Rodolfo Borges na Crusoé: Carnavais, malandros e pênaltis
Estaria a busca pela famigerada justiça social na gênese da lamentável operação do árbitro do vídeo no Brasil?
Rodou o mundo a cena em que Yarlen, machucado fora de campo, é carregado por um companheiro do Botafogo para dentro das quatro linhas, com a intenção de ganhar tempo, para, logo em seguida, ser arrastado para fora de novo por jogadores do Fluminense. O pior do futebol brasileiro foi destilado em 15 segundos e imortalizado para a história, ao estilo do gol de mão de Maradona na Copa de 1986.
“O malandro é um ser deslocado das regras formais, fatalmente excluído do mercado de trabalho, aliás definido por nós como totalmente avesso ao trabalho e individualizado pelo modo de andar, falar e vestir-se”, diz o antropólogo Roberto DaMatta em Carnavais, Malandros e Heróis, em que fui buscar entender de onde saiu essa nossa mania de burlar as regras e tentar enganar o juiz.
DaMatta diz que “o campo do malandro vai, numa gradação, da malandragem socialmente aprovada e vista entre nós como esperteza e vivacidade, ao ponto mais pesado do gesto francamente desonesto”. Mas é ao analisar a figura de Pedro Malasartes, o malandro clássico, que surge uma hipótese para tantos pênaltis cavados e cotoveladas imaginárias nos gramados nacionais:
“Na linguagem moderna do Brasil, Pedro Malasartes, acima de ser um herói sem caráter, é um subversivo, um perseguidor de poderosos, para quem sempre leva a dose de vingança e destruição que denuncia a falta de um relacionamento social mais justo entre o rico e o pobre, além de revelar o código moral que deve pautar o relacionamento entre fortes e fracos, fundado sobretudo no envolvimento e respeito moral entre ricos e pobres.”
Quer dizer, a famigerada sede por justiça social pode estar na gênese do fingimento do goleiro que simula contusão para esfriar o jogo. É claro que o autor da cera não está exatamente em busca de justiça ao desafiar o cronômetro enquanto se contorce pelo chão, mas seu comportamento estaria condicionado pela desigualdade social brasileira, que desenvolve nos mais desafortunados um código pervertido de justiça.
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