O Twitter do senhor embaixador russo
A França convocou o embaixador russo em Paris, Alexei Mechkov, para explicações sobre postagens na sua conta no Twitter, com caricaturas consideradas "inaceitáveis" pelo governo francês. Uma das caricaturas mostra europeus de joelhos, lambendo as nádegas do Tio Sam. O texto que acompanha a caricatura é "A solidariedade europeia assim como ela é". Outra apresenta a Europa como uma doente deitada numa mesa de operação, cheia de picadas aplicadas pelo Tio Sam, designado "Império das Mentiras", e uma figura com um chapéu com as cores e as estrelas da União Europeia, chamada "Doutor EuroReich". Ambos injetam na moribunda Europa seringas de "neonazismo", "russofobia", e "sanções"...
A França convocou o embaixador russo em Paris, Alexei Mechkov, para explicações sobre postagens na sua conta no Twitter, com caricaturas consideradas “inaceitáveis” pelo governo francês. Uma delas mostra europeus de joelhos, lambendo as nádegas do Tio Sam. O texto que acompanha a caricatura é “A solidariedade europeia assim como ela é”. Outra apresenta a Europa como uma doente deitada numa mesa de operação, cheia de picadas aplicadas pelo Tio Sam, com o crachá “Império das Mentiras”, e uma figura com um chapéu com as cores e as estrelas da União Europeia, com o crachá “Doutor EuroReich”. Ambos injetam na moribunda Europa seringas de “neonazismo”, “russofobia”, e “sanções”. Estão desenhadas, ainda, seringas de “Covid 19” (bem de acordo com o que pensam adeptos de teorias conspiratórias sobre a doença) e “Otan“. O texto da postagem é “A Europa em 2022”. Aí está a postagem com uma das caricaturas:
Os tuítes foram apagados depois que Alexei Mechkov, atendendo à convocação, esteve no Ministério das Relações Exteriores da França, hoje de manhã. De acordo com o comunicado divulgado pela embaixada russa, a questão do Twitter “foi abordada, entre outros pontos” e, da sua parte, Alexei Mechkov “chamou a atenção dos nossos colegas franceses para as provocações e os atos de vandalismo contra as representações diplomáticas russas na França”. As “provocações” e “atos de vandalismo” são protestos mais do que normais numa democracia.
Alexei Mechkov foi entrevistado no canal do notícias francês BFM há duas semanas. Mesmo confrontado com as imagens do bombardeio criminoso do hospital infantil em Mariupol, a cidade mártir, o embaixador negou a responsabilidade do exército russo. Os jornalistas que o entrevistavam ficaram espantados com tamanha desfaçatez, mas os homens de Vladimir Putin (foto), assim como o próprio, só macaqueiam o que faziam os seus camaradas da União Soviética. O cinismo soviético foi brilhantemente sintetizado numa frase de Alexander Soljenítsin, o escritor russo que, prêmio Nobel de Literatura de 1970, denunciou as barbaridades cometidas pelo regime comunista nos gulags. Alexander Soljenítsin ficou preso num gulag durante 8 anos, a partir de 1945, acusado de fazer propaganda antissoviética. A frase dele é a seguinte: “Nós sabemos que eles mentem, eles sabem também que eles mentem, eles sabem que nós sabemos que eles mentem, nós sabemos também que eles sabem que nós sabemos, e, no entanto, eles continuam a mentir”.
As caricaturas reproduzidas por Alexei Mechkov no Twitter são igualmente uma boa síntese, mas do putinismo, como pode ser chamado o pensamento (ou a falta dele) de Vladimir Putin. Não é uma ideologia, mas uma colcha de retalhos, com definiram os franceses Isabelle Mandraud e Julien Théron, no livro Putin, A Estratégia da Desordem, ao qual já fiz referência em outro artigo. No livro, eles citam a historiadora francesa François Thom: “Putin não inventou nada. Ele recuperou alguns elementos eslavófilos, alguns elementos provenientes da nova direita europeia e os transplantou para um substrato soviético. A base é o ódio do mundo ocidental liberal, sobretudo dos Estados Unidos. Como os dirigentes soviéticos, ele está pronto para reduzir os soviéticos à miséria, desde que ele realize as suas ambições em política externa”.
Os tuítes não poderiam ser mais didáticos dessa colcha de retalhos antiocidental que exclui ter apartamentos de luxo em Londres e Paris, contas bancárias na Inglaterra, na Suíça e nos Estados Unidos, iates majestosos no Mediterrâneo e casas magníficas na Côte d’Azur francesa e na Riviera italiana.
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