Entenda o papel de Ricardo Salles no esquema investigado pela PF
Ricardo Salles e os demais investigados na Operação Akuanduba são suspeitos dos crimes de corrupção ativa e passiva, contrabando e facilitação de contrabando, prevaricação, advocacia administrativa, crimes contra a administração ambiental, lavagem de dinheiro e organização criminosa. No relatório encaminhado ao Supremo, a Polícia Federal descreve o papel do ministro...
Ricardo Salles e os demais investigados na Operação Akuanduba são suspeitos dos crimes de corrupção ativa e passiva, contrabando e facilitação de contrabando, prevaricação, advocacia administrativa, crimes contra a administração ambiental, lavagem de dinheiro e organização criminosa.
No relatório encaminhado ao Supremo, a Polícia Federal descreve o papel do ministro do Meio Ambiente no esquema de facilitação de exportações ilícitas de madeira. Segundo os investigadores, ele teria acolhido pedido de empresas autuadas para decretar a caducidade de uma instrução normativa do Ibama.
Agindo pessoalmente, Salles orientou subordinados e, posteriormente, promoveu os servidores que seguiram suas ordens — exonerando os que foram contra. Como registramos, a PF também identificou movimentações financeiras atípicas envolvendo subordinados e o próprio escritório de advocacia do ministro.
A PF identificou um “modus operandi” de Salles, exposto pelo próprio na célebre reunião de 22 de abril de 2020.
Lembra a PF: “[…] É que são muito difíceis, e nesse aspecto eu acho que o Meio Ambiente é o mais difícil, de passar qualquer mudança infralegal em termos de infraestru… e… é… instrução normativa e portaria, porque tudo que a gente faz é pau no judiciário, no dia seguinte. Então pra isso precisa ter um esforço nosso aqui enquanto estamos nesse momento de tranquilidade no aspecto de cobertura de imprensa, porque só fala de COVID e ir passando a boiada e mudando todo o regramento e simplificando normas. […] Não precisamos de congresso. Porque coisa que precisa de congresso também, nesse, nesse fuzuê que está aí, nós não vamos conseguir apo… apos… é… aprovar. Agora tem um monte de coisa que é só, parecer, caneta, parecer, caneta. Sem parecer também não tem caneta, porque dar uma canetada sem parecer é cana. Então, o… o… o… isso aí vale muito a pena. A gente tem um espaço enorme para fazer”.
Segundo a PF, o modus operandi (‘parecer, caneta’) teria sido aplicado na questão das exportações ilícitas de produtos florestais.
“Na ausência de um parecer do corpo técnico especializado que objetivasse a eventual revogação da Instrução Normativa n. 15/2011, do IBAMA, o que se viu na prática foi a elaboração de um parecer por servidores de confiança, em total descompasso com a legalidade.”
No relatório, os investigadores registram a sequência de eventos que comprovaria a tese. Dizem que, após apreensões de produtos florestais exportados ilegalmente pelas empresas Ebata Produtos Florestais e Tradelink Madeiras para os EUA, a Confloresta (entidade que reúne 11 concessionárias florestais, dentre elas a RRX e a Patauá, responsáveis pela maior parte de cargas exportadas pela Tradelink) e a Aimex (entidade que congrega 23 empresas do ramo de exportação de madeiras, dentre elas a Tradelink e a Ebata) buscaram apoio junto ao superintendente do Ibama no Pará, Walter Mendes Magalhães, e do então diretor de Uso Sustentável da Biodiversidade e Florestas, Rafael Freire de Macedo.
Nomeados por Salles, os dois funcionários teriam emitido certidões e um ofício — sem qualquer valor legal ou administrativo — rejeitados pelas autoridades americanas.
Na sequência, a duas entidades empresariais protocolaram um pedido buscando a “caducidade” da Instrução Normativa do Ibama 15/2011, que previa autorização específica para exportação dos produtos e subprodutos florestais de origem nativa em geral, “considerando sua revogação tácita a partir da publicação da IN IBAMA 21/2014”.
“O pedido digitalizado apresentou carimbo de recebimento pela Presidência do Ibama e, embora no carimbo não constasse a data do recebimento, o referido pedido foi encaminhado pelo chefe de gabinete da Presidência do Ibama em 06/02/2020, às 13h53min.”
Diz a PF:
“Ao que tudo indica, no mesmo dia 06/02/2020, Ricardo de Aquino Salles, atual ministro do Meio Ambiente, teria se encontrado, no final da manhã, com representantes das referidas empresas (“Confloresta” e “Aimex”), com um diretor da “Tradelink Madeiras Ltda”, com o presidente do Ibama (Eduardo Fortunato Bim), com o diretor de Proteção Ambiental (Olivandi Alves Borges de Azevedo), além de parlamentares, para uma reunião sobre exportação de madeiras ativas do Estado do Pará.
Na sequência, houve oatendimento integral e quase que imediato da demanda formulada pelas duas entidades, contrariamente, inclusive ao parecer técnico elaborado por servidores do órgão, legalizando, inclusive com efeito retroativo, milhares de cargas expedidas ilegalmente entre os anos de 2019 e 2020. Na sequência da aprovação desse documento e revogação da norma, servidores que atuaram em prol das exportadoras foram beneficiados pelo ministro com nomeações para cargos mais altos, ao passo que servidores que se mantiveram firmes em suas posições técnicas, foram exonerados por ele.”
Além desses fatos, a PF anexou aos autos depoimento de Hugo Leonardo Mota Ferreira, servidor do Ibama lotado na Superintendência de Apuração de Infrações Ambientais, que reforçou as graves consequências da anulação da instrução normativa e os indícios de envolvimento de Salles.
“De acordo com o informado pela testemunha, desde janeiro de 2021, outro agente público investigado nos autos (Leopoldo Penteado Butkiewicz), por ser assessor especial do atual Ministro de Meio Ambiente, passou a atuar de forma direta no IBAMA. A testemunha disse que desde 2015 (período em que atua na área de infrações ambientais) nunca tinha visto um assessor direto do Ministro do Meio Ambiente atuar dessa forma e que, segundo se recorda, o referido agente público de confiança participaria dos grupos de Whatsapp do SIAM/GAB, tendo por diversas vezes dado ordens diretamente ao depoente e intercedido em favor de autuados.”
Conversas entre a testemunha e o assessor de Salles mostraram que ele, depois de acessar processos no sistema do Ibama, mandou “levantar o embargo” do caso envolvendo as empresas exportadoras. Butkiewicz também sugeriu a criação de email para juntada de ofícios, embora comunicações desse tipo tenham de ser feitas via sistema próprio.
Os comentários não representam a opinião do site; a responsabilidade pelo conteúdo postado é do autor da mensagem.
Comentários (0)