O desembargador do Velho Oeste
Sebastião Coelho da Silva lavou a alma de parte do Brasil nesta quarta-feira (13) ao fazer a defesa do primeiro réu julgado pelos atos de 8 de janeiro no Supremo Tribunal Federal (STF). Destemido, o desembargador aposentado...
Sebastião Coelho da Silva lavou a alma de parte do Brasil nesta quarta-feira (13) ao fazer a defesa do primeiro réu julgado pelos atos de 8 de janeiro no Supremo Tribunal Federal (STF). Destemido, o desembargador aposentado não apenas expôs os limites da denúncia do Ministério Público contra os acusados de depredar as sedes dos Três Poderes, como desabafou na frente dos ministros mais poderosos do Brasil, que classificou como “as pessoas mais odiadas do país”. A réplica do ministro Alexandre de Moraes, relator do caso, deixa claro por que Sebastião deveria ter receio de se manifestar assim publicamente.
O desembargador se tornou conhecido nacionalmente há cerca de um ano, quando anunciou sua aposentadoria durante sessão do Tribunal Regional Eleitoral do Distrito Federal (TRE-DF) em protesto contra… Alexandre de Moraes. “O seu discurso é um discurso que inflama, é um discurso que não agrega, e eu não quero participar disso”, disse na ocasião, ao criticar a posse de Moraes no comando do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Sebastião Coelho voltaria a ser notícia em novembro passado, ao discursar em frente ao Quartel-General do Exército, em Brasília, para dizer que “a solução será prender Alexandre de Moraes”. Daquela vez, ele ressalvou que não se deveria pedir o fechamento do STF, mas apenas “retirar aqueles que não estão honrando o compromisso que assumiram”.
Como pôde comprovar quem assistiu ao início do julgamento desta quarta, o desembargador aposentado não perdeu a valentia, tão fora de moda no trato com o STF após tantas punições nos últimos meses. Ele atribuiu a bravura à idade avançada, ao protestar contra a investigação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) de que se tornou alvo. Mas sua manifestação perante o STF não foi exatamente quixotesca.
Sebastião Coelho argumentou que o Supremo não deveria estar julgando réus sem foro privilegiado, pois, ao contrário de parlamentares eleitos, eles não se colocaram na posição de serem julgados por apenas uma instância, sem direito a recurso. Essa é, sim, uma questão discutível no julgamento de réus do 8 de janeiro.
O advogado disse ainda que seu cliente, o ex-funcionário da Sabesp Aécio Lúcio Costa Pereira, é acusado por crime multitudinário, como todos os outros suspeitos de depredar a Praça dos Três Poderes, mas, ao mesmo tempo, foi encaixado em um dos quatro núcleos distinguidos pelo Ministério Público, o de executores dos atentados materiais. “Se ele tinha uma missão específica, caberia ao Ministério Público dizer: a missão do Aécio foi essa”, argumentou, destacando ainda que seu cliente é tratado como estimulador dos distúrbios e estimulado ao mesmo tempo.
O desembargador aposentado também pôs em questão a alegação de que o que ocorreu no dia 8 de janeiro foi uma tentativa de golpe de Estado. “As armas que nós temos aqui, neste processo, são canivetes, bolinhas de gude, machado (…). Não tinha nenhum quartel de prontidão. Quem iria assumir o poder se houvesse um golpe de Estado?”, questionou, acrescentando que “ninguém discute que houve depredação de patrimônio público” e cobrando que a cada um seja dado o julgamento na medida de sua participação.
O advogado comparou o que ocorreu em Brasília no dia 8 de janeiro ao recente golpe de Estado no Níger, para dar a dimensão da distância de um evento para o outro, chamando a atenção também para a animação e descontração de seu cliente naquele dia, registradas em três vídeos, dois do próprio celular de Aécio. “Nenhum ânimo de violência.” O advogado destacou também que nenhum Poder chegou a ficar sem funcionar pelos distúrbios, classificou o julgamento como “político” e pediu que Moraes se declarasse suspeito de julgar a causa.
Em sua resposta ao advogado, Moraes disse que “às vezes, o terraplanismo e o negacionismo obscuro de algumas pessoas faz parecer que no dia 8 de janeiro tivemos um domingo no parque”. “É tão ridículo ouvir isso que a Ordem dos Advogados do Brasil não deveria permitir que isso [se] referisse. A Ordem dos Advogados do Brasil que é uma defensora intransigente da democracia”, completou o ministro, dando a entender que Sebastião Coelho não merece o registro de advogado.
O desembargador aposentado levou nesta quarta à última instância, literalmente, seu desafio ao ministro que construiu fama de xerife no Supremo, como costumava provocar Marco Aurélio Mello. O destemor de pistoleiro do Velho Oeste não pode anuviar, contudo, a crítica pública mais contundente feita até agora ao processo aberto contra os acusados pelo 8 de janeiro.
Os comentários não representam a opinião do site; a responsabilidade pelo conteúdo postado é do autor da mensagem.
Comentários (0)