Quem são os “clippers”? Seu filho pode ser um
Como e por que empresas e criadores de conteúdos têm aumentado o investimento em uma certa modalidade de marketing digital
Empresas consolidadas, startups recém chegadas e criadores de conteúdo de todo tipo e para todos os gostos estão gastando cada vez mais dinheiro na contratação de “clippers” – ou de equipes inteiras de clippers – para fragmentar vídeos longos em cortes viralizáveis. Em português: a galera que faz os cortes. O objetivo é saturar plataformas como TikTok e Instagram, tornando o conteúdo quase impossível de ser evitado pelos usuários.
Esse método de marketing digital, que ganhou força desde os primeiros dias do TikTok, virou uma atividade profissional altamente lucrativa. Tem gente que só faz isso na vida. Se um dia seu filho ou sua filha disserem: “Pai, mãe, quero ser clipper” – não estranhe (ou estranhe). Mas é bom já saber do que se trata.
O que é marketing de saturação?
O trabalho de clipping é um dos segmentos de crescimento mais rápido no marketing. Em vez de apenas publicar material em suas próprias contas, empresas e criadores remuneram (em alguns casos, muito bem) os clippers para que inundem as mídias sociais com vídeos curtos e pegajosos.
Kanoah Cunningham, 24, recém-formado em negócios na Universidade do Arizona, é um representante desse novo proletariado digital. Ele deixou um emprego em finanças corporativas para administrar sua própria equipe de oito clippers.
A operação de Cunningham gera ganhos mensais estimados entre 20 e 30 mil dólares. Ele afirma que o poder da viralização de qualquer coisa, marca ou pessoa, depende disso: “A única maneira de ser famoso no mundo da internet de hoje é com clipes [cortes]”.
Qualquer material pode ser clipado: podcasts, debates, montagens de redes sociais ou mesmo filmes. O processo de edição pode levar menos de um minuto, utilizando ferramentas gratuitas de edição disponíveis online.
A remuneração dos clippers geralmente se baseia nas visualizações, variando de cinquenta centavos a dois dólares a cada mil visualizações. Isso incentiva os profissionais a identificar os momentos mais compartilháveis do conteúdo original.
Startups como a Lovable, a fabricante de robôs humanoides 1X e a empresa de eletrônicos Nothing já recrutaram clippers para multiplicar demonstrações de produtos e aparições em podcasts pela internet. O negócio é sério.
Estratégias de viralização e orçamentos altos
A Cluely, uma startup de anotações por inteligência artificial, também contrata clippers para espalhar seu conteúdo promocional. Roy Lee, seu fundador, tem só 21 anos. Ele considera inútil a criação de conteúdo longo sem ampla distribuição por cortes.
Como todo rapaz de 21 anos, Lee tem certeza do que fala e fala do jeito que acha que deve: “Você é estúpido se fizer um podcast de uma hora e publicá-lo em apenas um canal”. Ele ensina: “O único jeito de garantir um momento viral é postá-lo em milhares de contas diferentes”. O conteúdo clipado da Cluely atinge cerca de 800.000 visualizações diárias em plataformas como Instagram e TikTok.
Para capturar a atenção em plataformas superlotadas, os clippers recorrem frequentemente à publicação de material provocativo ou ultrajante (alô, polarização!). Cunningham, o ex-funcionário de finanças, explicou que a “construção de uma narrativa” é o que distingue os profissionais mais eficientes. Não é só cortar por cortar. O corte tem de ser preciso para criar uma certa impressão. A verdade que lute.
Cunningham soprepõe textos ao vídeo para chamar a atenção da audiência. Por exemplo: se um criador de conteúdo entra em um carro esportivo de 200 mil dólares, o clipper cola a legenda: “Não é possível que justo essa pessoa acabou de comprar o carro mais caro do mundo!”
A veracidade do conteúdo é secundária. “Não importa se é verdade”, ele disse, porque “as pessoas assistirão”. Quem nunca?
O investimento das empresas neste tipo de marketing é cada vez mais alto.
Nathan Resnick, sócio de uma holding que supervisiona negócios em diversos setores, emprega cinquenta clippers, e paga a eles cerca de quinze mil dólares por mês.
Resnick justifica o custo em comparação com os canais tradicionais de publicidade digital: “Não é loucura, quando consideramos que estamos gastando 250 mil por mês no Google e Meta para direcionar tráfego para nossos sites”.
Max Peterson, de 22 anos, gerencia a Clip, um mercado para clippers. A 1X Technologies procurou Peterson em novembro, com um orçamento de 40 mil dólares, para viralizar seu robô humanoide movido a IA. Clipes do robô, entre eles, uma aparição controversa em uma transmissão ao vivo com o criador Kai Cenat, geraram mais de 500 milhões de visualizações combinadas no TikTok em uma semana.
A campanha gerou repercussão negativa após a exibição de Cenat e amigos empurrando o robô (lembram disso? O robô apanhando?). Dar Sleeper, vice-presidente de marketing da 1X, falou sobre a reação interna: “Pessoas na empresa pensaram: ‘O que diabos este garoto está fazendo’”.
Mas é aquela coisa: viralizou. “Uma semana depois, seus priminhos estavam falando sobre isso na mesa de Ação de Graças”, disse cinicamente o dono da empresa.
O sucesso dos clippers no TikTok independe de um grande número de seguidores. Vídeos são recomendados com base na interação – curtidas, comentários, compartilhamentos e tempo de visualização. Isso permite que um clipe bem editado viralize mesmo a partir de uma conta sem seguidores. O que importa é o corte preciso, ainda que sugira interpretações imprecisas.
Verdade, mentira? Isso já é uma outra história.
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