Bolsonarismo e esquerda aprovaram lei usada para condenar Léo Lins

20.06.2025

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O Antagonista

Bolsonarismo e esquerda aprovaram lei usada para condenar Léo Lins

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Felipe Moura Brasil
21 minutos de leitura 04.06.2025 15:37 comentários
Análise

Bolsonarismo e esquerda aprovaram lei usada para condenar Léo Lins

Só partido Novo votou contra as alterações na Lei 7.716 de 1989

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Felipe Moura Brasil
21 minutos de leitura 04.06.2025 15:37 comentários 6
Bolsonarismo e esquerda aprovaram lei usada para condenar Léo Lins
Foto: Reprodução

A atual redação de uma das leis usadas pela juíza Barbara de Lima Iseppi para condenar em 2025 o humorista Léo Lins a mais de 8 anos de prisão, por falas proferidas durante show de comédia stand-up realizado em 2022, foi aprovada no Congresso Nacional com manifestações favoráveis de esquerda, Centrão e bolsonarismo – embora parlamentares e ativistas ligados à família Bolsonaro estejam atribuindo, nas redes sociais, a responsabilidade exclusivamente a esquerdistas, ao criticarem a condenação.

Trata-se da Lei 7.716 de 1989 (Lei do Crime Racial), atualizada pela Lei 14.532 de 2023, oriunda do projeto de lei 1.749 de 2015, que, durante sua tramitação, virou o PL 4.566 de 2021. O referido projeto de lei é de autoria dos então deputados federais Tia Eron (Republicanos-BA, antes do PRB) e Bebeto (PSB-BA).

O relator do texto na Câmara dos Deputados foi o deputado federal Antonio Brito (PSD-BA). No Senado Federal, o relator foi o senador Paulo Paim (PT-RS).

Foram realizadas três etapas para a conclusão das alterações: (1) em 30 de novembro de 2021, a Câmara aprovou uma atualização da lei original de 1989 e encaminhou o texto para o Senado, que (2) acrescentou dispositivos e aprovou em 18 de maio de 2022 uma versão atualizada da mesma lei. (3) Em 7 de dezembro de 2022, a Câmara aprovou, sem mais alterações, essa nova versão do texto, conforme recebida do Senado.

Na primeira etapa, junto com PT, PSOL e o restante da esquerda, Eduardo Bolsonaro votou a favor do projeto de lei, assim como a maioria dos bolsonaristas. Na segunda, tampouco houve resistência do bolsonarismo aos acréscimos feitos, incluindo a questão do “racismo recreativo”. Na terceira, o então governo Bolsonaro e o PL orientaram voto ‘sim’, assim como os demais partidos – à exceção do Novo, que foi contra o projeto desde a primeira votação na Câmara.

Embora veículos e ativistas bolsonaristas tenham destacado nas redes que a redação final da lei foi sancionada pelo presidente Lula, isto só ocorreu porque a tramitação terminou no último mês de mandato de Jair Bolsonaro, que, igualmente, teria sancionado o texto, já que seu então governo e seu partido o endossaram.

Cada etapa segue detalhada abaixo, com os votos e discursos correspondentes, assim como trechos da decisão contra Léo Lins que citam dispositivos nelas aprovados.

Etapa 1 – Aprovação inicial na Câmara – 30/11/2021

O texto da Lei 7.716 já previa em seu artigo 1º:

“Serão punidos, na forma desta Lei, os crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional.”

O PL 1.749, em essência, propôs alterar essa lei para tipificar a conduta de injúria racial coletiva; e o parágrafo 2º do art. 145 do Código Penal, para que a ação penal fosse pública incondicionada – aquela em que o Ministério Público tem o dever de promover a acusação penal, independentemente da vontade da vítima ou de outro indivíduo.

O relator, no entanto, argumentou que “a ação penal pública incondicionada é a regra em nosso ordenamento jurídico, não sendo necessário incluir sua previsão no tipo penal”. Com isso, apenas a Lei 7.716 passaria a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 20-A. Injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro, em local público ou privado aberto ao público de uso coletivo, com a utilização de elementos referentes a raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional:

Pena – reclusão, de dois a cinco anos, e multa.”

Essa alteração foi aprovada no plenário da Câmara com 358 favoráveis, 17 contrários e 2 abstenções.

Eduardo Bolsonaro (na época no PSC-SP, hoje no PL) votou a favor, ao lado dos 39 deputados do PT e dos 7 do PSOL presentes, além de 25 do PSB, entre outros de esquerda. Os 33 deputados do PL que compareceram à sessão também votaram a favor, assim como a maioria dos bolsonaristas do PSL, como Bibo Nunes, Soraya Manato, Felipe Francischini, Filipe Barros, Luiz Lima, Marcelo Álvaro Antonio, e Vitor Hugo, entre outros. A lista está aqui.

Já Bia Kicis, Carlos Jordy, Caroline de Toni, Junio Amaral e Luiz Philippe de Orleans e Bragança, todos no PSL, votaram contra, além de Paulo Eduardo Martins (na época no PSC-PR, depois no PL), Alexandre Leite (DEM-SP), Roman (Patriota-PR), Diego Garcia (Podemos-PR) e Reinhold Stephanes Junior (PSD-PR).

Entre os partidos, somente o Novo orientou voto contrário à alteração, com 7 deputados federais na bancada: Adriana Ventura (SP), Alexis Fonteyne (SP), Gilson Marques (SC), Marcel van Hattem (RS), Paulo Ganime (RJ), Tiago Mitraud (MG) e Vinicius Poit (SP).

Na orientação feita em plenário, Gilson Marques (Novo-SC) alertou sobre penas desproporcionais que poderiam ser impostas em decorrência da nova lei:

“Presidente [Arthur Lira, na época], o partido Novo abomina, repudia qualquer forma de racismo. No entanto, nós vamos orientar ‘não’ nessa matéria por um motivo técnico. Primeiro, que nós entendemos que o crime contra a honra, que é a injúria, não pode ser coletivo. Ele é um direito subjetivo. Por isso, não tem como ser a vítima a coletividade. Segundo, também não tem como ser uma ação penal incondicionada. Terceiro, nós somos um crítico muito forte [de iniciativas contrárias ao nosso entendimento] de que o Código Penal não pode ser recortado e revisto de forma aleatória. Faz com que as penas sejam desproporcionais. (…) E, por fim, o artigo 140 do Código Penal, especialmente no seu parágrafo 3º, ele já menciona e já está abarcado o crime de injúria racial. Por esses motivos, o Novo vai orientar ‘não’.

As 2 abstenções foram de Rogério Peninha Mendonça (MDB-SC) e Gonzaga Patriota (PSB-PE)

No mesmo dia em que a alteração na lei de 1989 foi aprovada na Câmara, uma Comissão de Juristas destinada a avaliar e propor estratégias normativas com vistas ao aperfeiçoamento da legislação de combate ao racismo estrutural no país, instituída no âmbito desta Casa Legislativa e composta por eminentes juristas, apresentou o seu Relatório Final com diversas sugestões legislativas, como, meses depois, relatou Antonio Brito.

“Participaram dessa Comissão o Ministro Benedito Gonçalves, do Superior Tribunal de Justiça, Dr. João Benedito da Silva, Dra. Maria Ivatônia Barbosa dos Santos, Dr. Silvio Luiz de Almeida, Dr. Adilson Moreira, Dra. Ana Claudia Farranha Santana, Dr. André Costa, Dr. André Luiz Nicolitt, Dra. Chiara Ramos, Dr. Cleifson Dias Pereira, Dra. Dora Lúcia de Lima Bertulio, Dra. Elisiane Santos, Dr. Fábio Francisco Esteves, Dr. José Vicente, Dra. Karen Luise Vilanova Batista de Souza, Dra. Lívia Casseres, Dra. Lívia Santana e Sant’anna Vaz, Dra. Rita Cristina de Oliveira e Dra. Thula Rafaela de Oliveira Pires. Também contribuiu para os trabalhos dessa Comissão o professor Edvaldo Pereira de Brito.

E foi justamente nessas sugestões apresentadas que o Senado se baseou para propor o Substitutivo”.

Etapa 2 – Acréscimos e aprovação no Senado – 18 de maio de 2022

Uma das sugestões feitas pela Comissão de Juristas e incorporadas ao texto pelo Senado foi a do “racismo recreativo” como causa de aumento dos crimes de racismo.

Eles alegaram:

“Não escapou do trabalho a preocupação com uma forma de racismo que além de causar danos a saúde mental, humilhação e sofrimento, não raro é um subterfugio retórico para a impunidade relativamente a atitudes racistas.

O racismo recreativo consiste em um tipo específico de opressão racial. Trata-se da circulação de imagens derrogatórias que expressam desprezo por minorias raciais na forma de humor, de modo a comprometer o status cultural e o status material dos membros desses grupos.

Essa prática de marginalização tem o mesmo objetivo de outras formas de racismo, a saber: legitimar hierarquias raciais presentes na sociedade brasileira de modo que oportunidades sociais permaneçam nas mãos de pessoas brancas.

Essencialmente, o racismo recreativo não se diferencia de outros tipos de racismo, embora tenha uma característica especial: o uso do humor para expressar hostilidade racial, estratégia que permite a perpetuação do racismo, mas que protege a imagem social de pessoas brancas.

[…] Para dar resposta a essa violência psicológica que causa danos à saúde mental das pessoas negras, destacadamente a baixa autoestima de crianças e jovens, propõe-se o racismo recreativo como causa de aumento dos crimes de racismo.

Esse aumento da pena ficaria previsto no artigo 20-A, como se verá adiante. Com os demais acréscimos – incluindo emendas dos senadores Jorge Kajuru (Podemos/GO), Rose de Freitas (MDB/ES), Mara Gabrilli (PSDB/SP) e Randolfe Rodrigues (na época na Rede/AP, hoje no PT), além de um ajuste no artigo 20, parágrafo 2º-B, solicitado por Carlos Viana (PL-MG) –, o texto votado no Senado propôs, em resumo:

“Alterar a Lei 7.716 de 1989, e o Código Penal, para tipificar como crime de racismo a injúria racial, prever pena de suspensão de direito em caso de racismo praticado no contexto de atividade esportiva ou artística, prever pena para racismo religioso e recreativo e para o praticado por funcionário público.”

Para isso, a nova redação da Lei 7.716 de 1989 ficaria assim:

“Art. 2º-A. Injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro, em razão de raça, cor, etnia ou procedência nacional.

Pena – reclusão, de dois a cinco anos, e multa.

Parágrafo único. A pena é aumentada de metade se o crime é cometido mediante concurso de duas ou mais pessoas.”

“Art. 20. Praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional. (Redação dada em 1997)

Pena: reclusão de um a três anos e multa. (Redação dada em 1997)

§ 2º Se qualquer dos crimes previstos neste artigo for cometido através dos meios de comunicação social, publicação em redes sociais, rede mundial de computadores, ou publicação de qualquer natureza:

Pena: reclusão de dois a cinco anos e multa. (Redação dada em 1997)

§ 2º-A. Se qualquer dos crimes previstos neste artigo for cometido no contexto de atividades esportivas, religiosas, artísticas ou culturais, destinadas ao público:

Pena – reclusão, de dois a cinco anos, e proibição de frequência, por três anos, a locais destinados a práticas esportivas, artísticas, culturais, destinadas ao público, conforme o caso.

§ 2º-B. Sem prejuízo da pena correspondente à violência, incorre nas mesmas penas previstas no caput deste artigo quem obstar, impedir ou empregar violência contra quaisquer manifestações ou práticas religiosas de matriz africana. (…)”

“Art. 20-A. Os crimes previstos nesta Lei terão as penas aumentadas de um terço até a metade, quando ocorrerem em contexto ou com intuito de descontração, diversão ou recreação.”

“Art. 20-B. Os crimes previstos nos arts. 2º-A e 20 desta Lei terão as penas aumentadas de um terço até a metade, quando praticados por funcionário público, conforme definição prevista no Código Penal, no exercício de suas funções ou a pretexto de exercê-las. ”

“Art. 20-C. Na interpretação desta Lei, o juiz deve considerar como discriminatória qualquer atitude ou tratamento dado à pessoa ou a grupos minoritários que cause constrangimento, humilhação, vergonha, medo ou exposição indevida, e que usualmente não se dispensaria a outros grupos em razão da cor, etnia, religião ou procedência.”

“Art. 20-D. Em todos os atos processuais, cíveis e criminais, a vítima dos crimes de racismo deverá estar acompanhada de advogado ou defensor público.”

Já o parágrafo 3º do artigo 140 do Decreto-Lei nº 2.848 de 1940 (Código Penal) passaria a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 140. Injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro:

Pena – detenção, de um a seis meses, ou multa. (…)

§ 3º Se a injúria consiste na utilização de elementos referentes a religião ou à condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência:

Pena – reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa.”

Após a leitura do chamado substitutivo pelo relator, o senador Eduardo Girão (na época no Podemos-CE, hoje no Novo) deu “parabéns ao senador Paulo Paim por mais um golaço”. A senadora Rose de Freitas (MDB-ES) também parabenizou o petista pelo relatório, assim como Zenaide Maia (PROS-RN) e Nelsinho Trad (PSD-MS).

A sessão foi presidida pelo então senador Álvaro Dias (Podemos-PR), que então encerrou essa etapa.

“Encerrada a discussão, sem emendas, o substitutivo é dado como definitivamente adotado, sem votação. A matéria retorna à Câmara dos Deputados”, anunciou Álvaro Dias.

“A presidência, em nome de todo o Senado Federal, quer cumprimentar a autora do projeto, a deputada federal Tia Eron, e o eenador Paulo Paim, brilhante como sempre, especialmente em matérias dessa natureza, com um relatório impecável.

Realmente, é um gesto importante que pratica, nesta tarde, o Senado Federal.

Sem exageros, poderíamos considerar um gesto histórico, um avanço histórico, exatamente na contramão da insensibilidade humana, do desamor, da violência, do preconceito, da avacalhação da nacionalidade, que é o racismo.

O racismo repugnante, deplorável, que se repete em nosso país com uma insistência injustificável, deve ser combatido por todos os brasileiros de bem, especialmente por uma instituição essencial ao Estado de Direito como é o Senado Federal. E é isso o que fazemos nesta tarde-noite.

O Senado Federal repudia o racismo. Nós não podemos afirmar que vivemos numa nação civilizada enquanto suportarmos a tragédia do racismo em nosso país.

Meus cumprimentos, Senador Paulo Paim, meus cumprimentos a todos os senhores senadores e às senhoras senadoras que, indignados, repudiam o racismo reiterado nesta nação. Muito obrigado”, concluiu Dias.

Etapa 3 – Aprovação final na Câmara – 7/12/2022

Na Câmara, em sessão presidida por Gilberto Nascimento (na época no PSC-SP, hoje no PSD), o relator Antonio Brito (PSD-BA) leu e pediu aprovação do texto alterado no Senado, citando as alegações da Comissão de Juristas (conforme reproduzido acima, no fim da Etapa 1 e no início da 2), inclusive em relação ao “racismo recreativo”.

O governo Bolsonaro orientou voto a favor.

Assim como a comunista Jandira Feghali (PCdoB-RJ), os bolsonaristas Bibo Nunes (PL-RS) e Soraya Santos (PL-RJ) discursaram em defesa do texto.

Bibo Nunes declarou:

“Digníssimo presidente Gilberto Nascimento, novos colegas, uma honra estar neste ringue, onde eu luto pelo Brasil.

Esse projeto sou totalmente favorável, porque ele esclarece muito bem a injúria racial, principalmente em ambiente coletivo.

Muitas pessoas, quando se veem com centenas ao seu lado, se sentem encorajadas a atacar covardemente pessoas, independente de credo, etnia ou time de futebol. Então, tem que frear este tipo de injúria racial.

Mas também é bom salientar que tem muitos políticos, principalmente de esquerda, que tentam fazer demagogia e que forçam dizer que estão contra um ato racial.

Isso tem que sair do âmago, das entranhas, aquela sinceridade em saber tratar o seu irmão, independente de cor, mas isso está intrínseco no caráter.

Então não venham com teatro, com historinhas, que tem que ser ‘assim, assim’, quando isto deve ser totalmente natural no ser humano! Tratar o próximo pela sua atitude, pelo seu comportamento, pelo seu desempenho no trabalho, e jamais pela cor.

Agora, deixo bem claro também que não admito demagogos que querem se autointitular como defensor máximo, mor, do que é uma injúria racial ou racismo.

Quem tem esse sentimento tem com naturalidade. Trata todos com igualdade, sem ensaio, sem teatro, todos são iguais. Cor, religião, nada, nada interfere no tratamento ao próximo. Todos com naturalidade e com igualdade. E assim, teremos uma nação digna de todos.

Por isso, nobre presidente, sou totalmente favorável a esse projeto. Muito obrigado!”

A deputada Soraya Santos, também do PL, orientou o voto do partido de Jair Bolsonaro, exaltando, inclusive, o aumento da pena para casos de injúria coletiva:

“Presidente, o PL encaminha ‘sim’.

Queria destacar, deputado Antonio Brito, a importância desse projeto e a generosidade de Vossa Excelência, dando nome às pessoas que construíram o resultado dessa relatoria.

Destacar alguns pontos, presidente, são muito importantes, porque, no relatório do deputado Antonio Brito, ele trata de incondicionalidade quando tem a injúria racial. E ela aumenta o tipo penal, ela não cria um tipo penal, mas quando essa injúria é coletiva nos moldes que a gente tem visto, ela aumenta a pena pra dois a cinco anos, pra que [dessa] forma a gente possa punir efetivamente. A pena anterior era muito pequena.

Então, esse relatório traz algumas novidades que são muito importantes ao combate dessa injúria que ainda assola a sociedade brasileira.

Nós temos que entender, deputado Antonio Brito, que um dia nós não vamos precisar mais discutir essas matérias, que finalmente homens e mulheres de todas as cores, de todas as raças e de todas as religiões são definitivamente iguais perante a lei.

Parabéns pelo relatório. É mais uma ferramenta no combate à injúria racial que essa Casa promove. PL, portanto, seu presidente, encaminha ‘sim’.

O presidente da sessão, Gilberto Nascimento, buscou agilizar o processo:

“Eu gostaria de solicitar se podemos colocar ‘sim’ para todos, provavelmente o Novo dizendo, não, ok? Registre, portanto, o voto do Novo como ‘não’.”

Neste momento, o deputado federal Tiago Mitraud (Novo-MG) pediu a palavra para fazer o discurso de orientação do partido. Ele declarou que o Senado tornou o texto ainda mais grave e orientou o voto favorável à manutenção da versão inicialmente aprovada pela Câmara, embora também tivesse sido repudiada pelo Novo.

“O Novo reconhece aqui a gravidade ainda do racismo no Brasil e que devemos ter políticas públicas de enfrentamento a isso.

Agora, como um partido que defende veementemente a liberdade de expressão, nós acreditamos que não deveríamos ter crimes de opinião nesse país.

Nós, inclusive, já apresentamos um projeto de lei para que as questões, o que hoje são crimes de injúria e difamação, deixem de ser crimes e parem de ser tratados no Código Penal e sejam tratados na esfera cível.

Claro que todo cidadão tem responsabilidade naquilo que diz e deve ser penalizado, caso aquilo que ele diga ofenda ou prejudique um terceiro.

Agora, não acreditamos que isso deve estar na esfera penal, mas sim na esfera cível.

Por isso que já fomos contrários ao projeto quando passou pela Câmara na primeira vez, mas acreditamos que o Senado ainda tornou mais grave

Por isso, preferíamos manter o texto da Câmara, uma vez que achamos que o Senado agravou os pontos que são sensíveis pro Partido Novo.

Por isso, aqui nós votamos ‘não’ ao texto do Senado, ‘sim’ ao texto da Câmara.”

O presidente da sessão, então, procedeu à votação simbólica, sem qualquer protesto por parte do bolsonarismo, notadamente favorável ao texto definitivo.

“Em votação, a redação final. Aqueles que forem pela aprovação, permaneçam como se encontram. Portanto, está aprovada a matéria. A matéria vai à sanção”, anunciou Gilberto Nascimento, reforçando que “a redação final da matéria” é que iria à sanção presidencial, ou seja, para aprovação do presidente da República.

Como o governo Bolsonaro terminou apenas 24 dias depois, em 31 de dezembro de 2022 – sem contar que o então presidente viajou para a Flórida no dia 30 –, Lula ficou encarregado da sanção, publicada em 12 de janeiro de 2023 no Diário Oficial.

A Lei 14.532 de 2023 atualizou, portanto, a Lei 7.716 de 1989.

Como a juíza que condenou Léo Lins usou a lei?

A juíza Barbara de Lima Iseppi considerou que Léo Lins praticou e incitou preconceito contra minorias e vulneráveis, enquadrando o humorista na Lei 13.146/2015 (sobre discriminação de pessoa em razão de sua deficiência) e na referida Lei 7.716 de 1989.

Em relação às alterações nesta última, feitas pelo Congresso, ela escreveu:

“A propósito, a Lei n. 14.532/2023 introduziu duas hipóteses QUALIFICADORAS do crime previsto no artigo 20 da lei n. 7.716/89, ambas presentes no caso em tela, tais sejam: cometimento do crime a) por intermédio dos meios de comunicação social, de publicação em redes sociais, da rede mundial de computadores ou de publicação de qualquer natureza, assim como b) no contexto de atividades artísticas ou culturais destinadas ao público.

Com efeito, no caso em análise se configuram as duas qualificadoras, pois o vídeo do foi publicado na rede mundial de computadores (plataforma de streaming YouTube) e se deu no contexto de atividade artísticas ou cultural destinada ao público.”

A juíza também citou a questão do “racismo recreativo” para aumentar a pena:

“A sociedade chegou em um ponto de evolução de direitos em que não se pode admitir retrocessos como a prática de crimes sob pretexto de humor. As falas do réu em seu show, transcritas no tópico anterior, manifestam ideias preconceituosas e discriminatórias que não podem ser toleradas ou normalizadas sob o escudo de ‘humor’.

Pelo contrário. O fato de se tratar de falas proferidas em contexto de ‘descontração e diversão’ consistem em causa de aumento para o crime previsto pela lei n. 7.16/89, justamente porque o legislador, com a reforma trazida pela Lei n. 14.532/2023 quis punir o chamado ‘racismo recreativo’.

A leitura de parecer apresentado ao Senado Federal durante o processo legislativo da referida lei esclarece que o humor muitas vezes consiste em ‘subterfugio retórico para garantir impunidade relativamente a atitudes racistas’, quando na verdade pode ‘expressar hierarquias raciais presentes na sociedade brasileira de modo que oportunidades sociais permaneçam nas mãos de pessoas brancas’.

Assim, para criminalizar com maior gravidade discriminações travestidas de ‘humor’, o legislador assim justificou:

‘O racismo recreativo consiste em um tipo específico de opressão racial. Trata-se da circulação de imagens derrogatórias que expressam desprezo por minorias raciais na forma de humor, de modo a comprometer o status cultural e o status material dos membros desses grupos. Essencialmente, o racismo recreativo não se diferencia de outros tipos de racismo, embora tenha uma característica especial: o uso do humor para expressar hostilidade racial, estratégia que permite a perpetuação do racismo, mas que protege a imagem social de pessoas brancas. (…) Para dar resposta a essa violência psicológica que causa danos à saúde mental das pessoas negras, destacadamente a baixa autoestima de crianças e jovens, propõe-se o racismo recreativo como causa de aumento dos crimes de racismo’. Grifos nossos.

Nota-se, então que o contexto de humor, além de não excluir o crime, consiste em causa de aumento à prática da discriminação.”

O humorista Léo Lins, como noticiamos, foi condenado a uma pena de 8 anos, 3 meses e 9 dias de prisão, que “deverá ser cumprida inicialmente no regime fechado”; além do pagamento de R$ 303.600,00 a título de indenização por danos morais coletivos.

A maior parte da esquerda, nas redes, defendeu e até celebrou a decisão.

Mas, se o bolsonarismo é contra a condenação do humorista, ou a considera exagerada, por que a maioria de seus parlamentares compactuou no Congresso com a abertura de flancos para essa possibilidade? Estavam mais ocupados lacrando na internet?

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Felipe Moura Brasil

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Comentários (6)

Jorge Irineu Hosang

05.06.2025 08:57

Só votaram contra este projeto os Deputados do NOVO.


Fabio B

04.06.2025 19:24

LUIZA HELENA FERREIRA NEIVA, precisa? Foi a família bolsonaro inteira, acompanhada pelo PL em peso junto com o Centrão. Sim, e o Bolsonaro sancionou a Lei. Essa turma bolsonarista perseguia comediantes como o Leo Lins desde o início. Lembra também que tentaram censurar aquele filme do Danilo Gentili?


LUIZA HELENA FERREIRA NEIVA

04.06.2025 19:05

GENTE, COLOCA AQUI QUAIS DEPUTADOS VOTARAM NÃO NESSE PROJETO.


Fabio B

04.06.2025 17:21

De fato, é um escárnio ver os beócios bolsonaristas fingindo demência com a condenação do Léo Lins, quando os mesmos aprovaram, junto com as esquerdas, a lei de censura. Sim, o PL e os demais partidos do Centrão votaram a favor em todas as etapas, sem contestar nada. Agora posam de vítimas e culpam a esquerda, como se não partilhassem a culpa. Não acho que seja só hipocrisia, covardia ou oportunismo desses imbecis; também há muita burrice e vagabundagem com certeza.


Ernesto Herbert Levy

04.06.2025 16:24

Oito anos??


Ernesto Herbert Levy

04.06.2025 16:24

Tudo bem, mas


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