O Senado não pode servir de papel higiênico para o porcalhão
O repórter Diego Amorim criou o que chamo de "cobertura ativa" do Congresso: ele não está lá apenas para perguntar, mas também para cobrar dos parlamentares, não importa de qual partido ou ideologia, que atuem com transparência e honestidade. Deputados e senadores têm mandato popular, mas nem sempre -- ou quase nunca -- a maioria deles expressa a vontade de quem os elegeu. Diante dessa constatação, acho legítimo que um jornalista, usando apenas dos fatos concretos, procure ser a voz de quem não se sente inteiramente representado...
O repórter Diego Amorim criou o que chamo de “cobertura ativa” do Congresso: ele não está lá apenas para perguntar, mas também para cobrar dos parlamentares, não importa de qual partido ou ideologia, que atuem com transparência e honestidade. Deputados e senadores têm mandato popular, mas nem sempre — ou quase nunca — a maioria deles expressa a vontade de quem os elegeu. Diante dessa constatação, acho legítimo que um jornalista, usando apenas dos fatos concretos, procure ser a voz de quem não se sente inteiramente representado.
Não vou entrar numa peroração entediante sobre jornalismo e imparcialidade — inclusive porque sempre tive a convicção de que há vários tipos de jornalismo, como aquele que narra friamente verdades de forma a transmitir mentiras. É a parcialidade imparcial. O que interessa aqui é o sentimento de Diego Amorim diante do que está assistindo de perto no Senado. E ao que ele está assistindo, desanimado, é uma vergonha.
De acordo com as notícias que Diego está publicando neste site e de um breve relato feito diretamente a mim, a maioria dos senadores não quer referendar o afastamento do calipígio Chico Rodrigues determinado por Luís Roberto Barroso. O argumento é o de que se trata de interferência indevida do ministro no Legislativo. Foi esse argumento que levou a que Aécio Neves voltasse a frequentar o Senado, depois de ser afastado da casa pela Primeira Turma do STF, em 2017, no âmbito do processo que o acusa de ter recebido propina do campeão nacional Joesley Batista.
Vamos imaginar que os senadores tenham razão, embora Luís Roberto Barroso tenha um bom ponto ao dizer que lhe pareceu “uma solução natural e óbvia que alguém que está sendo investigado por desvios na saúde não seja responsável pela alocação desses recursos”. A contrariedade com a decisão do ministro seria um motivo para deixar que Chico Rodrigues continue a exercer o seu mandato, depois de ser pego com dinheiro escondido na bunda? (Como disse na Crusoé, sou velho demais para usar eufemismos.) Não, né? Mas, ao que tudo indica, é o que está para acontecer. Apenas uma ínfima minoria quer, mais do que afastá-lo, cassá-lo. Até o momento, a representação contra Chico Rodrigues no Conselho de Ética, do qual o calipígio faz parte, teve o apoio de apenas dez dos 81 senadores. De acordo com Diego Amorim, a perplexidade geral no Senado é apenas com a maneira escolhida por Chico Rodrigues para esconder a bufunfa, não com o fato igualmente indecente de ele ter em casa dinheiro em espécie surrupiado dos recursos destinados a combater a Covid-19. É uma boa medida da estatura moral em Brasília.
A maioria dos senadores, aparentemente, quer é transformar o julgamento de Chico Rodrigues no julgamento da decisão de Luís Roberto Barroso e nada mais. Prepare-se para ouvir discursos indignados em defesa da separação dos poderes. É um truque que já foi aplicado há três anos, como disse no início do artigo. Só que desta vez há literalmente um traseiro emporcalhado de fora. A forma é indissociável do conteúdo e a memória olfativa é a mais duradoura que existe (Diego Amorim corre o risco de ter de usar máscara depois da pandemia). O Senado não pode, assim, servir de papel higiênico vagabundo para o porcalhão, sob pena de perder o pouco respeito que lhe resta da parte dos cidadãos que ainda creem na democracia.
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