Política para controlar inflação pode atrapalhar campanha de Bolsonaro em 2022
Jair Bolsonaro não terá um ano eleitoral fácil em 2022. Mesmo com a expectativa de que o PIB cresça 4,6%, o presidente vê sua popularidade em queda, com a CPI da Covid de olho em corrupção no Ministério da Saúde e sem tanta margem para aumentar gastos...
Jair Bolsonaro não terá um ano eleitoral fácil em 2022. Mesmo com a expectativa de que o PIB cresça 4,6%, o presidente vê sua popularidade em queda, com uma CPI da Covid de olho em corrupção no Ministério da Saúde e sem tanta margem para aumentar gastos.
O custo da pandemia tem sido alto e o orçamento público tem limites. Se em 2020 foram R$ 509 bilhões para enfrentar os efeitos do coronavírus em todas as áreas, da saúde à economia; o desembolso em 2021 foi de R$ R$ 74,1 bilhões até o começo de abril.
Com pouco espaço para gastar e fazer populismo fiscal, Bolsonaro enfrentará um cenário de preços sob pressão — as expectativas do último Boletim Focus preveem inflação de 5,9% no fim de 2021, com queda para 3,75% ao longo de 2022 — e um país mais vacinado, já pensando em de onde virá o dinheiro para a retomada econômica.
As preocupações inflacionárias que levaram o BC a aumentar a Selic de 3,5% para 4,25% na última reunião do Copom não são recentes e já há previsão de novo aumento de 0,75% na próxima reunião, em agosto.
Os sucessivos aumentos encarecem o custo do dinheiro, reduzindo a participação do setor privado na retomada econômica. “O efeito é catastrófico para a economia e sempre pior para quem é mais pobre”, diz a economista especializada em contas públicas Deborah Bizarria.
E o auxílio emergencial — que já foi de R$ 600 e manteve a economia artificialmente aquecida —, mesmo podendo ser prorrogado enquanto durar a pandemia, segundo o próprio Paulo Guedes, perderá parte de seu poder de compra.
“Qualquer governo que tenta se reeleger num cenário como o nosso fica tentado a baixar a taxa de juros artificialmente. As empresas vão pegar dinheiro, vai ter aumento artificial da atividade econômica e nós já vimos o custo disso”, afirma a economista.
Em 2014, Dilma, que também enfrentava um cenário econômico ruim e de aumento da Selic, que chegou a 11,75% em dezembro daquele ano, usou os bancos públicos para baratear o custo dos empréstimos.
O cientista político Magno Karl afirma que exemplos como esse só reforçam o “histórico de populismo” praticado no Brasil e que foi esse “um dos motivos para a independência do BC”, para impedir que “o governo use a instituição como instrumento de política econômica”.
“Vimos o uso ativo do BC no governo Dilma, que interviu em preços controlados, assim como para baixar a taxa de juros, mesmo com inúmeras indicações de que, em 2014, poderíamos ter um quadro inflacionário mais complicado.”
A bem da verdade, Bolsonaro pede até a Deus para que o STF confirme a constitucionalidade da lei que deu autonomia ao BC. Mas, mesmo com o populismo e a chiadeira sobre as altas de juros não serem mais habituais, como foram com Lula, Dilma e FHC, o presidente nunca foi um liberal.
Vale lembrar que Bolsonaro disse, após intervir na Petrobras para trocar o presidente da estatal, que o mercado fica “irritadinho” por “qualquer negocinho, qualquer boato na imprensa”, e das ocasiões em que o capitão reformado reclamou das altas no preço dos combustíveis.
“Pessoal, se o Brasil aí não tiver um rumo, todo o mundo vai perder. Vocês também, pô”, afirmou o capitão reformado na ocasião.
“Muitos ficaram apreensivos na primeira alta de juros [a Selic, pelo BC], se Bolsonaro faria algum comentário. Mas ele não deu nenhum sinal de desconforto. Não o vejo com esse populismo sobre a política monetária na cabeça. É diferente na política fiscal. Falou esses dias do Bolsa Família mais forte, sem um alinhamento direto com o Ministério da Economia. Embora Paulo Guedes tenha vencido as disputas, elas não têm sido suaves”, afirmou Caio Megale, economista-chefe da XP.
Medidas anticíclicas
A autonomia impõe que o Banco Central, antes sob o guarda-chuva do Ministério da Economia e consequentemente do presidente, seja classificado em lei como autarquia sem “vinculação a ministério, de tutela ou de subordinação hierárquica”.
O presidente e os oito diretores do BC passam a cumprir mandatos de quatro anos não necessariamente coincidentes com as mudanças na Presidência da República. Mas as indicações continuam sendo analisadas pelo Senado.
O presidente do BC assumirá o posto no terceiro ano de mandato do chefe da República, em 1º de janeiro. Já os diretores serão nomeados escalonadamente, a cada biênio.
E essa vigilância independente do Banco Central sobre a inflação tem impacto direto sobre o Brasil que Bolsonaro precisará agradar para convencer que merece mais quatro anos no Planalto.
Não à toa tem se gastado muito para terminar obras não finalizadas por governos anteriores, inaugurar conjuntos habitacionais — previsão de R$ 12 bilhões no orçamento — e viajar pelo país fazendo showmícios antecipados, tudo transmitido pela TV Brasil — com dinheiro do contribuinte.
“As medidas anticíclicas já estão acontecendo”, diz a economista Deborah Bizarria.
E tudo isso é para manter o apoio do Centrão, que cobrará um preço mais alto depois das denúncias de Luis Miranda reveladas por O Antagonista, sobre esquema de corrupção no Ministério da Saúde para compra privilegiada da Covaxin.
“O Centrão não é sócio de fracasso. É um grupo político muito pragmático, que não nasceu colado com Bolsonaro, assim como não nasceu com Lula, Dilma, Temer e FHC. Se o presidente der sinais de que não consegue cumprir acordos, não há nada que segure o Centrão”, diz o cientista político Magno Karl.
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