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Contra a “estratégia da desordem” de Putin

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Mario Sabino
4 minutos de leitura 07.03.2022 16:19 comentários
Opinião

Contra a “estratégia da desordem” de Putin

No mesmo dia em que Vladimir Putin reafirmou, por meio dos seus capachos que negociam o inegociável, que suas tropas só saem de território ucraniano, onde cometem toda sorte de barbaridades, se Kiev inventar uma cláusula constitucional teratológica que impeça o país de aderir à Otan e à União Europeia (foto), a presidência francesa do bloco anunciou que foi aberto o procedimento para analisar as candidaturas de Ucrânia, Geórgia e Moldávia a membros plenos da União Europeia. Todos os três países fizeram o pedido formal depois da invasão ora em curso...

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Contra a “estratégia da desordem” de Putin
Foto: Capri23auto/Pixabay

No mesmo dia em que Vladimir Putin reafirmou, por meio dos seus capachos que negociam o inegociável, que suas tropas só saem de território ucraniano, onde cometem toda sorte de barbaridades, se Kiev inventar uma cláusula constitucional teratológica que impeça o país de aderir à Otan e à União Europeia (foto), a presidência francesa do bloco anunciou que foi aberto o procedimento para analisar as candidaturas de Ucrânia, Geórgia e Moldávia a membros plenos da União Europeia. Todos os três países fizeram o pedido formal depois da invasão ora em curso.

O procedimento é longo. Para serem oficializadas, as candidaturas precisam passar pelo crivo da Comissão Europeia. Se ela aprovar a candidatura, a etapa de análise é demorada e, ao final, se todos os requisitos forem cumpridos, os 27 países do bloco têm de aprovar a entrada do novo integrante por unanimidade. De qualquer forma, a decisão de hoje mostra que a Europa está unida em torno da Ucrânia e dos demais países ameaçados por Moscou — e que a estratégia da desordem terá como resposta o restabelecimento da lei internacional no leste do continente.

O termo “estratégia da desordem” foi cunhado por Isabelle Mandraud e Julien Théron, autores de Poutine: la Stratégie du Désordre, lançado no ano passado. O livro é outra amostra, entre tantas, que a invasão da Ucrânia, sob o falso pretexto de dar um basta ao que seria o expansionismo da Otan e defender a minoria de língua russa dos “nazistas” de Kiev, estava mais do que prevista. Os autores resumem a estratégia da desordem da seguinte forma:

“Ele (Putin) se autoriza a enunciar inverdades com desenvoltura, mesmo que se contradiga, a fim de semear a confusão. A dissociação entre a verdade, considerada como acessória, e uma representação edulcorada, profundamente política, permite também de nivelar aparentemente realidades demasiado amargas. Ele acentua a desconfiança em relação aos jornalistas e veículos de informação, desacreditados em benefício de canais de propaganda que jogam com as tendências subversivas presentes no seio das sociedades. Ele reescreve a história em favor de um desenho nacionalista, em detrimento da pesquisa. Em todos esses campos, a fronteira entre verdadeiro e falso é apagada para reforçar a sua mensagem política, num contexto internacional já sensível às sirenes complotistas. Atrás dessa cortina de fumaça, a estratégia da desordem opera: ingerência política geral, refortalecimento da influência de populistas nas democracias, ataques aos direitos humanos e ao direito internacional humanitário, corrosão da influência ocidental, anexação e desestabilização de estados soberanos, acirramento de tensões internacionais, desregulação da guerra, instrumentalização do terrorismo e a paralisia das Nações Unidas. O novo expansionismo russo, apresentado como um avanço glorioso, exprime-se à sombra de relações internacionais conflituosas que desafiam os serviços de segurança. Nada parece poder detê-lo.”

É possível, contudo, impedir Vladimir Putin de continuar com a sua estratégia da desordem. Os limites do seu sistema já estão dados, de acordo com Mandraud e Théron, e ele só pode superá-los sendo extremista. A inação dos outros é que permite que Vladimir Putin ultrapasse fronteiras, e isso deixou de ser apenas em sentido figurado faz tempo, desde a invasão da Geórgia, em 2008. “A comunidade internacional peca frequentemente por falta de vontade política, de determinação estratégica, de utilização das mesmas ferramentas e de integração da segurança coletiva (…) Mas o limite mais complicado para Vladimir Putin ainda é a sua própria população. Mesmo depois de vinte anos sob o seu chicote, a sociedade russa não renunciou à democracia”, dizem os autores.

A união destemida das democracias em torno do restabelecimento da ordem internacional é a única saída. Com isso, dois recados serão mandados. O primeiro, a Vladimir Putin, de que não, ele não está livre para cometer atrocidades, seja na Ucrânia ou dentro do próprio país que julga ser o seu império pessoal. O segundo, aos russos que ainda têm medo do ditador, de que as nações do mundo livre estão ao lado deles. De que a servidão voluntária a mais esse tirano produzido pela Rússia pode ter fim. A abertura do procedimento de entrada de Ucrânia, Geórgia e Moldávia na União Europeia deve ser saudada como ato de força nesse sentido.

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Mario Sabino

Mario Sabino é jornalista, escritor e sócio-fundador de O Antagonista. Escreve sobre política e cultura. Foi redator-chefe da revista Veja.

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