Dino, os portugueses e a arte de governar para o Twitter
A última performance de Flávio Dino demonstra que temos um governo do Twitter, não do Brasil. A ação de lacração é aquilo que se espera do tuiteiro médio, não de um ministro de Estado...
A última performance de Flávio Dino demonstra que temos um governo do Twitter, não do Brasil. A ação de lacração é aquilo que se espera do tuiteiro médio, não de um ministro de Estado. A inadequação não é o único problema. A ação também é contraproducente.
Existe um problema de xenofobia contra brasileiros reconhecido pelo próprio governo português. O país faz relatórios detalhados sobre preconceito racial anualmente e indica que, no caso dos brasileiros, os eventos denunciados aumentaram mais de 500% entre 2017 e 2022.
A população brasileira no país também tem aumentado, cresceu 36% apenas entre 2021 e 2022. Estima-se que, dos 10 milhões de habitantes de Portugal, entre 4% e 8% sejam brasileiros, entre imigrantes legais e ilegais.
O governo de Portugal não nega o problema da xenofobia. A posição é que são casos isolados que devem ser apurados e punidos, não se trata de um traço cultural nem de algo autorizado pelas autoridades.
Caso fosse um tuiteiro lacrador, Flávio Dino poderia dizer à vontade que xenofobia é uma característica do povo português. Seria preconceituoso? Seria. Falar a mesma coisa num evento oficial de governo, como ministro do Brasil, macula a imagem do país.
Outro ponto é a lacradinha dizendo que aceita os brasileiros de volta desde que devolva o ouro. Dá a impressão de que está afirmando que dignidade humana vale menos que dinheiro. Não é exatamente o que se espera de um ministro da Justiça.
Flávio Dino repete uma técnica muito usada para inflamar multidões na internet: fingir que o comportamento de uma única pessoa é representativo de todo um grupo.
O primeiro sucesso dessa técnica foi em 2010, num evento de elite chamado “Churrascão da Gente Diferenciada”, em frente ao Shopping Higienópolis.
Havia a intenção de colocar mais metrô no bairro, como se efetivou. Já era o bairro residencial que tinha mais metrô por habitante em São Paulo. Também já era o que tinha mais moradores proporcionalmente usando metrô. Os moradores estavam divididos quanto a uma nova estação.
Nessa discussão, foi feita uma entrevista com uma senhora que dizia rejeitar o metrô porque levaria ao bairro “gente diferenciada”, uma expressão preconceituosa. A elite paulistana metida a inclusiva organizou um churrascão em frente ao shopping para incomodar a tal senhora. Quem mais reclamou foram os trabalhadores do shopping e os garis.
Flávio Dino fala para o lacrador porque sabe que esse público não se importa com realidade. Os fatos reais andam bem duros para o ministro, que só tem aparecido para falar do caos na segurança.
A tão sonhada vaga no STF começa a ficar mais incerta à medida em que uma nomeação demora. Esse é o outro tema preferencial para colocar o nome do ministro na imprensa.
Agora ele ocupa as manchetes agradando aos tuiteiros. O que bomba no Twitter vira notícia. Por isso se governa apenas para esse público.
Verdade seja dita, Dino também trabalha, não vive só de lacração. Mas, entre os milhares de ministérios de Lula, dá para apostar que tem gente que só trabalha para o povo do Twitter.
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