Arbitrariedade, falta de proporção e improvisação Arbitrariedade, falta de proporção e improvisação
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Arbitrariedade, falta de proporção e improvisação

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Mario Sabino
4 minutos de leitura 30.08.2022 16:13 comentários
Opinião

Arbitrariedade, falta de proporção e improvisação

O que era desconfiança agora é certeza: como noticiamos ontem, o ministro Alexandre de Moraes, do STF, acolheu o pedido da Polícia Federal para fazer busca e apreensão em diversos endereços, quebrar os sigilos e bloquear redes sociais e contas bancárias de oito empresários bolsonaristas, com base apenas nas mensagens privadas trocadas por eles num grupo de WhatsApp, que acabaram veiculadas pelo site Metrópoles. E o que tinham essas mensagens? Nada, absolutamente nada que não se diga em mesas de bares ou em churrascos: cretinices sobre preferir um golpe militar à eleição de Lula...

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Arbitrariedade, falta de proporção e improvisação
Reprodução/Luciano Hang/Twitter

O que era desconfiança agora é certeza: como noticiamos ontem, o ministro Alexandre de Moraes, do STF, acolheu o pedido da Polícia Federal para fazer busca e apreensão em diversos endereços, quebrar os sigilos e bloquear redes sociais e contas bancárias de oito empresários bolsonaristas, com base apenas nas mensagens privadas trocadas por eles num grupo de WhatsApp, que acabaram veiculadas pelo site Metrópoles. E o que tinham essas mensagens? Nada, absolutamente nada que não se diga em mesas de bares ou em churrascos: parvoíces sobre preferir um golpe de Estado à eleição de Lula.

A PF, contudo, viu mirabolâncias nas mensagens privadas. De acordo com os documentos sobre os quais não há mais sigilo, o doutor delegado justificou o seu pedido ao STF, por haver suspeita de “orquestração de pessoas socioeconomicamente ativas (empresários de ramos distintos) no sentido de praticar crimes, dentre eles os tipos previstos nos arts. 288 e 359-L do Código PenalConforme divulgado em fontes abertas, vários empresários estariam participando de um grupo no aplicativo de mensagens WhatsApp para arquitetar uma ruptura do Estado democrático de direito”. Quais indícios concretos de “orquestração” ele tinha, para pedir que medidas tão graves fossem tomadas contra os oitos empresários? Nenhum.

O juiz instrutor do gabinete de Alexandre de Moraes engrossou o caldo, estabelecendo elos entre os empresários bolsonaristas — elos que mostrariam a formação de uma organização criminosa para atentar contra a democracia. Tem até organogramas. Para tanto, ele usou uma série de informações provenientes de outras investigações que, até o momento, produziram somente fumaça. O grande perigo seria essa figura patética chamada Luciano Hang (foto). O juiz instrutor ainda justificou o pedido para a quebra do sigilo telemático dos empresários, alegando que ela poderia servir para estabelecer uma relação entre eles e Mauro Cesar Cid, o ajudante de ordens de Jair Bolsonaro que já está sendo investigado há cerca de um ano, por causa do vazamento da investigação de um ataque hacker ao sistema eleitoral, em 2018.

Apesar da falta de indícios capazes de respaldar as medidas drásticas, Alexandre de Moraes autorizou tudo o que lhe foi pedido: “Tais fatos, apesar de serem propalados por meio de aplicativos de mensagens, não podem ser desprezados pelo Estado. Como é sabido, mensagens de apoio a atos violentos, ruptura do Estado democrático de direito, ataques ou ameaças contra pessoas politicamente expostas têm um grande potencial de propagação entre os apoiadores mais radicais da ideologia dita conservadora, principalmente considerando o ingrediente do poder econômico e político que envolvem as pessoas integrantes do grupo”.

Ou seja, os oito empresários bolsonaristas foram considerados elementos suficientemente perigosos para serem atingidos por uma ação devastadora da PF, porque pensam como pensam e externaram o seu pensamento a amigos em mensagens privadas. Além de serem ricos e influentes e, assim, mais capazes de propagar mensagens antidemocráticas ameaçadoras, de acordo com o ministro, se bem entendi a redação. Está tipificado informalmente, portanto, além do “crime de pensamento”, o “crime de potencial”, mais uma extravagância neste Brasil cada vez mais distópico.

Na semana passada, os jornalões publicaram editoriais para criticar a decisão de Alexandre de Moraes. Morderam e assopraram, porque criticar com veemência o STF pode parecer coisa de bolsonarista. Compreensível. O importante é que, finalmente, a imprensa atentou para o caminho perigoso que os inquéritos sigilosos do tribunal estão tomando. O título do editorial do Estadão, que citou a censura imposta por Alexandre de Moraes à Crusoé e a O Antagonista, em 2019, é ilustrativo da preocupação: “Defesa da democracia deve respeitar a lei”.

No editorial, o Estadão lembra que o princípio da publicidade precisa nortear o STF: “Precisamente por ter sido – e continuar sendo – essencial na defesa do Estado Democrático de Direito, o STF deve ser o primeiro a zelar por sua autoridade. O caminho é a observância estrita da lei, motivando devidamente as decisões e restringindo ao máximo os casos de sigilo. A regra é a publicidade”.

Pressionado, Alexandre de Moraes deu publicidade às razões da sua decisão. A menos que haja algo de grave e ainda em segredo na conduta dos oitos empresários, o que a publicidade revelou até agora foi arbitrariedade, falta de proporção e improvisação investigativa.

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Mario Sabino é jornalista, escritor e sócio-fundador de O Antagonista. Escreve sobre política e cultura. Foi redator-chefe da revista Veja.

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