PT foge da frente
A chapa que ganhou a eleição presidencial em segundo turno não pode ser chamada de puro sangue, expressão que define uma legenda só, o Partido dos Trabalhadores. Seu titular, o ex-dirigente sindical Luiz Inácio Lula da Silva, é fundador, filiado e disputou a Presidência seis vezes, tendo perdido uma para Fernando Collor de Mello e duas para Fernando Henrique Cardoso. Agora venceu a terceira disputa, o que é singular no resto do mundo, mas não no presidencialismo de indulgência plena...
A chapa que ganhou a eleição presidencial em segundo turno não pode ser chamada de puro sangue, expressão que define uma legenda só, o Partido dos Trabalhadores. Seu titular, o ex dirigente sindical Luiz Inácio Lula da Silva, é fundador, filiado e disputou a Presidência seis vezes, tendo perdido uma para Fernando Collor de Mello e duas para Fernando Henrique Cardoso. Agora venceu a terceira disputa, o que é singular no resto do mundo, mas não no presidencialismo de indulgência plena adotado em emenda constitucional, primeiramente, para garantir a permanência do citado sociólogo, do próprio Lula e de sua candidata, Dilma Rousseff; tendo permitido disputar e ganhar mais uma contra Jair Bolsonaro, que derrotou seu preposto petista, Fernando Haddad, em 2018.
As quatro primeiras vitórias petistas foram compartilhadas com aliados como o empresário mineiro José Alencar, do Partido Republicano Brasileiro (PRB) duas vezes, e pelo político paulista Michel Temer, do Movimento Democrático Brasileiro (MDB), com Dilma. Desta vez, o principal líder do partido compôs a chapa com Geraldo Alckmin, o governador de São Paulo que mais governou o Estado, sempre eleito pelo Partido Social Democrata Brasileiro (PSDB) e agora filiado ao Partido Socialista Brasileiro. Desta vez, o presidente eleito nomeou seu vice para chefiar a transição do desgoverno Bolsonaro para sua gestão num gesto simpático, mas pelo menos até agora apenas simbólico. Até aí morreu Neves, como reza o famoso dito popular de Minas Gerais. Sob a estulta orientação de Aloísio Mercadante Oliva, filho e irmão de general, o candidato e o partido denunciaram o bem-sucedidíssimo Plano Real, que estabilizou a economia brasileira, de ‘estelionato eleitoral’; e abriram uma frente chamada desenvolvimentista contra a mais exitosa revolução social da História brasileira, apelidada por eles de ‘fiscalista’.
Depois da desastrada segunda gestão de Dilma, interrompida na metade pelo impeachment, que levou o vice emedebista ao cargo maior e condenou a política errática, então liderada pelo schollar Guido Mantega, à derrota para o aventureiro de extrema direita Jair Bolsonaro, em 2018, ficou patente a necessidade de mudança das diretrizes econômicas dos petistas. No entanto, o gostinho do mel do poder deixou claro que, como os Bourbons criticados por Richelieu na França, os= petistas ‘não esqueceram nada, não aprenderam nada’.Mesmo com dois membros da equipe de transição que participaram da estabilização da economia saída do desastre Collor e da reformulação imposta por Itamar, que o PT levou ao poder, mas expulsou Luíza Erundina por ter aceitado a secretaria de Administração em seu governo, Lula incluiu na mesma Guido Mantega. Ao contrário deste, Guilherme Mello e Nelson Barbosa, André Lara Rezende e Pérsio Arida contribuíram para a estabilização da moeda, assim como Edmar Bacha, Armínio Fraga e Pedro Malan, que se dirigiram ao presidente eleito depois de tomarem conhecimento de um desastrado pronunciamento dele em Cairo, Egito, onde participou com muito sucesso da abertura da COP-27.
“O teto de gastos”, que não foi obra do time do Plano Real, mas do governo de meio mandato de Temer, segundo eles, ao contrário do que sinalizou o ex-dirigente sindical, “não tira dinheiro da educação, da saúde, da cultura, para pagar juros a banqueiros gananciosos. Não é uma conspiração para desmontar a área social”. Como diria o sábio Nelson Rodrigues, que Lula e sua patota deveriam ler mais para conhecer melhor o Brasil real, diria a respeito da conclusão judiciosa do acadêmico, do ex-presidente do Banco Central e do ex-ministro da Fazenda. Talvez uma dose de remédio para ativar a memória pudesse ser útil no natural estado de euforia em que se encontra o dirigente máximo da esquerda vitoriosa. Em 2018, uma onda nacional contra a corrupção, crime do qual Lula e seus seguidores foram acusados em processos na Justiça, julgados por dezenas de magistrados e não exclusivamente por Sérgio Moro, como lembrou outra vítima da verrina petista, inspirou o maior erro coletivo de nossa pouco ajuizada republiqueta, ao eleger o capitão-terrorista Jair Bolsonaro.
Pode-se argumentar que, condenado e inabilitado a disputar votos pela lei da ficha limpa, o único documento legal proposto e inspirado pelo povão e não pelas elites congressista, executiva e judiciária, o chefe indiscutível do chamado socialismo no Brasil não pôde evitar a aventura fascistoide a que o País foi submetido. Muita gente, que sentiu na pele e no cérebro o engano de ter acreditado na força das instituições democráticas, levou a democracia brasileira a correr o risco de inspirar o golpismo aventureiro de generais de pijama no leito ou na maca, que ora ainda nos aflige. A resposta foi fundamental para que o ex-prisioneiro de Curitiba vencesse o terrorista das bombas nos quartéis e no aqueduto do Guandu por 60 a 58 milhões de votos, apesar do uso abusivo de compra do voto com verbas públicas de um surreal orçamento secreto. A diferença curta, mas suficiente, mostra que o País está dividido e é preciso contar com todas as forças disponíveis para fortalecer as instituições democráticas, única fórmula bem-sucedida para deter os delírios cruéis de aventura dos saudosos de Hitler e Mussolini. Os escolhidos foram Lula e Alckmin e eles precisam governar com a participação e o apoio de uma frente amplíssima, que conte com Simone Tebet, mas não com todo o MDB. O acesso dos democratas em geral e em particular da competência acadêmica demonstrada na prática pelo extermínio da inflação e, no mínimo, do afastamento da corrupção depende da força total representada pela união dos democratas reais.
*José Nêumanne Pinto é jornalista, escritor e poeta
Os comentários não representam a opinião do site; a responsabilidade pelo conteúdo postado é do autor da mensagem.
Comentários (0)