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Mandetta e o negacionismo positivo

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5 minutos de leitura 25.12.2020 12:00 comentários
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Mandetta e o negacionismo positivo

Personagem “invisível” no primeiro ano do governo Jair Bolsonaro e com suspeitas de corrupção pré-ministério a assombrá-lo, Luiz Henrique Mandetta ganhou todos os holofotes em 2020 durante a crise da pandemia de Covid-19. Após o primeiro caso da doença ser confirmado no Brasil, em 26 de fevereiro, o então ministro da Saúde passou...

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Mandetta e o negacionismo positivo
Foto: Antonio Cruz/Agência Brasil

Personagem “invisível” no primeiro ano do governo Jair Bolsonaro e com suspeitas de corrupção pré-ministério a assombrá-lo, Luiz Henrique Mandetta ganhou todos os holofotes em 2020 durante a crise da pandemia de Covid-19.

Após o primeiro caso da doença ser confirmado no Brasil, em 26 de fevereiro, o então ministro da Saúde passou a conceder entrevistas coletivas diárias e centralizou a comunicação oficial sobre as estratégias de enfrentamento à pandemia.

O protagonismo do subordinado logo causou desconforto em Jair Bolsonaro, que chegou a classificar a pandemia de “histeria e a comparar a doença a uma “gripezinha“.

Contrariando a OMS e o próprio ministro da Saúde, Bolsonaro ignorou as medidas de isolamento e participou de manifestações organizadas por apoiadores em Brasília que pediam, entre outras coisas, o fechamento do Congresso Nacional e STF.

Mandetta afirmou que Bolsonaro deveria ter evitado aglomerações: “É ilegal? Não. Mas a orientação é não”.

Em abril, Bolsonaro admitiu divergências com o ministro e disse que faltava humildade a Mandetta: “A gente está se bicando há algum tempo”.

Pouco depois, em conversa com apoiadores em frente ao Palácio da Alvorada, o presidente afirmou que algo “subiu à cabeça” de integrantes do seu governo. E disse, sem citar diretamente o ministro da Saúde, não ter medo de usar a caneta contra aqueles que “viraram estrelas”:

A hora dele não chegou ainda, mas vai chegar. A minha caneta funciona.

O ex-ministro tentou modular o discurso com Bolsonaro. O ajuste, contudo, durou pouco. Ciente da fritura política, Mandetta abriu o jogo numa entrevista ao Fantástico, em que afirmou que o governo federal deveria ter “uma fala única” no combate à pandemia e que o “brasileiro não sabe se escuta o ministro ou o presidente”.

A entrevista foi considerada o estopim para sua demissão. Em 16 de abril, Mandetta anunciou sua saída do Ministério da Saúde.

Em discurso de despedida, reafirmou sua defesa das medidas de isolamento adotadas por prefeitos e governadores e menosprezadas por Bolsonaro.

A maioria esmagadora dos brasileiros foi contrária à demissão de Mandetta. O ministro deixou a pasta com aprovação de 76% da população, mais que o dobro do que tinha Bolsonaro, 33%.

Em agosto, Mandetta publicou um livro sobre os bastidores políticos dos três meses em que comandou o combate à crise do novo coronavírus no país.

Relatou que Bolsonaro fora alertado de que o vírus poderia matar 180 mil pessoas no Brasil:

Primeiro ele negou a gravidade da Covid-19, falando que era só uma ‘gripezinha’. Depois ficou com raiva do médico, ou seja, de mim. Depois partiu para o milagre, que é acreditar na cloroquina.

Segundo o ex-ministro da Saúde, Bolsonaro insistia em reproduzir teorias conspiratórias e lhe disse que o coronavírus era “uma arma biológica chinesa” para levar a esquerda de volta ao poder na América Latina.

Em entrevistas, afirmou ainda que Bolsonaro “conduziu os brasileiros para um desfiladeiro” e teve um papel “central” em levar o país para uma catástrofe sanitária.

Disse que o presidente “jogou a favor de quem eu mais combato na vida, que é a morte”.

No dia 8 de agosto, quando o país atingiu a marca de 100 mil mortes pela doença, Mandetta responsabilizou Bolsonaro e disse que “o fator presidente foi preponderante” na tragédia.

Sobre a guerra da vacina entre Bolsonaro e João Doria, Mandetta disse ao Valor que o governo errou ao apostar suas fichas “numa vacina só”.

Um grande erro. Nenhum laboratório do planeta tem condição de abastecer, com duas doses, o que o Brasil precisa. O Brasil tinha que ter feito é botar um pouco de dinheiro na Pfizer, um pouco na AstraZeneca, um pouco na Moderna, um pouco na Coronavac. Em agosto eu alertei para que começasse a comprar seringa e agulha. Hoje está em falta no mercado. Doria pegou o lado ciência, e o outro o lado anti-ciência. Doria gostou desse debate, porque estava sempre um passo à frente. No final do ano, na questão do registro, aí o Doria erra. Erra porque começa a falar ‘eu vou vacinar’, ‘a vacina vai ser obrigatória’. Não compete a ele. E erra quando fala que vai começar a vacinar dia 25 de janeiro com registro ou sem registro. Não pode. Isso está fora das quatro linhas. Cruzou a linha da bola. Não vale. Os dois erram. Mas pelo menos esse último erro do Doria serviu para tirar o Ministério da Saúde da inércia. Essa politização que ambos fizeram serve para o mundinho dos dois. Serve para Bolsonaro dar carne aos leões do radicalismo, da antivacina, a cloroquina, essa coisa rala. E serve ao Doria, que posa como aquele que apostou na ciência. E quem perde com a briga dos dois é a economia, o povo, a saúde brasileira.”

O ex-ministro tem dito que participará das próximas eleições, mas evita, pelo menos por enquanto, cravar uma candidatura ao Planalto em 2022. Em dezembro, ele se reuniu com o apresentador Luciano Huck, que pode tentar a presidência da República.

O negacionismo de Bolsonaro foi muito positivo para Mandetta.

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