A dissonância cognitiva de Lula e Janja sobre a polarização
O governo lançou ontem, dia 10, a campanha publicitária “O Brasil é um só povo”. Dois dias antes, Lula e Janja haviam feito afirmações contra o bolsonarismo, conclamando a...
O governo lançou ontem, dia 10, a campanha publicitária “O Brasil é um só povo”. Dois dias antes, Lula e Janja haviam feito afirmações contra o bolsonarismo, conclamando a uma reação. Pode parecer um simples descompasso, não é. Estamos diante de uma ferramenta poderosa na política atual, a dissonância cognitiva.
A campanha é contra a polarização política, apelando à unidade do povo brasileiro, que não deve ser dividido. Coincide com a história da Frente Ampla, muito presente na campanha de Lula. A ideia é que ele venceria para unir um Brasil dividido, ser o presidente de todos.
Lula jamais desceu do palanque. Em todas as oportunidades possíveis, fala contra o bolsonarismo. Seria possível a leitura de que tem um adversário político. Mas o teor das falas é outro, ofende aqueles que votaram em Jair Bolsonaro, seja porque gostam dele ou porque não queriam a volta do PT. Entre os luloafetivos mais aguerridos, até quem não fez campanha para Lula entra na dança.
No presente momento, temos uma campanha cuja ideia é unir o país. Janja, a primeira-dama, defendeu que não usemos mais o termo bolsonarismo. Ele deve ser substituído por fascismo. “A gente precisa começar a chamar as pessoas de fascista, porque é isso que elas são. É o fascismo que mata, que nos anula, que quer nos anular”, declarou.
Faz muito tempo que os petistas chamam de fascista até barraquinha de cachorro quente. O próprio vice, Geraldo Alckmin, era considerado fascista. Houve militante proeminente que chamou Marina Silva de mãe do fascismo brasileiro.
A primeira-dama conclamou a piorar um clima que já é absurdamente polarizado e insuportável para muita gente. Lula complementou, dizendo que a militância deve se opor ao bolsonarismo. A lógica de Lula e Janja é latir de volta se eles latirem, nas palavras do próprio presidente.
Dissonância cognitiva ocorre quando temos um discurso alinhado a um conjunto de princípios mas a experiência prática é diferente. No caso, o discurso é de união e de um único Brasil. Na prática, os mesmos líderes que dizem isso pregam diariamente a polarização.
É algo que acontece em grandes e pequenos princípios. No ataque contra a jornalista Andreza Matais ocorreu algo parecido. Lideranças petistas diziam ser contra ataques pessoais mas postavam o perfil da jornalista que chefiou reportagens contra o governo. Ao mesmo tempo a liderança diz ser contra ataques pessoais mas cria a tempestade perfeita para que eles aconteçam.
Quando uma pessoa está diante da dissonância cognitiva pode se impor e dizer que respeita seus princípios. A minoria fará isso. A maioria vai simplesmente se calar para não criar problemas. Haverá também um grupo que vai justificar o comportamento como exceção, dando a desculpa moral para a traição dos princípios.
É um mecanismo muito efetivo para distorção dos princípios. Por meio dele chegamos à situação em que pessoas defendem uma coisa e agem no sentido contrário com a maior naturalidade. Na era da hipercomunicação, em que estamos nas redes o tempo todo e nos sentimos forçados a opinar sobre tudo, funciona melhor e mais rápido.
Lula precisa do bolsonarismo vivo e da polarização acirrada para ser competitivo nas próximas eleições. Está agindo assim desde o princípio. Muitos têm apontado a dissonância cognitiva, mas ela prossegue.
A campanha para unir o Brasil seria boa caso não houvesse a dissonância cognitiva. Com ela presente, a campanha em si serve à polarização. Ela passa a ser a desculpa para trair esses princípios e agir diferente. Na lógica de grupos, isso passa a ser correto. Não existe mais o apelo à união porque ele se dissolve, vira palavras que nada significam.
O país está dividido e o debate político se torna cada vez mais superficial e violento. Resta saber se a maioria, que rejeita a polarização mas se mantém calada, vai se render a essa lógica ou reagir.
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