Tarcísio e os limites da civilização
Criticado até outro dia por aliados bolsonaristas por sua moderação, governador de São Paulo agora é alvo de críticas dos opositores pelo aumento da violência policial
Tarcísio de Freitas (Republicanos, foto) tem sido apontado pelos críticos como responsável direto — e não apenas formal — pelo aumento da violência policial em São Paulo. O número de mortes por policiais militares no estado saltou de 355 em 2022 para 702 neste ano, segundo o Ministério Público paulista.
O episódio em que um PM jogou um homem rendido do alto de uma ponte — o policial foi detido nesta quinta-feira, 5 — chamou ainda mais atenção para o que seriam incentivos do governador de São Paulo e de seu secretário de Segurança, Guilherme Derrite, a esse tipo de conduta.
Os críticos não esquecem — e relembram agora — a declaração do ex-ministro da Infraestrutura de Jair Bolsonaro em defesa das ações policiais contra o crime organizado, em março, quando rebateu denúncia de ONGs ao Conselho de Direitos Humanos da ONU:
“Sinceramente, nós temos muita tranquilidade com o que está sendo feito. E aí o pessoal pode ir na ONU, pode ir na Liga da Justiça, no raio que o parta, que eu não tô nem aí.”
Moderado ou radical?
Curiosamente, Tarcísio passou os dois primeiros anos de governo sendo criticado por aliados por sua moderação, devido a gestos para o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST) e até por uma homenagem à viúva do líder sul-africano Nelson Mandela, entre outros.
Agora, o governador se defende das críticas de quem o acusa de ser radical. “O que aconteceu foi muito ruim, nós vamos tomar uma providência“, comentou em passagem pelo Congresso Nacional na quarta-feira, 4, ao responder a jornalistas sobre o homem jogado da ponte.
Tarcísio garantiu que Derrite fica e defendeu sua gestão de segurança pública: “Olhe os números que você vai ver [o trabalho de Derrite]. Olhe as estatísticas“.
Derrite também marcou posição: “Determinei o afastamento imediato dos policiais envolvidos nessa cena lamentável. A missão da Polícia Militar difere em muito desse tipo de atitude. Eles passam a cumprir expediente na Corregedoria da PM até que os fatos sejam apurados”.
Câmeras corporais
As críticas sobre a condução da segurança pública de São Paulo chegam em um momento em que Tarcísio precisa se manter na posição de herdeiro político de Bolsonaro sem ser afetado pelo indiciamento do ex-presidente e de 36 de seus aliados por tentativa de golpe de Estado.
Tratar criminosos com rigidez é obrigação das autoridades, e é uma demanda de grande parte da população brasileira, mas desde que se faça dentro da lei — sob o risco de prejudicar o próprio trabalho eficiente da segurança pública.
Nesta quinta, Tarcísio se reposicionou sobre o uso de câmeras corporais pelos policiais, mudando o discurso:
“Você pega a questão das câmeras: eu era uma pessoa completamente errada nessa questão. Eu tinha visão equivocada, fruto da experiência pretérita que tive.”
O governador seguiu:
“Hoje estou completamente convencido [de] que é um instrumento de proteção da sociedade e do policial. E nós vamos não apenas manter, mas ampliar o programa. E tentar trazer o que tem de melhor em termos de tecnologia.”
Armadilha
Confrontar o discurso leniente da esquerda com quem comete crimes defendendo punições não contempladas na legislação é uma armadilha para os políticos de direita.
O senador Jorge Seif (PL-SC) caiu nessa armadilha na quarta, ao publicar uma mensagem no X (e depois apagá-la):
“Imprensa nacional demonizando a PM de SP. O erro dos policiais foi ter jogado o meliante em um córrego. Deveriam ter jogado do penhasco. Porque com essa justiça sem vergonha que libera vagabundo em audiência de custódia, levar pra delegacia e ser satirizado por criminoso é o fim do mundo. Tomar um banho no córrego é prêmio.”
Ex-secretário da Pesca de Bolsonaro, Seif seguiu: “Minha solidariedade e apoio INCONDICIONAL aos PMs e ao Secretário de Segurança Publica Guilherme Derrite. O ‘filósofo’ Sivuca já dizia em 1986 ‘bandido bom é bandido morto’. Tá com pena das vítimas da sociedade? Leva pra casa!”.
O fato de o senador ter apagado a mensagem dispensa qualquer comentário sobre o conteúdo.
A porção da direita que não quiser pegar o mesmo barco de Bolsonaro em direção à irrelevância política não precisa ter “pena das vítimas da sociedade”, mas apenas tratar os criminosos com o rigor da lei — e garantir que as normas sejam cumpridas, se esse for o problema do sistema.
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