Nas democracias existe um sistema de freios e contrapesos entre os Três Poderes, que não são estáticos. Quando um se agiganta, é contido pelos demais. E todos continuam independentes.
Neste momento, estamos diante de algo novo no embate entre Legislativo e Judiciário. Parece que realmente está sedimentada uma aliança do Poder Executivo com o STF e isso ocorre na esteira da novela da desoneração de setores da indústria.
A medida de benefício fiscal para 17 setores surgiu em 2011, aliviando os impostos sobre a folha de pagamento. O Congresso votou uma lei esticando a desoneração até 2027. O presidente Lula vetou. O Congresso derrubou o veto. O governo resolveu entrar na Justiça via Advocacia-Geral da União.
O argumento é que um projeto de lei do legislativo não pode prever aumento de receita nem renúncia fiscal sem explicar de onde virá o dinheiro. Rodrigo Pacheco argumenta que o projeto tem um relatório detalhado sobre isso.
Numa canetada só, em decisão monocrática, o ministro Cristiano Zanin deu a vitória ao presidente Lula. Não vou lembrar aqui que se trata do ex-advogado pessoal do presidente porque uma coisa não tem nada a ver com a outra. Agora, o plenário virtual do STF vai decidir até 6 de maio se vale ou não a desoneração.
Rodrigo Pacheco apareceu dando entrevista fora de seu estilo tradicional. Falou com palavras duras sobre a ação da AGU. Resolveu recorrer da decisão do ministro antes mesmo da votação final. A crise está aberta.
Pouco tempo atrás, o presidente do Senado investia contra o poder de decisões monocráticas para declarar que leis são inconstitucionais. Agora, a questão vai além do STF.
Talvez o Legislativo esteja escanteado enquanto o Poder Executivo passa a ver o Judiciário como aliado, agindo em conjunto para fazer valer as decisões de governo. É o que veremos ao final do julgamento.
Muita gente tem argumentado que Zanin acertou porque é preciso cortar benefícios fiscais. O STF pode vir a alegar que o governo não tem como absorver o impacto de abrir mão desses impostos, mais ou menos R$ 9,4 bilhões. É metade do valor que o governo teve de abrir mão com a anulação, pelo STF, das multas da Odebrecht e da J&F na operação Lava Jato. Alguém tem de pagar essa conta.