CPI da Cemig no caminho de Zema
Quem acha que o caminho da reeleição de Romeu Zema está livre de problemas não leu o relatório final da CPI da Cemig, que dedicou um capítulo inteiro à análise do contrato de R$ 1,1 bilhão firmado sem licitação pela estatal mineira com a IBM Brasil (Indústria Máquinas e Serviços Ltda), que subcontratou a empresa de um ex-secretário do próprio governador e doador de sua campanha...
Quem acha que o caminho da reeleição de Romeu Zema está livre de problemas não leu o relatório final da CPI da Cemig, que dedicou um capítulo inteiro à análise do contrato de R$ 1,1 bilhão firmado sem licitação pela estatal mineira com a IBM Brasil, que subcontratou a empresa de um ex-secretário do próprio governador e doador de sua campanha.
O caso tem sido ignorado pela imprensa, mas foi objeto de intensos debates durante os trabalhos da comissão de inquérito na Assembleia Legislativa de Minas Gerais.
Após análise das provas coletadas e depoimentos de funcionários, a CPI chegou à conclusão de que a Cemig beneficiou indiretamente a empresa de call center A&C Centro de Contas S.A., de Cássio Rocha de Azevedo, ex-secretário de Desenvolvimento Econômico de Zema, entre outubro de 2019 e abril de 2021. Azevedo morreu em junho do ano passado, vítima de câncer.
“Apurou-se que o escopo do contrato da IBM seria a integração de todos os canais de atendimento da Cemig em uma única plataforma (omnichannel), com o uso de inteligência artificial e de todas as funcionalidades para um atendimento rápido e de fácil uso para o cliente. Alegou a companhia, em inúmeras oportunidades, que a parceria com a IBM teria sido precedida de ampla consulta ao mercado (…) o custo com essa parceria seria inferior ao custo somado dos 14 (quatorze) fornecedores que prestavam serviços de atendimento ao cliente e cuidavam de diferentes canais (call center, Whatsapp, site, agências físicas, totens etc).”
A realidade encontrada, porém, foi diferente.
A Cemig licitou o contrato e declarou vencedora a empresa Audac, com a proposta de R$ 88,4 milhões. O resultado da licitação foi homologado e adjudicado em março de 2020, mas nunca entrou em vigor. A estatal adiou sua execução por meses, até que, em fevereiro de 2021, comunicou seu cancelamento.
Paralelamente, a Cemig lançou nova consulta pública ao mercado e contratou a IBM por 10 anos, no valor total de R$ 1,1 bilhão. Em seguida, subcontratou a A&C, de Azevedo. Em depoimento à CPI, João Polati Filho, ex-diretor da Cemig e que ocupou o cargo entre junho de 2019 e agosto de 2020, disse que Reynaldo Passanezi Filho, atual diretor, pediu-lhe diretamente para “encontrar uma forma de mudar o resultado da licitação para serviços de call center e favorecer a A&C”.
No relatório, a CPI ressalta que a A&C já prestava serviço de call center à Cemig havia uma década, até perder a licitação para a Audac e ser recontratada via IBM. E que Azevedo, dono da empresa, virou secretário quando ainda estava em vigor o último contrato com a estatal.
“Os indícios e as provas coletadas no âmbito deste inquérito deixam muito evidente que houve um direcionamento da diretoria da Cemig para a continuidade da prestação de serviço pela A&C, empresa do então secretário de Estado, a despeito de ter sido perdedora da licitação.”
Segundo a CPI apurou, foram pagos à A&C o montante médio de R$3.000.000,00 (três milhões) por mês. “Tais fatos causam extrema perplexidade a esta comissão, uma vez que tais valores são consideravelmente maiores do que o montante que a própria Cemig pagaria pela prestação dos serviços de call center.”
“A conclusão inarredável a que se chega é que o ajuste entre a IBM e a Cemig não só garantiu a permanência da perdedora da licitação, a A&C, conforme já mencionado, empresa de propriedade do ex-secretário de Estado, que chegou a solicitar uma sala privativa no prédio da Cemig, como incrementou substancialmente os valores pagos pela prestação dos mesmos serviços.”
Consta ainda no relatório que Zema e o Novo receberam na campanha doações de R$ 5 mil e R$ 50 mil, respectivamente, de Antônio Guilherme Noronha Luiz, membro do conselho de administração e acionista da A&C.
KROLL
Os problemas encontrados na Cemig pela CPI envolvem ainda a contratação, também irregular, dos escritórios Lefosse Advogados e Thomaz Bastos, Waisberg, Kurzweil Advogados para consultoria jurídica. Um dos fatos mais escandalosos envolve a saída do advogado Eduardo Soares do quadro de sócios da Lafosse e sua nomeação como diretor jurídico da Cemig, que contratou o mesmo escritório. “Foram constatados, por meio da quebra de sigilo de dados bancários, uma série de pagamentos realizados a ele pela aludida sociedade de advogados após tal data, ou seja, no período em que ele já figurava como diretor da Cemig.”
Na lista de irregularidades encontradas pela CPI na Cemig da gestão Zema, consta ainda a contratação sem licitação da Kroll Associates Brasil Ltda, supostamente para prestar “serviços técnicos especializados de assessoria forense e econômico-financeira”.
De acordo com a CPI da Cemig, o contrato de R$ 3,4 milhões só foi validado cinco meses após o início da prestação dos serviços. “Instado a apresentar todos os documentos da contratação, o diretor de regulação e jurídico confessou que a contratação da Kroll foi feita verbalmente por ele, não existindo qualquer contrato assinado no dia 3/12/2020 e nem mesmo termo de compromisso de confidencialidade entre a Kroll e a Cemig, até mesmo porque inexistia vínculo capaz de fundamentar a atuação da mencionada empresa.”
Segundo o relatório da CPI, “causa maior espanto ainda o fato de que no processo de convalidação da contratação da Kroll não há parecer jurídico capaz de fundamentar a validade da relação jurídica contratual e, muito menos, opinião técnica e isenção o suficiente para recomendar a sua realização”. Mesmo sem contrato, a empresa teve acesso à documentação interna da companhia, inclusive acessando ilegalmente a estação de trabalho do ex-diretor administrativo.
Ressalta-se que a Kroll foi pivô da Operação Chacal, que investigou esquema de espionagem ilegal na disputa pelo controle da Brasil Telecom, e voltou à cena em 2015 na CPI da Petrobras, pelas mãos de Eduardo Cunha.
Após 8 meses de trabalho, a CPI recomendou 1 indiciamento por corrupção passiva e a instauração de ações de improbidade administrativa contra 17 pessoas físicas e 8 pessoas jurídicas. Ironicamente, uma das empresas a ser investigadas pelo Ministério Público é a Exec Consultoria, responsável pela contratação do presidente da Cemig, Reynaldo Passanezi Filho, e diversos secretários de Zema, e que tem seus sócios filiados ao mesmo Partido Novo, do governador.
A reportagem está aberta para manifestação dos citados.
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