O país das embaixadinhas e a diplomacia freestyle O país das embaixadinhas e a diplomacia freestyle
O Antagonista

O país das embaixadinhas e a diplomacia freestyle

avatar
Alexandre Borges
5 minutos de leitura 27.11.2023 14:14 comentários
Mundo

O país das embaixadinhas e a diplomacia freestyle

Como se não bastassem os palpites de Lula sobre o conflito Israel x Hamas, que colocaram o Brasil na vergonhosa posição de adversário da única democracia do Oriente Médio, agora é o próprio corpo técnico do...

avatar
Alexandre Borges
5 minutos de leitura 27.11.2023 14:14 comentários 0
O país das embaixadinhas e a diplomacia freestyle
Foto: Geraldo Magela/Agência Senado

Como se não bastassem os palpites de Lula sobre o conflito Israel x Hamas, que colocaram o Brasil na vergonhosa posição de adversário da única democracia do Oriente Médio, agora é o próprio corpo técnico do Itamaraty que vem contribuir para o repertório de declarações injustificáveis do país em relação aos problemas na Faixa de Gaza.

O carioca Frederico Salomão Duque Estrada Meyer, 70 anos, foi aprovado no Senado como embaixador do Brasil em Israel em maio deste ano. Diplomata experiente, iniciou a carreira em 1978 e foi embaixador do Brasil no Cazaquistão e no Marrocos. Atuou como cônsul-geral do Brasil em Cantão, na China, e foi porta-voz do Itamaraty de 2015 a 2016. Além disso, serviu em Bagdá, Moscou, Genebra, Georgetown, Havana e Nova York (ONU) em diferentes períodos da carreira.

Mesmo com tanta quilometragem, Meyer disse em entrevista ao portal UOL na sexta-feira, 24, que não entende por que o grupo terrorista Hamas começou a libertar reféns. Disse o embaixador:

“Opinião puramente pessoal: eu ainda não entendi a posição do Hamas. Porque esses reféns que estão lá são uma moeda de troca. Não consigo perceber qual é o interesse do Hamas em libertar esses sequestrados. Porque depois que esses sequestrados forem entregues, qual vai ser a moeda de troca?”

“De novo, falando puramente pessoal: isso vai liberar Israel a ter uma ação ainda mais forte em Gaza. Porque uma das coisas que está contendo as ações de Israel é o medo de você atingir os reféns. Uma vez que você não tem mais reféns, Israel estaria liberado para atacar o quanto quisesse? Não sei.”

As declarações causam espanto, porque passam a impressão de legitimação moral dos sequestros – o que rendeu uma enxurrada de críticas nas redes sociais – e porque a atitude do Hamas, mesmo sendo impossível de se justificar, é muito fácil de entender:

  1. O Hamas nunca disse que soltaria todos os reféns, portanto o grupo continuará evidentemente com “moeda de troca”. Historicamente, sabe-se que Israel nunca sairia da mesa de negociação, mesmo que só houvesse um único refém.
  2. Os terroristas priorizaram a soltura de mulheres, idosos e crianças, cujo sequestro causou sérios danos de imagem ao grupo na comunidade internacional. Esse grupo também demanda cuidados muito mais complexos no cativeiro. Nenhum homem adulto foi solto.
  3. O Hamas usou civis sequestrados, o que é contra a Convenção de Genebra e totalmente proibido em conflitos militares, em troca de palestinos presos em Israel, a maioria envolvida em crimes violentos — muitos deles em terrorismo. Aos olhos do grupo, este sempre foi o objetivo das trocas.
  4. A intenção do ataque de 7 de outubro, contra um inimigo militarmente muito superior, nunca foi vencer um confronto armado direto, mas causar uma reação violenta do país atacado que levasse a mortes de palestinos civis em Gaza, inflamando a opinião pública árabe e muçulmana contra Israel.
  5. Depois dos históricos Acordos de Abraão, em 2020, o Hamas e seu principal patrocinador, o Irã, temiam que Israel estivesse costurando uma paz com seus principais vizinhos, para, no limite, ter seu território reconhecido. Para os radicais islâmicos, Israel precisa ser erradicado do mapa e um território árabe-muçulmano instituído “do rio ao mar”, como diz o bordão repetido nas passeatas mundo à fora.

Meyer poderia, ao menos, ter lido as declarações do próprio líderes do Hamas, Yahya Sinwar, em outubro:

“Estamos prontos para concluir imediatamente uma troca para libertar todos os prisioneiros nas prisões do inimigo sionista em troca de todos os reféns nas mãos da resistência.”

Numa entrevista dada à Deutsche Welle, empresa pública de comunicação alemã equivalente à BBC para os britânicos, nesta segunda, 27, Meyer respondeu sobre a posição brasileira oficial a respeito do conflito com platitudes de candidata à Miss Universo:

“Nós somos contra. Somos a favor da paz, é nossa posição. Somos a favor da negociação. Somos a favor do cessar-fogo. A favor dos dois Estados. Essa é a nossa posição. Nunca mudamos de posição.”

Como Israel é evidentemente contra o conflito e está reagindo contra um ataque terrorista que matou mais de 1.200 inocentes — e historicamente ofereceu diversas vezes o reconhecimento de um estado palestino em troca do reconhecimento de Israel pela comunidade árabe —, em tese a posição do Brasil seria exatamente a mesma do país de Benjamin Netanyahu, mas as semelhanças terminam nesse ponto.

Os governos petistas sempre tiveram uma posição hostil a Israel, alinhada com a extrema-esquerda internacional, e desta vez não foi diferente. Em 2014, em outro conflito envolvendo Israel e Hamas, o governo petista de Dilma Rousseff chamou o diplomata brasileiro em Tel Aviv para esclarecimentos — uma atitude de desagravo de um país em relação a outro. Como reação, o porta-voz do ministério das Relações Exteriores de Israel da época, Yigal Palmor, chamou o Brasil de “anão diplomático” numa entrevista ao The Jerusalem Post.

Até o fim de novembro, foram confirmadas as mortes de três brasileiros pelos terroristas do Hamas nos ataques de 7 de outubro: Ranani Glazer, 23 anos, Karla Stelzer, 42, e Bruna Veleanu, 24. O Brasil foi diretamente afetado pelo terrorismo do Hamas, brasileiros inocentes foram brutalmente assassinados num festival de música, mas a falta de empatia com as vítimas e suas famílias é evidente.

O Brasil tem centenas de embaixadores, mas, em situações críticas como essa do Oriente Médio, provamos que não conseguimos fazer nada mais do que embaixadinhas retóricas na tentativa de, a partir de uma diplomacia freestyle, marcar mais um gol contra a inserção do país na comunidade internacional.

  • Mais lidas
  • Mais comentadas
  • Últimas notícias
1

Kalil é médico ou assessor de imprensa de Lula?

Visualizar notícia
2

Crusoé: Secom confirma encontro entre Lula e empresário Jorge Seripieri Filho

Visualizar notícia
3

Crusoé: Toffoli remói fake news contra Transparência Internacional

Visualizar notícia
4

Governo Lula não faz lição de casa e culpa BC

Visualizar notícia
5

Governo tenta reinserir armas no “imposto do pecado” e sofre derrota

Visualizar notícia
6

Crusoé: Israel alcança superioridade aérea na Síria

Visualizar notícia
7

Alta de juros é atestado de burrice de Lula

Visualizar notícia
8

Um contexto para a ata do Copom de Gleisi

Visualizar notícia
9

A direita que a esquerda gosta está babando para derrubar Caiado

Visualizar notícia
10

Zanin diverge de Moraes sobre pena a Roberto Jefferson

Visualizar notícia
1

‘Queimadas do amor’: Toffoli é internado com inflamação no pulmão

Visualizar notícia
2

Sim, Dino assumiu a presidência

Visualizar notícia
3

O pedido de desculpas de Pablo Marçal a Tabata Amaral

Visualizar notícia
4

"Só falta ocuparem nossos gabinetes", diz senador sobre ministros do Supremo

Visualizar notícia
5

Explosões em dispositivos eletrônicos ferem mais de 2.500 no Líbano

Visualizar notícia
6

Datena a Marçal: “Eu não bato em covarde duas vezes”; haja testosterona

Visualizar notícia
7

Governo prepara anúncio de medidas para conter queimadas

Visualizar notícia
8

Crusoé: Missão da ONU conclui que Maduro adotou repressão "sem precedentes"

Visualizar notícia
9

Cadeirada de Datena representa ápice da baixaria nos debates em São Paulo

Visualizar notícia
10

Deputado apresenta PL Pablo Marçal, para conter agressões em debates

Visualizar notícia
1

Renúncia de Wray expõe crise de confiança no FBI

Visualizar notícia
2

Feriados prolongados em 2025: Confira já e se organize para aproveitar

Visualizar notícia
3

Sexta-feira, 13: superstições, mitologia e cultura popular

Visualizar notícia
4

Saque-Aniversário do FGTS 13/12: Como calcular o valor disponível e seus benefícios

Visualizar notícia
5

A direita que a esquerda gosta está babando para derrubar Caiado

Visualizar notícia
6

Crusoé: "Um dia o Irã será livre", diz Netanyahu ao povo iraniano

Visualizar notícia
7

Governo Lula não faz lição de casa e culpa BC

Visualizar notícia
8

A “aberração” de Fux

Visualizar notícia
9

Dino reclama de piti dando piti

Visualizar notícia
10

Zanin diverge de Moraes sobre pena a Roberto Jefferson

Visualizar notícia

Assine nossa newsletter

Inscreva-se e receba o conteúdo do O Antagonista em primeira mão!

Tags relacionadas

diplomacia Faixa de Gaza Frederico Meyer Hamas Israel
< Notícia Anterior

Lula oficializa indicações de Dino para o STF e Gonet para PGR

27.11.2023 00:00 4 minutos de leitura
Próxima notícia >

Janones tenta se explicar sobre rachadinha (e não consegue)

27.11.2023 00:00 4 minutos de leitura
avatar

Alexandre Borges

Analista Político em O Antagonista

Suas redes

Instagram

Os comentários não representam a opinião do site; a responsabilidade pelo conteúdo postado é do autor da mensagem.

Comentários (0)

Torne-se um assinante para comentar

Notícias relacionadas

Renúncia de Wray expõe crise de confiança no FBI

Renúncia de Wray expõe crise de confiança no FBI

Alexandre Borges Visualizar notícia
Crusoé: "Um dia o Irã será livre", diz Netanyahu ao povo iraniano

Crusoé: "Um dia o Irã será livre", diz Netanyahu ao povo iraniano

Visualizar notícia
Crusoé: Israel alcança superioridade aérea na Síria

Crusoé: Israel alcança superioridade aérea na Síria

Visualizar notícia
Crusoé: As promessas do HTS aos sírios

Crusoé: As promessas do HTS aos sírios

Visualizar notícia
Icone casa

Seja nosso assinante

E tenha acesso exclusivo aos nossos conteúdos

Apoie o jornalismo independente. Assine O Antagonista e a Revista Crusoé.