Decisão de André Mendonça derruba censura a Léo Lins
André Mendonça foi hábil e mandou recados sonoros na decisão sobre liberdade de expressão que derruba a censura ao comediante Léo Lins. O assunto é...
André Mendonça foi hábil e mandou recados sonoros na decisão sobre liberdade de expressão que derruba a censura ao comediante Léo Lins. O assunto é um dos mais difíceis de discutir atualmente devido ao processo de idiotização que vivemos na sociedade do algoritmo.
Atualmente, adultos não conseguem entender a defesa de princípios. Sempre raciocinam avaliando quem, naquele momento imediato, vai se dar bem ou mal caso o princípio seja defendido. Já me disseram que nenhum adulto é tão idiota assim, que as pessoas fazem a confusão de propósito. Tenho minhas dúvidas.
Basta dizer o nome Léo Lins para que fervilhem as afirmações emotivas de gente moralista daquele nível de qualificar para personagem de Nelson Rodrigues. É uma gente autoritária e hipócrita para quem “liberdade de expressão” virou só uma conversinha.
Nesse contexto, é sempre conveniente para os canalhas reduzir a questão a gostar ou não das piadas. O ponto do caso é outro. Foram pedidas penas e medidas de censura que não estão previstas na legislação. Pior que isso, há uma farta jurisprudência do STF determinando que os juízes tratem esses casos de maneira completamente diferente da que foi feita.
O Ministério Público de São Paulo pediu e o TJ-SP concedeu medidas como:
- Léo Lins ser obrigado a retirar seus shows do YouTube e proibido de armazenar de forma eletrônica o próprio trabalho.
- Obrigação de se apresentar periodicamente à Justiça.
- Proibição de fazer novas piadas, quaisquer que sejam, com uma lista de dezenas de temas.
O ministro André Mendonça não decidiu apenas com base no que pensa e na análise da lei. Também citou decisões sobre liberdade de expressão e liberdade humorística de outros ministros, como Alexandre de Moraes, Gilmar Mendes, Carlos Ayres Britto e Celso de Mello.
Após os inquéritos das Fake News e, principalmente, após o 8 de janeiro, as decisões sobre liberdade de expressão estão confusas. O próprio STF admitiu ter tomado medidas excepcionais em situações excepcionalíssimas. A sentença deixa claro que isso foi absoluta exceção e algo da Suprema Corte, não virou regra.
Na aprovação do AI-5, Pedro Aleixo, que foi contrário, disse que o problema do recrudescimento nem era com os generais da ditadura, era com o guarda da esquina. Ele viraria um justiceiro.
Falo do fenômeno, não da minha avaliação moral sobre ditadura nem de uma virtual comparação, impossível de ser levada a sério, entre os dias de hoje e esse passado repugnante. Quem está na base da pirâmide tende a entender como “liberou geral” algumas decisões absolutamente pontuais e excepcionais de quem está no topo.
André Mendonça estipulou que a decisão em SP é censura prévia, viola a liberdade de expressão e também os princípios da razoabilidade e proporcionalidade.
Faço questão de transcrever algumas das decisões citadas:
“O direito fundamental à liberdade de expressão não se direciona somente a proteger as opiniões supostamente verdadeiras, admiráveis ou convencionais, mas também aquelas que são duvidosas, exageradas, condenáveis, satíricas, humorísticas, bem como as não compartilhadas pelas maiorias. Ressalte-se que, mesmo as declarações errôneas, estão sob a guarda dessa garantia constitucional”, ministro Alexandre de Moraes.
“Tenho assinalado, de outro lado, em diversas decisões que proferi no Supremo Tribunal Federal, que o exercício da jurisdição cautelar por magistrados e Tribunais não pode converter-se em prática judicial inibitória, muito menos censória, da liberdade constitucional de expressão e de comunicação, sob pena – como já salientei em oportunidades anteriores – de o poder geral de cautela atribuído ao Judiciário qualificar-se, perigosa e inconstitucionalmente, como o novo nome de uma inaceitável censura estatal em nosso País.”, ministro Celso de Mello.
“Importância da livre circulação de ideias em um Estado democrático. Proibição de divulgação de determinado conteúdo deve-se dar apenas em casos excepcionalíssimos, como na hipótese de configurar ocorrência de prática ilícita, de incitação à violência ou à discriminação, bem como de propagação de discurso de ódio. Distinção entre intolerância religiosa e crítica religiosa. Obra que não incita violência contra grupos religiosos, mas constitui mera crítica, realizada por meio de sátira, a elementos caros ao Cristianismo.”, ministro Gilmar Mendes.
A decisão falando da liberdade de expressão como inerente à democracia é importante principalmente no momento em que vivemos. A perseguição tribunalesca das redes sociais e justiceiros de teclado normaliza a falta de razoabilidade e humaniza o desejo perverso por censura prévia.
Vivemos uma sociedade que leva muito a sério o que os humoristas dizem mas, quando um político fala, era só brincadeirinha. Cidadãos têm o direito de ser idiotas e não podem ser impedidos de exercer. O que não devemos permitir é que o aparato de Estado siga pelo mesmo caminho.
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