Jerônimo Teixeira na Crusoé: O batom na estátua vale por uma confissão
A cabeleireira que escreveu “perdeu, mané” no monumento em frente ao STF expressou a ilusão de vitória dos bolsonaristas que depredaram Brasília

Como são tristes os heróis do bolsonarismo.
Não falo do ex-capitão que dá nome ao movimento, nem de seu filho que agora inventou de se apresentar como exilado político, nem da ruidosa multidão de influenciadores e youtubers que monetizam a pregação do radicalismo reacionário.
Os brasileiros comuns que, insuflados pela retórica bruta do grande líder, hoje estão na cadeia pela participação na Intentona Tonta de 8 de janeiro de 2022 – estes, sim, são tristes.
A mártir bolsonarista do momento me parece a figura mais triste de todas. Mas estava sorrindo quando deixou uma mensagem escrita a batom na estátua da Justiça, em frente ao STF: “perdeu, mané”.
Garota propaganda da anistia
Débora Rodrigues dos Santos é cabeleireira e mãe de dois filhos.
Morava em Paulínia, interior de São Paulo, e hoje está presa em Rio Claro enquanto aguarda a conclusão de seu julgamento pelo STF, no qual responde por cinco crimes.
Os ministros Alexandre de Moraes e Flávio Dino já votaram para condená-la a 14 anos de prisão. Luiz Fux pediu vistas do processo, que agora está em suspenso.
Compreende-se por que o bolsonarismo adotou-a como garota propaganda da anistia. Parece um excesso encarcerar por mais de dez anos uma jovem mãe de família sem antecedentes criminais só por umas garatujas na estátua de Alfredo Ceschiatti.
Os filhos dão ao caso uma nota de melodrama.
Entrevistada pelo site Metrópoles na saída de uma visita à prisão, Cláudia Rodrigues, irmã de Débora, falou da angústia dos meninos que há dois anos já não comem as refeições preparadas pela mãe e nem contam com a ajuda dela nas lições de casa.
Eu lamento pelos garotos. Nenhuma criança merece ser afastada da mãe de forma tão drástica.
Lamento ainda mais as escolhas que Débora fez.
Na entrevista, Cláudia Rodrigues garantiu que sua irmã está arrependida. A mensagem na estátua teria sido um “ato impensado”, no “calor das emoções“.
Ninguém, disse Cláudia, “sai de casa de batom na mão” para “pensadamente” escrever em um monumento público.
Só que Débora Rodrigues não saiu de sua casa em Paulínia na manhã de 8 de janeiro de 2023. Ela já estava em Brasília para marchar com a Horda Canarinha sobre a Praça dos Três Poderes.
O que encontrei na imprensa sobre Débora Rodrigues está quase integralmente transcrito alguns parágrafos acima.
Nada ali ajuda a entender por que ela largou casa, filhos e salão de beleza para subir no pedestal da Justiça com o batom na mão.
Nada explica como a mãe extremosa se converteu em militante extremista.
Duas palavrinhas infelizes
A frase “perdeu, mané” é citada quatro vezes no voto de Moraes pela condenação de Débora Rodrigues dos Santos, sempre para documentar crimes contra o patrimônio público.
Os crimes mais graves atribuídos à moça do batom, porém, são de natureza política: tentativa de golpe de Estado e abolição violenta do Estado de Direito respondem por nove anos e meio dos 14 a que os votos de Moraes e Dino a condenariam.
É curioso que Moraes, em seu voto, não tenha tecido qualquer consideração sobre o significado da frase traçada a batom. Ela quase vale como uma confissão.
Ao afirmar a derrota do tal “mané“, Débora estava proclamando a vitória de sua turma – aliás, de sua turba.
A origem das duas palavras é bem conhecida. Foi a resposta que Luís Roberto Barroso deu a um militante bolsonarista que o acossou nas ruas de Nova York, em novembro de 2022. “Perdeu, mané. Não amola”, disse o ministro.
Débora devolveu a…
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