O país das embaixadinhas e a diplomacia freestyle
Como se não bastassem os palpites de Lula sobre o conflito Israel x Hamas, que colocaram o Brasil na vergonhosa posição de adversário da única democracia do Oriente Médio, agora é o próprio corpo técnico do...
Como se não bastassem os palpites de Lula sobre o conflito Israel x Hamas, que colocaram o Brasil na vergonhosa posição de adversário da única democracia do Oriente Médio, agora é o próprio corpo técnico do Itamaraty que vem contribuir para o repertório de declarações injustificáveis do país em relação aos problemas na Faixa de Gaza.
O carioca Frederico Salomão Duque Estrada Meyer, 70 anos, foi aprovado no Senado como embaixador do Brasil em Israel em maio deste ano. Diplomata experiente, iniciou a carreira em 1978 e foi embaixador do Brasil no Cazaquistão e no Marrocos. Atuou como cônsul-geral do Brasil em Cantão, na China, e foi porta-voz do Itamaraty de 2015 a 2016. Além disso, serviu em Bagdá, Moscou, Genebra, Georgetown, Havana e Nova York (ONU) em diferentes períodos da carreira.
Mesmo com tanta quilometragem, Meyer disse em entrevista ao portal UOL na sexta-feira, 24, que não entende por que o grupo terrorista Hamas começou a libertar reféns. Disse o embaixador:
“Opinião puramente pessoal: eu ainda não entendi a posição do Hamas. Porque esses reféns que estão lá são uma moeda de troca. Não consigo perceber qual é o interesse do Hamas em libertar esses sequestrados. Porque depois que esses sequestrados forem entregues, qual vai ser a moeda de troca?”
“De novo, falando puramente pessoal: isso vai liberar Israel a ter uma ação ainda mais forte em Gaza. Porque uma das coisas que está contendo as ações de Israel é o medo de você atingir os reféns. Uma vez que você não tem mais reféns, Israel estaria liberado para atacar o quanto quisesse? Não sei.”
As declarações causam espanto, porque passam a impressão de legitimação moral dos sequestros – o que rendeu uma enxurrada de críticas nas redes sociais – e porque a atitude do Hamas, mesmo sendo impossível de se justificar, é muito fácil de entender:
- O Hamas nunca disse que soltaria todos os reféns, portanto o grupo continuará evidentemente com “moeda de troca”. Historicamente, sabe-se que Israel nunca sairia da mesa de negociação, mesmo que só houvesse um único refém.
- Os terroristas priorizaram a soltura de mulheres, idosos e crianças, cujo sequestro causou sérios danos de imagem ao grupo na comunidade internacional. Esse grupo também demanda cuidados muito mais complexos no cativeiro. Nenhum homem adulto foi solto.
- O Hamas usou civis sequestrados, o que é contra a Convenção de Genebra e totalmente proibido em conflitos militares, em troca de palestinos presos em Israel, a maioria envolvida em crimes violentos — muitos deles em terrorismo. Aos olhos do grupo, este sempre foi o objetivo das trocas.
- A intenção do ataque de 7 de outubro, contra um inimigo militarmente muito superior, nunca foi vencer um confronto armado direto, mas causar uma reação violenta do país atacado que levasse a mortes de palestinos civis em Gaza, inflamando a opinião pública árabe e muçulmana contra Israel.
- Depois dos históricos Acordos de Abraão, em 2020, o Hamas e seu principal patrocinador, o Irã, temiam que Israel estivesse costurando uma paz com seus principais vizinhos, para, no limite, ter seu território reconhecido. Para os radicais islâmicos, Israel precisa ser erradicado do mapa e um território árabe-muçulmano instituído “do rio ao mar”, como diz o bordão repetido nas passeatas mundo à fora.
Meyer poderia, ao menos, ter lido as declarações do próprio líderes do Hamas, Yahya Sinwar, em outubro:
“Estamos prontos para concluir imediatamente uma troca para libertar todos os prisioneiros nas prisões do inimigo sionista em troca de todos os reféns nas mãos da resistência.”
Numa entrevista dada à Deutsche Welle, empresa pública de comunicação alemã equivalente à BBC para os britânicos, nesta segunda, 27, Meyer respondeu sobre a posição brasileira oficial a respeito do conflito com platitudes de candidata à Miss Universo:
“Nós somos contra. Somos a favor da paz, é nossa posição. Somos a favor da negociação. Somos a favor do cessar-fogo. A favor dos dois Estados. Essa é a nossa posição. Nunca mudamos de posição.”
Como Israel é evidentemente contra o conflito e está reagindo contra um ataque terrorista que matou mais de 1.200 inocentes — e historicamente ofereceu diversas vezes o reconhecimento de um estado palestino em troca do reconhecimento de Israel pela comunidade árabe —, em tese a posição do Brasil seria exatamente a mesma do país de Benjamin Netanyahu, mas as semelhanças terminam nesse ponto.
Os governos petistas sempre tiveram uma posição hostil a Israel, alinhada com a extrema-esquerda internacional, e desta vez não foi diferente. Em 2014, em outro conflito envolvendo Israel e Hamas, o governo petista de Dilma Rousseff chamou o diplomata brasileiro em Tel Aviv para esclarecimentos — uma atitude de desagravo de um país em relação a outro. Como reação, o porta-voz do ministério das Relações Exteriores de Israel da época, Yigal Palmor, chamou o Brasil de “anão diplomático” numa entrevista ao The Jerusalem Post.
Até o fim de novembro, foram confirmadas as mortes de três brasileiros pelos terroristas do Hamas nos ataques de 7 de outubro: Ranani Glazer, 23 anos, Karla Stelzer, 42, e Bruna Veleanu, 24. O Brasil foi diretamente afetado pelo terrorismo do Hamas, brasileiros inocentes foram brutalmente assassinados num festival de música, mas a falta de empatia com as vítimas e suas famílias é evidente.
O Brasil tem centenas de embaixadores, mas, em situações críticas como essa do Oriente Médio, provamos que não conseguimos fazer nada mais do que embaixadinhas retóricas na tentativa de, a partir de uma diplomacia freestyle, marcar mais um gol contra a inserção do país na comunidade internacional.
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