De 209 milhões de idiotas ao investidor internacional De 209 milhões de idiotas ao investidor internacional
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De 209 milhões de idiotas ao investidor internacional

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6 minutos de leitura 10.03.2021 16:58 comentários
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De 209 milhões de idiotas ao investidor internacional

Prezado Investidor Internacional, O Brasil é um país que oferece muita solidez institucional e ótimas oportunidades, como elencaremos a seguir, na forma de itens, em obediência ao dinamismo que as relações comerciais hoje requerem: -- O nosso atual presidente da República, Jair Bolsonaro, nega a gravidade da pandemia que já matou quase 270 mil cidadãos e desconfia da segurança das vacinas aprovadas pelas principais agências de regulação sanitária dos Estados Unidos e Europa...

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De 209 milhões de idiotas ao investidor internacional
Foto: Tomaz Silva/Agência Brasil

Prezado Investidor Internacional,

O Brasil é um país que oferece muita solidez institucional e ótimas oportunidades, como elencaremos a seguir, na forma de itens, em obediência ao dinamismo que as relações comerciais hoje requerem:

— O nosso atual presidente da República, Jair Bolsonaro, nega a gravidade da pandemia que já matou mais de 270 mil de nossos cidadãos e desconfia da segurança das vacinas aprovadas pelas principais agências de regulação sanitária dos Estados Unidos e Europa. Tanto que não as encomendou quando deveria e, agora, o governo federal corre atrás das farmacêuticas que fabricam os imunizantes, tentando firmar contratos de última hora. O vírus da Covid-19 avança mais por aqui do que em qualquer outro país do mundo, mas ele continua a sabotar todas as medidas restritivas. Depois de recomendar cloroquina e outros remédios inúteis para combater a doença, enviou o seu chanceler a Israel, um prodígio da vacinação em massa, não para verificar in loco o sucesso israelense, mas em busca de um spray nasal testado em 30 pacientes, como se fosse a panaceia para o mal que praticamente paralisou o mundo. Ah, sim, ele mudou de ideia de hoje, parece… Com todas esses medidas, morrerão ainda mais brasileiros e a economia deverá demorar mais tempo para recuperar-se;

— O Supremo Tribunal Federal é a maior fonte de insegurança jurídica e política do país. Abre inquéritos sigilosos de ofício, nos quais os seus ministros ao mesmo tempo investigam, prendem e podem condenar, sem a participação do Ministério Público, teoricamente titular das ações penais. Recentemente, um ministro do Supremo anulou as condenações de um ex-presidente corrupto e lavador de dinheiro, Lula, responsável pelo mais escandaloso esquema de corrupção da história brasileira, com epicentro na Petrobras, empresa de capital misto, a maior do país. O ministro alegou que a competência para julgar o ex-presidente não era do juízo de primeira instância de uma vara criminal da cidade de Curitiba, que estava com os processos havia quatro anos e teve a sua competência reafirmada pelo próprio Supremo;

— Não contente com a anulação das condenações, a Turma do Supremo à qual pertence o ministro que anulou as condenações deve declarar suspeito o juiz que condenou o ex-presidente, com base em mensagens roubadas de procuradores por hackers estelionatários — o material, inclusive, não foi periciado. O seu principal acusador quer até obrigar o juiz a pagar as custas processuais do condenado. Sim, o juiz, e que não é  parte em qualquer ação contra o réu. Trata-se de outra inovação da nossa jurisprudência de ocasião. Como aceitar o produto do crime como prova formal seria ir longe demais mesmo para os largos padrões judiciários brasileiros, os ministros que já condenaram o juiz — na verdade, ex-juiz — usaram as mensagens informalmente, lendo-as durante a sessão transmitida pela televisão, para demonizar os procuradores e o magistrado que ousaram colocar o ex-presidente na cadeia, como se as mensagens mostrassem violação do devido processo legal, o que não é o caso. Não é improvável que o ex-juiz que prendeu o ladrão seja condenado criminalmente. A ideia ronda o Supremo, como forma de evitar que o moço, ainda muito popular, possa candidatar-se à presidência da República e, se eleito, tentar moralizar o país;

— O ex-presidente, agora ex-condenado, tornou-se elegível e já está em campanha para eleger-se para o Palácio do Planalto, adotando uma postura de “estadista”. No seu primeiro comício, disse que foi vítima da “maior mentira jurídica” de que se tem notícia em 500 anos, apesar de todas as provas existentes contra ele;

— O atual presidente, de direita, e o ex-presidente, de esquerda, já se demonstraram irresponsáveis do ponto de vista fiscal, adeptos do inchaço da máquina estatal e contra as privatizações. O primeiro interferiu há pouco na Petrobras, a pretexto de subsidiar o preço dos combustíveis com o dinheiro do pagador de impostos; o segundo não só fez o mesmo, por meio da presidente-poste que ele conseguiu eleger como sucessora, como também permitiu que houvesse roubos gigantescos na empresa, em troca de favores indevidos, de acordo com o procuradores que o investigaram e o juiz que o condenou — procuradores e juiz que, lembre-se, agora são alvo da principal corte do país. O presidente de direita e o ex-presidente de esquerda sentem muito orgulho do sucesso financeiro dos seus primogênitos — o do primeiro comprou uma mansão de 6 milhões de reais, valor idêntico ao do apartamento onde mora o filho do segundo;

— Boa parte da imprensa, que antes apoiava os procuradores e o juiz que condenaram o ex-presidente, rejubila-se com a anulação das condenações e a volta do ex-condenado ao palco político, como se ele fosse contraponto ao atual presidente. Algo semelhante ocorreu há quase 70 anos, quando esse mesmo tipo de imprensa aplaudiu um ex-ditador de direita que foi eleito como presidente de esquerda, viu-se enredado numa história de tentativa de assassinato e meteu uma bala no peito. O exemplo histórico é mostra de como as convicções nacionais sempre foram fortes;

— O nosso Congresso é fonte de permanente alegria para quem dele faz parte. Conta em boa parte com gente da pior qualidade, que rouba mas não faz, realiza votações noturnas para contrariar os interesses dos cidadãos e tem como segunda maior preocupação blindar-se das eventuais consequências da primeira, que é mesmo roubar;

— A nossa moeda, o real, foi uma das que mais que se desvalorizaram frente ao dólar nos últimos tempos, mas o ministro da Economia, ex-super, atual bobo, não vê problema nisso. A maior questão, segundo ele, é que as empregadas domésticas não poderão mais ir à Disney World. A taxa de juros mantém-se em taxas populistas que só ajudam a empurrar o real para a lata de lixo das moedas.

— A nossa solidez institucional proporciona que contemos com os recursos inexplorados de 50 milhões de miseráveis, quase 100 milhões de pessoas sem acesso à coleta de esgotos, índices de produtividade baixíssimos, estudantes que estão entre os piores do planeta, infraestrutura capenga, quase 50 mil assassinatos por ano e mais de 5 milhões de domicílios em favelas — o que intelectuais não acham ser problema, mas solução poética.

Esses são apenas alguns atrativos, apresentados de forma bastante genérica, do nosso grande país. Há muito mais a oferecer, mas o espaço aqui é parco. No entanto, esperamos ter convencido o senhor Investidor Internacional a pelo menos começar a prospectar oportunidades de negócios no Brasil.

Atenciosamente,

209 milhões de cidadãos tratados como idiotas

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