Sobre a Faria Lima que aposta em Bolsonaro em 2022
Ouvi que parte do mercado financeiro acredita que Jair Bolsonaro vencerá Lula em 2022, se a eleição ficar mesmo polarizada entre esses extremos. Apesar das atrocidades cometidas pelo atual presidente, esse pessoal da Faria Lima e adjacências mentais acha que ele será ajudado pela recuperação econômica no ano que vem, quando a pandemia será vaga lembrança. Há controvérsias...
Ouvi que parte do mercado financeiro acredita que Jair Bolsonaro vencerá Lula em 2022, se a eleição ficar mesmo polarizada entre esses extremos. Apesar das atrocidades cometidas pelo atual presidente, esse pessoal da Faria Lima e adjacências mentais acha que ele será ajudado pela recuperação econômica no ano que vem, quando a pandemia será vaga lembrança. Há controvérsias.
Em 2016, fui convidado para um café da manhã numa corretora que ficava localizada justamente na Faria Lima. Sei lá por que motivo, talvez pelo fato de O Antagonista ser uma novidade na época, eles queriam saber o que eu pensava sobre o iminente impeachment de Dilma Rousseff. Estavam na dúvida se a retirada da petista da presidência abriria a trilha para a recuperação econômica. Alguns achavam até mesmo que a situação, afinal de contas, não estava tão ruim assim, e que o impeachment não era boa opção. Respondi que não havia como ficar pior se a petista fosse apeada do poder. E acrescentei: “Vocês enxergam o mundo aqui do alto deste prédio de luxo e, quando saem, é sempre nos seus carros blindados. Vivem numa bolha. Aconselho que vocês deem uma volta no entorno da Faria Lima. Não precisa ir longe, não. O Brasil de verdade está logo aqui do lado, cheio de mendigos, camelôs e desempregados. Dilma Rousseff é um desastre e a Faria Lima não é a Quinta Avenida“.
Dilma Rousseff saiu, Michel Temer entrou, a coisa melhorou um pouco em vez de piorar e, com a chegada de Jair Bolsonaro ao poder, fatores endógenos, como o liberalismo de fachada, somaram-se a fatores exógenos, como os efeitos da pandemia, para que a economia brasileira continuasse a chafurdar no pântano.
Não sou economista, mas tenho tempo suficiente de Brasil de verdade para dizer que boa parte do pessoal da Faria Lima continua cego para o que ocorre fora da sua bolha. Se o país crescer 6% em 2022, como se aposta, ainda assim isso será insuficiente para compensar a contento os recuos e os crescimentos pífios dos anos anteriores. Em 2015 e 2016, o PIB diminuiu 3,5% e 3,3%, respectivamente. Em 2017 e 2018, aumentou 1,1%; em 2019, cresceu 1,4%. Já em 2020, o tombo foi de 4,1%.
O Brasil redemocratizado nunca foi muito bom nessa história de crescimento, quando comparado a outros países emergentes. A média do governo Lula foi de 4% ao ano; a do governo FHC, 2,4%. A eventual retomada da economia é bem-vinda, mas é improvável que faça muita diferença na percepção do povão. Feitas as contas, se o PIB crescer 3,5% em 2021 e 6% em 2022, isso representará um acréscimo de riqueza de 155 bilhões de dólares em relação a 2015. Ou seja, um aumento de renda per capita de pouco mais de 700 dólares em 7 anos. É menos do que medíocre. É ridículo.
Eu não estaria tão certo quanto esse pessoal da Faria Lima, portanto, que um crescimento como o projetado para 2021 e 2022 levará a que os brasileiros esqueçam as dificuldades dos últimos anos e a sociopatia de Jair Bolsonaro no trato da pandemia. Para não falar da volta da inflação anual que se aproxima perigosamente dos dois dígitos, sempre mais danosa para os pobres do que para os ricos, e que vai diminuir o poder de compra do salário de quem conseguiu arranjar emprego. A Faria Lima não sabe, mas as pessoas comem arroz, feijão e macarrão, não PIB. Se possível, feijoada. Aliás, nessa miragem da feijoada, o cozinheiro é Lula. Livre das condenações e acusações de corrupção e lavagem de dinheiro, ele está cada vez mais à vontade para voltar a vender ilusões — e também facilidades para a outra parte do mercado financeiro que já conversa com ele.
Com qualquer um dos dois na presidência da República, estamos destinados ao fracasso — ora retumbante, ora suspirante — como nação. A Faria Lima não é a Quinta Avenida.
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