A recente taxação das compras internacionais abaixo de cinquenta dólares revela a força do capitalismo de compadrio no Brasil. Enquanto muitos acreditam em um embate ideológico entre diferentes correntes políticas, na realidade, o que se vê é um constante conchavo com o poder econômico, independente das cores partidárias.
O foco da discussão não deveria ser a taxação em si, mas sim como fazer a indústria nacional melhorar, expandir e ser mais produtiva. Além disso, deveríamos estar discutindo a criação de um sistema tributário que ao menos não seja o caos que é o nosso. Precisamos de um sistema inteligível, onde seja possível saber exatamente o que se deve pagar de imposto em cada atividade, entender as vantagens e desvantagens.
Nosso sistema tributário é uma confusão de regras sobrepostas, que mudam constantemente. A introdução dessa nova particularidade para produtos importados por plataformas online apenas agrava o problema. A desculpa para a taxação é proteger a indústria nacional, mas será que a indústria nacional vai produzir os mesmos produtos que os consumidores estão importando? Claro que não. O resultado será que grandes conglomerados de varejo, com situações tributárias favoráveis, importarão os produtos e os venderão aqui, eliminando o benefício da compra direta pelo consumidor.
Não foram apenas o governo e Arthur Lira, presidente da Câmara, que quiseram o projeto. A Frente Parlamentar do Empreendedorismo também advogou por ele. Além disso, o líder do governo, José Guimarães, confessou no microfone que havia um acordo para uma votação simbólica. Quando o partido NOVO pediu votação nominal, Guimarães se desesperou e foi argumentar. Arthur Lira advertiu que coisa assim não se fala em público. O que isso quer dizer? O governo ganhou porque garantiu que nenhum deputado votando a favor precisaria dar o nome. A votação simbólica não mostra quem votou como.
Deveríamos estar discutindo como ter um sistema tributário mais razoável que impulsione a indústria nacional. Todos os países que deram um salto na qualidade de vida fizeram exatamente o contrário do que fazemos no Brasil. Produzimos com qualidade, especialmente alimentos e minérios, mas exportamos matéria-prima e compramos de volta os produtos manufaturados a preços elevados. Continuamos presos à lógica de subdesenvolvimento que aprendemos na escola.
Embora estejamos falando de impostos, que são números, a discussão é carregada de moralismo, emoção e polarização. De um lado, acusações de que os opositores são avaros e não querem que os pobres tenham acesso a produtos; do outro, um governo visto como um gafanhoto que devora tudo. Embora essas sensações sejam legítimas, esse debate polarizado não ajuda o Brasil a avançar. Somos um país que arrecada muito e devolve pouco, mas mal discutimos o impacto real disso na vida das famílias.
Quem tem um pouco de dinheiro sobrando já compromete com educação e saúde privadas. Imagine se esse dinheiro fosse uma poupança em vez de um gasto obrigatório. No Brasil, arrecadamos demais e assistimos ao deboche do luxo das castas do funcionalismo. Enquanto policiais, professores e enfermeiros pedem aumentos salariais, vemos uma elite do serviço público esbanjando e recebendo acima do teto constitucional, muitas vezes escondendo seus privilégios.
Muito do debate sobre a taxação das blusinhas é apenas distração. O falso moralismo de acusar quem compra quinquilharias de ser contra o Bolsa Família é uma tática para desviar a atenção do verdadeiro problema: o quanto se toma da sociedade e não se devolve em serviços, enquanto se mantêm privilégios a uma camada elitizada do funcionalismo público. Historicamente, sabemos que há um limite para essa prática. Lembremos da derrama na Inconfidência Mineira, onde o teto era vinte por cento. Qual é o teto agora? Se eu fosse político, não gostaria de pagar para ver. Dá mais trabalho, mas é mais seguro arrumar essa casa.