão fosse vista como um traço de personalidade entre outros, não mais nem menos do que isso – quase sempre irrelevante; algumas vezes, até mesmo… bom.
Se organizar direitinho, tem lugar pra todo mundo – alguns preferem o palco; outros, as últimas poltronas.
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Comentários (1)
Silvana
29.04.2025 20:35O mundo tem " comunicadores" demais. O que a de melhor que um sorriso ( pode ser meio sorriso) de um introspectivo?