Jabutis do pacote anticrime fragilizam “política repressiva de contenção criminal”, alerta jurista
Em artigo exclusivo para O Antagonista, Fabrício Rebelo, coordenador do Centro de Pesquisa em Direito e Segurança (Cepedes), afirma que os jabutis incluídos no pacote anticrime terão impacto negativo também na repressão ao crime comum. Além do 'juiz de garantias', ele cita a restrição à prisão preventiva e o limite de 24 horas para audiências de custódia...
Em artigo exclusivo para O Antagonista, Fabrício Rebelo, coordenador do Centro de Pesquisa em Direito e Segurança (Cepedes), afirma que os jabutis incluídos no pacote anticrime terão impacto negativo também na repressão ao crime comum.
Além do ‘juiz de garantias’, ele cita a restrição à prisão preventiva e o limite de 24 horas para audiências de custódia.
“Em vez de fortalecidas, as prisões provisórias foram extremamente fragilizadas com a Lei nº 13.964/19, fruto da desfiguração do ‘pacote anticrime’ do Ministério da Justiça”, alerta Rebelo, autor do livro ‘Articulando em Segurança: contrapontos ao desarmamento civil’.
Leiam a íntegra:
A redução da criminalidade, especialmente dos homicídios, foi um dos elementos mais alardeados como méritos do Governo Federal em 2019. Não é para menos. Afinal, uma diminuição estimada em mais de 20% nos crimes letais desponta como recorde de toda a série histórica. No entanto, é preciso alertar para o fato de que esse avanço está sob forte risco.
Ainda que atrelado a fatores complexos, o êxito na contenção criminal esteve vinculado à radical mudança de postura em relação ao crime, abrangendo o estímulo a políticas de repressão mais rígidas, a desarticulação de quadrilhas, o isolamento de suas lideranças em presídios mais remotos, além de programas específicos nos estados e treinamentos sob a coordenação da Secretaria Nacional de Segurança Pública (SENASP). São medidas que, necessariamente, passam pela retirada dos criminosos de circulação, como é natural em todas as políticas repressivas exitosas. E é exatamente aí que reside o problema.
Em novembro do ano passado, o Supremo Tribunal Federal modificou seu entendimento sobre a prisão em segunda instância, impedindo-a. Com isso, aumentou substancialmente a importância das prisões provisórias (temporária, em flagrante e preventiva) para qualquer política repressiva de contenção criminal. Só que, em vez de fortalecidas, estas foram extremamente fragilizadas com a Lei nº 13.964/19, fruto da desfiguração do “pacote anticrime” do Ministério da Justiça, a mesma que criou a figura do “juiz das garantias”.
Embora venha sendo esse novo magistrado o alvo das maiores críticas à Lei, a questão está longe de se resumir a ele. Já de início, há a exigência, agora imperativa, das audiências de custódia, no prazo impreterível de 24 horas e sob pena de nulidade do flagrante (CPP, art. 310). Se decretada a prisão preventiva pelo juiz das garantias, precisará ser reanalisada pelo juiz de instrução em 10 dias (art. 3º-C) e ela só é permitida em casos de “perigo gerado pelo estado de liberdade do imputado” (art. 312). Caso, ainda assim, seja mantida, todo juiz terá que reavaliar a necessidade da prisão a cada 90 dias, também sob pena de nulidade e soltura do acusado (art. 316).
São ilustrações de diversos entraves práticos à prisão, verdadeiramente insuperáveis para um Poder Judiciário deficitário, que funciona com apenas um juiz em cerca de 40% das Comarcas brasileiras e para os quais, graças a outra nova lei benéfica aos criminosos (Lei de Abuso de Autoridade), será crime manter alguém preso fora dos novos rígidos limites legais. A consequência é óbvia: as prisões se tornarão cada vez mais raras até o trânsito em julgado da condenação – que pode levar décadas -, aumentando enormemente a sensação de impunidade no país e, com ela, a prática de crimes. Os indicadores já poderão refletir isso em breve.
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