PF identificou plano de fuga para Bolsonaro
Investigadores interpretam a viagem de Bolsonaro para Orlando em 2022 como a execução tardia de um plano bolado em 2021 e encontrado no computador de Mauro Cid
A investigação da Polícia Federal que embasou o pedido de indiciamento de Jair Bolsonaro e 36 de seus aliados inclui um plano de fuga para o ex-presidente. O sigilo sobre a investigação foi derrubado pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes nesta terça-feira, 26.
“A investigação identificou um plano, adaptado da doutrina militar, para evasão e fuga do então presidente da República JAIR BOLSONARO do país, caso seu ataque ao poder Judiciário e ao regime democrático sofresse algum revés que colocasse sua liberdade em risco”, diz o relatório.
Segundo a PF, o plano estava em notebook do tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro. O planejamento foi organizado em cinco slides.
Cinco slides
“A análise dos dados armazenados no notebook apreendido em poder de MAURO CESAR CID, identificou uma apresentação, criada em 22 de março de 2021, no formato ‘.pptx’, que previa o uso do dispositivo denominado RAFE/LAFE, em benefício do ex-presidente JAIR MESSIAS BOLSONARO, ainda que desprovido de apoio formal do Exército Brasileiro, em caso de descumprimento de uma ordem judicial emanada do Supremo Tribunal Federal”, descreve a investigação.
Rafe e Lafe, descreve a PF, são siglas militares para “Rede de Auxílio à Fuga e Evasão” e “Linha de Auxílio à Fuga e Evasão”, respectivamente.
Segundo a investigação, o documento encontrado no computador de Cid é composto por cinco slides com telas que incluem os logotipos do DRC (Destacamento de Reconhecimento e Caçadores) e do COpEsp (Comando de Operações Especiais do Exército), “fato que reitera o uso de técnicas de forças especiais do Exército no interesse da organização criminosa”, diz a PF.
Três cenários
Segundo a investigação, o o plano de fuga estabelece três cenários hipotéticos de decisões do STF e do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) “que seriam contrárias aos interesses do então presidente da República JAIR BOLSONARO”: “STF interfere no Executivo”; “STF cassa a chapa para 22” e “STF (TSE) barra a PEC aprovada pelo Congresso do voto impresso”.
“Em seguida, o próximo slide descreve a decisão do então presidente JAIR BOLSONARO em não cumprir a ordem do STF. O próximo documento coloca uma possível premissa em que o ex-presidente não teria o apoio formal do Exército brasileiro”, segue o relatório.
Armamento e munição
Na sequência, são descritas três ações possíveis para proteger Bolsonaro: “Proteção do Pr no Planalto e Alvorada – sem apoio do GSI”; “Condições de ocupar Etta Estrg como forma dissuasória para mostrar apoio ao Pr”; e “ECD exfiltrar o Pr para fora do país”.
“Na ação de ‘Proteção do Pr no Planalto e Alvorada – sem apoio do GSI‘, haveria a cooptação de militares do Gabinete de Segurança Institucional – GSI, que uma vez acionados estariam ocupando posições chaves nos Palácios do Planalto e da Alvorada para auxiliar na exfiltração do então presidente da República”, dizem os investigadores.
Esse plano teria previsto armamento e munição, guardados em um cofre, como diz um dos slides (foto): “Armamento e munição ECD (providenciar cofre e deixar ‘ao alcance’)”. O termo “ECD” significa “em condições de”, segundo a PF.
“Estrutura estratégica”
“A ação descrita como ‘Condições de ocupar Etta Estrg como forma dissuasória para mostrar apoio ao Pr‘, utiliza expressões estritamente do meio militar. A consulta realizada nos repositórios oficiais permite descreve o termo ‘Etta Estrg’ como uma abreviação para ‘estrutura estratégica’. São instalações, serviços, bens e sistemas que, se forem interrompidos ou destruídos, provocarão sério impacto social, ambiental, econômico, político, internacional ou à segurança do Estado e da sociedade. O mesmo que INFRAESTRUTURA CRÍTICA”, descrevem os investigadores.
Segundo a PF, “dentro do contexto planejado, um dos objetivos era a ocupação de estruturas estratégicas por militares que tivessem aderidos ao intento golpista, para mostrar apoio ao então presidente JAIR BOLSONARO e com isso, possivelmente, inibir qualquer ação do Estado decretada pelo Poder Judiciário”.
Fuga
“O último ato descrito no plano de fuga seria ‘montar e operar um RAFE/LAFE para exfiltrar o Pr para o exterior’. Ou seja, após garantir a segurança de JAIR BOLSONARO, os militares golpistas criariam uma rede de auxílio para acolher o ex-presidente e conduzi-lo para fora do território nacional”, diz a investigação.
A PF resume tudo assim:
“Os elementos de prova colhidos demonstram que os investigados planejaram o cenário de enfrentamento de JAIR BOLSONARO com o Poder Judiciário, que levaria a uma ruptura institucional. Conforme exposto, tal fato ocorreu de forma mais incisiva no dia 07 de setembro de 2021, quando o então presidente ameaçou o STF e seus ministro, evidenciando a prática de atos contra o regime democrático, restringindo a atuação da Suprema Corte brasileira.”
“Nesse contexto, mais uma vez se evidencia a utilização de técnicas militares pelos investigados contra o próprio Estado brasileiro com o objetivo de garantir a fuga de JAIR BOLSONARO caso a tentativa de Golpe de Estado fosse frustrada”, analisam os investigadores.
“Utilizado no final do ano de 2022”
“Apesar de não empregada no ano de 2021, o plano de fuga foi adaptado e utilizado no final do ano de 2022, quando a organização criminosa não obteve êxito na consumação do golpe de Estado”, diz o relatório da PF, em referência à viagem de Bolsonaro para Orlando em 30 de dezembro de 2022.
“Conforme será descrito nos próximos tópicos, JAIR BOLSONARO, após não conseguirem o apoio das Forças Armadas para consumar a ruptura institucional, saiu do país, para evitar uma possível prisão e aguardar o desfecho dos atos golpistas do dia 08 de janeiro de 2023 ( ‘festa da Selma’)”, diz o relatório.
Leia mais: Organização criminosa teria começado ainda em 2019, segundo PF
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