Parecer sugere que Gonet atropelou “boa prática” no caso Moraes
“Trata-se de uma determinação tecnicamente bastante temerária e desnecessária", diz parecer da PGR sobre decisão de Dias Toffoli que impediu o procurador de copiar as imagens da alegada agressão no aeroporto de Roma
O procurador-geral da República, Paulo Gonet (à esquerda na foto), desconsiderou um parecer da Secretaria de Perícia, Pesquisa e Análise da Procuradoria ao denunciar a família Mantovani ao Supremo Tribunal Federal (STF) pelo incidente com o ministro Alexandre de Moraes (à direita na foto) em Roma, informa O Globo.
O jornal expôs o conteúdo do parecer, segundo o qual “a boa prática preconiza que toda a análise pericial e investigativa, sempre que tecnicamente possível, seja realizada em uma cópia de trabalho absolutamente fiel à original, justamente para evitar contaminação da evidência ou prova digital”.
Gonet não obteve cópia dos registros da alegada agressão a Moraes no aeroporto de Roma. Por determinação de Dias Toffoli, o procurador-geral limitou-se a visitar o gabinete do ministro para acessar as imagens, assim como a defesa dos acusados.
Gonet denunciou pelos crimes de calúnia e injúria o empresário Roberto Mantovani Filho, sua mulher, Andréia Munarão, e o genro do casal, Alex Zanatta, pelo incidente com Moraes e família no aeroporto de Roma. O empresário também responde por injúria real, quando há violência, pela suposta agressão ao filho de Moraes.
“Levemente”
A palavra “suposta” é crucial no caso, porque não há prova de que a agressão de fato ocorreu. Um relatório da polícia italiana anexado à investigação brasileira afirma que o empresário encostou “levemente” nos óculos do filho de Moraes. Em depoimento, o ministro relatou que seu filho levou um “tapa” do empresário.
Moraes também relatou ter sido chamado de “bandido”, “comunista”, “ladrão” e “fraudador das eleições”. Ele era o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) durante as eleições de 2022, que conduziu com mão pesada.
Em fevereiro, o delegado Hiroshi de Araújo Sakaki concluiu, com base nas imagens das câmeras de segurança do aeroporto, que não possuem som, que Roberto Mantovani cometeu o crime de “injúria real”, mas decidiu não indiciá-lo, porque a ofensa foi de menor potencial ofensivo e ocorreu fora do país.
Meses depois, em junho, após novas diligências determinadas pelo ministro Dias Toffoli, um novo delegado, Thiago Severo de Rezende, decidiu por indiciar os três familiares. Para o novo titular do caso, a versão de Moraes, de que foi hostilizado por razões políticas, é “totalmente coerente e apoiada nos demais meios de prova”.
Denúncia
Como consequência da mudança de interpretação, Gonet denunciou os três ao STF. Mas o fez sem obter cópia das imagens registradas no aeroporto de Roma.
“Toffoli autorizou no ano passado que a PGR e a família Mantovani – que nega ter agredido Moraes no episódio – pudessem assistir às imagens apenas mediante agendamento prévio e assinatura de um termo de sigilo, com acompanhamento de um servidor e somente na sede do STF”, destaca O Globo, acrescentando que Toffoli impôs sigilo às imagens.
O jornal segue: “Antes de Gonet assumir o comando da PGR, em dezembro do ano passado, as restrições impostas por Toffoli foram contestadas pela gestão interina de Elizeta Ramos. A equipe de Elizeta recorreu ao parecer da Secretaria de Perícia, Pesquisa e Análise para insistir na obtenção da íntegra das imagens, em novembro”.
Contestação
O parecer da Secretaria de Perícia, Pesquisa e Análise da PGR é taxativo ao dizer que a decisão de Toffoli “na prática, tende por inviabilizar a execução das atividades técnicas” e “vai de encontro às melhores práticas adotadas no mercado e na academia”.
“Trata-se de uma determinação tecnicamente bastante temerária e desnecessária, haja vista que o dispositivo questionado e os dados lá mantidos, por diversos fatores, poderiam ser indevidamente excluídos ou editados, intencionalmente ou não”, diz o parecer usado na contestação, destacando que o perito que analisa as imagens precisa fazê-lo com as próprias ferramentas em seu local de trabalho.
“Dessa forma, realizar as atividades de cunho pericial e/ou investigativo fora do adequado ambiente tende a inviabilizar o adequado desempenhar das atividades. Sob o ponto de vista jurídico, a realização das atividades de cunho pericial e/ou investigativo num ambiente não controlado pelos peritos/analistas poderia colocar sob questionamentos a adequada manutenção da cadeia de custódia”, segue o texto.
Em nota enviada a O Globo, o advogado Ralph Tórtima Filho, defensor da família Mantovani, disse que a acusação apresentada ao STF foi “fruto de uma investigação arbitrária, marcada por abusivas e reiteradas ilegalidades, e que merecia o arquivamento sugerido pelo próprio delegado da polícia federal que a presidiu”.
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