O ressurgimento dos ‘zines’ na América de Trump
Meio analógico de baixo custo se torna ferramenta de resistência contra vigilância e batidas de imigração em comunidades
Pequenas revistas autopublicadas e independentes, denominadas zines, ressurgiram nos Estados Unidos. Estes materiais, feitos de maneira artesanal, elaborados a partir de uma única folha de papel dobrada, tornaram-se um inusitado meio de resistência de moradores (muitos deles imigrantes) em cidades como Los Angeles.
Segundo o The Guardian, comunidades em diversas regiões usam o formato, que teve seu auge como mídia entre os anos 70 e 80, para distribuir informações e dicas de como se proteger do Immigration and Customs Enforcement (ICE). Exemplos de temas que circulam incluem títulos como Narcan 101, Free Palestine e manuais informativos locais.
O retorno ao papel e caneta, acessível a pessoas de todas as idades, é também uma maneira de lidar com a desconfiança em relação às plataformas digitais. Criadores e entusiastas do meio analógico citam a vigilância, o doxing e a suposta supressão de tópicos por algoritmos de mídias sociais como fatores para esta adoção.
O zine permite que as pessoas compartilhem suas opiniões e pontos de vista em um formato que não está sujeito à censura digital.
Comunicação analógica e liberdade de expressão
A facilidade e a economia na produção são vistas como vantagens para a disseminação rápida de informações importantes. Mariame Kaba, co-fundadora da Black Zine Fair, no Brooklyn, enfatiza a falta de obstáculos tecnológicos para a produção dos zines. “Há uma liberdade que as pessoas anseiam porque elas estão se sentindo tão restritas, vigiadas e, francamente, ameaçadas em tantas outras esferas que existem”, afirmou.
Kaba, que tem experiência na confecção destes materiais desde os anos 1980, explica que eles podem ser impressos com baixo custo, copiados e distribuídos aos milhares. A distribuição ocorre nas ruas, em bibliotecas públicas e em locais de reunião local.
Historicamente, os zines têm sido inerentemente sociais e políticos, originando-se nos “fanzines” de ficção científica na década de 1930. O meio servia como um espaço para compartilhar pontos de vista que, muitas vezes, eram rejeitados por publicações maiores.
Zines como ferramenta de ação e apoio comunitário
A utilidade direta dos zines é vista em mobilizações comunitárias recentes. A ilustradora Megan Piontkowski, por exemplo, criou a série How to Report ICE zines, um documento simples em PDF que se tornou viral.
O material, que requer poucas dobras e um corte para ser finalizado, foi adaptado em mais de 70 versões em inglês e espanhol, com linhas diretas de resposta rápida e recursos para diversas cidades e estados. Piontkowski, que se dedica à produção no tempo livre, expressa que “detesta sentir-se impotente quando coisas horríveis estão acontecendo” e busca oferecer suporte através da arte.
Em Chicago, após a Operação Midway Blitz do ICE, festas de dobradura se popularizaram como forma de ação social. A moradora Emily Hilleren organizou encontros em bares para montar e distribuir o zine Form a Crowd, Stay Loud.
Esses eventos atraíram participantes que querem contribuir, que sentem vontade de fazer “algo tangível”, em vez de apenas observar o noticiário. O aspecto social destas reuniões é um atrativo para aqueles que não querem ficar em casa lendo notícias ruins – e não fazendo nada a respeito – no celular.
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