Quem manda nos Estados Unidos é a democracia
Ao contrário de outros jornalistas que respeito, estou maravilhado com a disputa vírgula a vírgula entre Donald Trump e Joe Biden e acho surpreendente que alguém ache que o Brasil tenha algo a ensinar eleitoralmente aos Estados Unidos, o país que criou a república moderna. O mundo está assistindo a um espetáculo que mostra que, ao contrário do que carpideiras acadêmicas anunciavam, a democracia está viva e permanece vibrante entre os americanos...
Ao contrário de outros jornalistas que respeito, estou maravilhado com a disputa vírgula a vírgula entre Donald Trump e Joe Biden e acho surpreendente que alguém ache que o Brasil tenha algo a ensinar eleitoralmente aos Estados Unidos, o país que criou a república moderna. O mundo está assistindo a um espetáculo que mostra que, ao contrário do que carpideiras acadêmicas anunciavam, a democracia está viva e permanece vibrante entre os americanos.
Ganhe Trump ou Biden, a participação dos eleitores foi recorde e muito mais jovens decidiram participar da escolha do presidente da República. Fiscais de apuração e advogados de ambos os partidos atuam ferozmente, numa disputa que não foi liofilizada pela tecnologia. Se a disputa for parar no tapetão, a Suprema Corte ou o Congresso do país decidirão conforme a lei, sem jurisprudência de ocasião. Se houver conflitos de rua, a lei e a ordem serão garantidas pelas forças de segurança e eventuais excessos serão filmados e punidos, como deve ser. Contas feitas, contestadas e julgadas, os Estados Unidos terão um presidente da República legítimo em janeiro e ponto final — eleito pelo federalismo que se sobrepõe à maioria absoluta e é a alma inerente ao sistema americano.
Não vejo a polarização política, expressa agora pela luta eleitoral renhida, como problema fundamental. Nem o fato de ela continuar pelos próximos anos. A estridência cansa, mas uma espada de Dâmocles pendurada pela metade dos eleitores do país sobre a cadeira presidencial é a melhor forma de fiscalização que pode haver.
Os institutos de pesquisa não influenciaram a grande massa de eleitores, mas inexiste o risco de aprenderem algo com os seus erros. E também não importa: os americanos, na esmagadora maioria, aprendem desde cedo a formar as suas próprias opiniões, valorizam resultados concretos e relativizam o trololó ideológico, mesmo quando têm lado. Votam com o bolso, principalmente. Não fosse a crise econômica causada pela pandemia, Trump teria vencido Biden com folga. Não fosse a atuação desastrada de Trump na crise sanitária, que expôs ainda mais a falta de um sistema de saúde universal, o calcanhar de Aquiles da sua administração, ele poderia vencer Biden com uma margem relativamente folgada. Quem está enfrentando o republicano não é o democrata. É o vírus, é o próprio Trump.
A democracia não estará “salva” se Biden vencer, só a temperatura diminuirá. A democracia não estará “ameaçada” se Trump levar um segundo mandato, o histrionismo apenas continuará. A democracia produziu ambos os candidatos e os danos ou ganhos que Biden ou Trump proporcionarem devem ser reparados e valorizados, respectivamente, na próxima eleição. Senão, paciência: haverá sempre outra e outra. Com erros e acertos, quem manda nos Estados Unidos é a democracia, e isso não mudará porque o país não saberia existir de outra forma.
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