Elites progressistas em negação e a desconexão com a vontade popular

07.03.2025

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Elites progressistas em negação e a desconexão com a vontade popular

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Alexandre Borges
4 minutos de leitura 03.10.2024 08:33 comentários
Análise

Elites progressistas em negação e a desconexão com a vontade popular

Artigo de Simon Kuper no Financial Times exemplifica a desconexão das elites progressistas, que insistem em rotular o voto popular em figuras como Donald Trump como "irracional"

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Elites progressistas em negação e a desconexão com a vontade popular
Imagem: IA por Alexandre Borges

No Financial Times, o colunista Simon Kuper evidenciou um problema recorrente entre as elites progressistas: a incapacidade de compreender as motivações do eleitorado que apoia líderes populistas como Donald Trump.

Kuper, em sua análise esnobe e alienada, afirma que esse comportamento eleitoral é “irracional”, sugerindo que o eleitorado deveria preferir políticas e candidatos progressistas que seriam mais “racionais”. Não vou perder tempo com o uso pedestre e positivista da ideia de razão, que é confundida com “estar correto”. Em termos político, o que importa é entender essa visão que reflete uma profunda desconexão das elites em relação às reais preocupações das pessoas comuns.

A negação desse fenômeno, descrita por Kuper, pode ser compreendida à luz dos estágios do luto de Elisabeth Kübler-Ross, especialmente o primeiro estágio: a negação. As elites progressistas estão presas nesse estágio, recusando-se a aceitar que boa parte da população rejeita suas visões de mundo. Ao invés de reconhecer as preocupações legítimas, como questões de segurança, identidade e economia, figuras como Kuper preferem demonizar o eleitorado que não segue os “especialistas”.

Essa desconexão já foi amplamente discutida por intelectuais como Jonathan Haidt, em The Righteous Mind, que explora as raízes psicológicas das motivações eleitorais. Haidt argumenta que a política não é apenas uma questão de cálculo racional, mas é profundamente influenciada por fatores morais e emocionais. Ao ignorar esses elementos, as elites progressistas falham em compreender que os eleitores são movidos por valores que vão além da mera lógica econômica. Eles buscam identidade, pertencimento e o respeito aos seus costumes e crenças.

Christophe Guilluy, em seu livro O fim da classe média, também destaca a desconexão das elites, que se isolam em grandes centros urbanos e perdem contato com as questões que afligem a maioria da população. Segundo ele, esse isolamento contribuiu para o surgimento de uma “revolta silenciosa” contra as elites globais, que se expressa no apoio a líderes populistas.

A obra A revolta das elites, de Christopher Lasch, complementa essa análise ao argumentar que as elites modernas desprezam a classe trabalhadora e se afastam das preocupações cotidianas do cidadão comum. Para Lasch, o apoio popular a líderes populistas reflete uma reação contra a elitização da política e a crescente exclusão das classes médias e trabalhadoras dos centros de poder.

Outro importante pensador que aborda essa crise é Patrick Deneen, em Why Liberalism Failed. Ele explora como o liberalismo progressista, ao desconsiderar tradições e identidades locais, criou uma crise de representatividade. Ao focarem exclusivamente no progresso macroeconômico, negligenciam a importância dos valores culturais e comunitários, o que contribui para a alienação de grande parte da população.

Peggy Noonan, em seu famoso artigo sobre “protegidos e desprotegidos”, também traz uma perspectiva importante sobre como a elite, protegida por suas bolhas sociais e econômicas, não entende as preocupações dos “desprotegidos” — as pessoas comuns que enfrentam as realidades duras do desemprego, da insegurança e da mudança cultural. Essa divisão é o que alimenta a revolta contra a ordem estabelecida.

Um trabalho seminal e pouco citado é o de Charles Murray, em Coming Apart, que oferece uma visão importante sobre como a fragmentação da sociedade americana ao longo de linhas econômicas e culturais criou dois mundos: o das elites e o da classe trabalhadora. Murray aponta que essas elites vivem em uma bolha de meritocracia e globalização, enquanto a classe trabalhadora enfrenta uma realidade de declínio econômico e social, o que explica parte do apelo populista.

O artigo de Simon Kuper serve como um lembrete de como as elites progressistas continuam presas em um ciclo de negação. Ao desconsiderarem as verdadeiras motivações do eleitorado e o endimento de suas demandas, elas se afastam ainda mais da realidade política e social que se desenrola diante delas.

  • Este é um tema recorrente meu, como você pode ver nessa entrevista de 2017:
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