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Eu, se fosse o dono da Uber, cairia fora do Brasil

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Redação O Antagonista
4 minutos de leitura 28.04.2021 12:45 comentários
Opinião

Eu, se fosse o dono da Uber, cairia fora do Brasil

A Justiça do Trabalho brasileira continua na sua tarefa de, digamos assim, desconstrução do Direito. Leio no JOTA que uma das turmas do TRT15, em Campinas, "reconheceu vínculo empregatício entre um motorista e a Uber, e não homologou o acordo que a empresa havia feito com o motorista um dia antes do julgamento. O tribunal, por unanimidade, entendeu que houve tentativa de fraude trabalhista por parte da empresa"...

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Eu, se fosse o dono da Uber, cairia fora do Brasil
Foto: Uber

A Justiça do Trabalho brasileira continua na sua tarefa de, digamos assim, desconstrução do Direito. Leio no JOTA que uma das turmas do TRT15, em Campinas, “reconheceu vínculo empregatício entre um motorista e a Uber, e não homologou o acordo que a empresa havia feito com o motorista um dia antes do julgamento. O tribunal, por unanimidade, entendeu que houve tentativa de fraude trabalhista por parte da empresa”.

Na primeira instância, o motorista queria o reconhecimento do vínculo, pagamento de verbas rescisórias e de dano moral. Ele perdeu. O seu advogado recorreu, mas as partes entraram em acordo. Qual era o caminho natural da Justiça? Homologar e mudar de assunto Afinal de contas, o motorista estava assistido por um advogado legalmente constituído, ambos os lados se acertaram e tudo foi feito nos conformes. Mas o sindicalismo de toga não pode permitir que cidadãos exerçam a sua própria liberdade e sigam os caminhos que escolheram. Juízes ativistas sabem o que é melhor para você e para seu advogado.

O desembargador relator, João Batista Martins César, achou que o valor do acordo, 35 mil reais, “não é razoável, considerando o valor de remuneração apontado (3 mil reais), o tempo de contrato de trabalho (aproximadamente um ano) e os direitos incidente à hipótese”. Como na primeira instância, a Uber não havia apresentado proposta de acordo, o desembargador “vislumbrou indícios de que a empresa se utilizou do acordo para impedir o julgamento”, segundo o JOTA.

Parece bastante razoável que uma empresa resolva recorrer a um acordo para impedir um julgamento. Esse é o propósito dos acordos, salvo engano. Especialmente quando o tribunal em questão é, sabidamente, composto em grande parte por juízes que querem salvar a humanidade dela própria e, por isso, acreditam que têm o dever de tutelar a vida de cidadãos maiores de idade e em pleno gozo das suas faculdades mentais. Juízes que são contra as modernas relações de trabalho, como as estabelecidas entre aplicativos e motoristas ou entregadores de comida. Salvar a humanidade dela própria requer impedir que as vontades individuais prevaleçam dentro da moldura constitucional.

O TRT15 nem esconde a sua intenção estratégica, que nada tem a ver com Direito, mas com política. Para os desembargadores que impediram o acordo, “a finalidade dessa estratégia de conciliação seletiva não é firmar acordos, mas impedir a formação de jurisprudência reconhecera de direitos trabalhistas aos motoristas, ‘manipulando e obstruindo a pluralidade dos entendimentos jurisdicionais sobre o tema’, o que seria um abuso do direito”, como resume o JOTA. Ou seja, o TRT15 quer evitar a formação natural de jurisprudência na base da pancada. Quem a sociedade pensa que ela é para cristalizar entendimentos próprios, fazer opções que lhes sejam mais condizentes, estabelecer novos pactos? (Outra pergunta: a OAB não vai defender os advogados acusados de participar de uma fraude?).

Na decisão, ao comentar o uso pela Uber de algoritmos, o desembargador relator afirma que “a empresa instrumentaliza o serviço durante todo o dia por meio de estímulo às jornadas extensas, com prêmios. O algoritmo procura melhorar a remuneração desses trabalhadores nos horários em que há maior necessidade dos usuários da plataforma. Passa-se da ficção do trabalhador-mercadoria para a ficção do trabalhador-livre”.  Acho que a última vez que li algo parecido com “passar da ficção do trabalhador-mercadoria para a ficção do trabalhador-livre” foi numa dessas cartilhas marxistas que nos dão para ler na universidade. Ninguém precisa ser bolsonarista — e eu não sou, como sabem os leitores deste site –, para horrorizar-se com o uso de jargão ideológico por magistrados nos seus votos. Veja só: a Uber comete a desfaçatez de premiar quem trabalha nos horários de pico, e os motoristas — perdão, Pai — não sabem o que fazem ao decidir livremente que vale a pena estender a sua jornada por causa disso. Um absurdo mesmo essa lei da oferta e da procura. O mundo funcionaria bem melhor sem ela. Basta fazer concurso e virar juiz, ora bolas.

Eu, se fosse dono da Uber, cairia fora do Brasil rapidamente. O desemprego não é problema da empresa. Nem da Justiça trabalhista.

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