Indígenas barram Lula em evento
O movimento está insatisfeito com o governo petista e busca cobrar Lula para avançar nas políticas públicas de proteção aos povos indígenas
A organização do Acampamento Terra Livre (ATL), um dos principais eventos do movimento indígena em Brasília, decidiu não convidar o presidente Lula para participar deste ano, diferentemente do que ocorreu em 2023.
O movimento expressou insatisfação com o governo petista até o momento e busca cobrar tanto Lula quanto o Congresso Nacional para avançar nas políticas públicas de proteção aos direitos dos povos indígenas, principalmente no que diz respeito às demarcações de terras indígenas, que têm andado devagar no Executivo e enfrentado derrotas no Legislativo.
Das 14 áreas prometidas para demarcação pelo governo federal em seu primeiro ano, apenas 8 foram efetivamente demarcadas.
Desta vez Lula não vai
Em 2023, Lula foi convidado para o ATL e compareceu ao evento. Durante sua participação, anunciou as primeiras demarcações de seu novo governo e levantou uma bandeira contra o marco temporal. No ano anterior, quando ainda era pré-candidato, ele também esteve presente no acampamento.
De acordo com reportagem da Folha de S. Paulo, as últimas seis áreas que ainda precisam ser homologadas devem ser assinadas por Lula nesta quinta-feira, 18, durante o encerramento do Conselho Nacional de Política Indigenista (CNPI).
O CNPI, que foi extinto pelo governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), foi agora reativado. O objetivo do conselho é elaborar políticas públicas para subsidiar a gestão federal.
A reinstalação do CNPI já havia sido uma reivindicação do ATL. O acampamento acontece anualmente em abril, mês que concentra as celebrações culturais e políticas do movimento indígena, conhecido como Abril Indígena. O dia 19 de abril marca o Dia dos Povos Indígenas, sendo o principal evento o Acampamento Terra Livre.
Embora o presidente não tenha sido convidado para o ATL deste ano, o movimento busca ser recebido não apenas no Palácio do Planalto, mas também pelos presidentes do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), além de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e membros do governo.
Indígenas nos Três Poderes
A Folha questionou os Três Poderes e os principais ministérios, mas não obteve resposta sobre se eles receberão ou não as lideranças indígenas. Apenas o Ministério dos Povos Indígenas já tem agendas programadas.
O 20º Acampamento Terra Livre será realizado entre os dias 22 e 26 de abril. A principal pauta será a demarcação de terras, além de uma avaliação dos últimos 20 anos de luta em Brasília.
O tema do evento é “Nosso marco é ancestral”, uma crítica à tese do marco temporal que foi transformada em lei pelo Congresso Nacional com o apoio da bancada ruralista e da oposição.
Além dos debates e palestras, o evento contará com três atos principais: uma projeção nas torres do Congresso Nacional e duas marchas – uma em direção ao Ministério da Justiça, para reivindicar as demarcações, e outra em direção à Praça dos Três Poderes, para marcar os 20 anos de mobilização e cobrar políticas públicas nas áreas de saúde, educação e assistência social, por exemplo.
No início do acampamento, será divulgada uma carta com as reivindicações do movimento.
Dinamam Tuxá, coordenador da Apib (Articulação dos Povos Indígenas do Brasil), afirma, à reportagem do jornal paulistano, que a decisão de não convidar Lula faz parte de uma mudança de estratégia.
Esse modelo não estava agregando ao acampamento. Entendemos que é o momento de ir ao Palácio do Planalto para cobrar o presidente diretamente – diz ele. Vamos tentar criar um acampamento mais propositivo para impulsionar a política indigenista.
Tuxá considera o Congresso um ambiente totalmente desfavorável para os povos indígenas, mas também expressa insatisfação com as políticas públicas implementadas pelo governo. Por exemplo, ele menciona a operação yanomami em Roraima e a articulação do Executivo no Legislativo.
Ele ressalta que a aprovação do marco temporal no Congresso cria um novo obstáculo para os estudos dos territórios reivindicados e reclama que os parlamentares esvaziaram o Ministério dos Povos Indígenas e transferiram a etapa de declaração das terras indígenas para o Ministério da Justiça.
No entanto, ele lembra que nem todas as demarcações que estavam na última fase de tramitação na Casa Civil foram concluídas no primeiro ano de governo, como havia sido prometido. Ele também critica o ex-ministro da Justiça Flávio Dino, que deixou o cargo sem avançar em nenhum processo.
No balanço final, Tuxá afirma que está descontente ao constatar que o governo sacrificou a pauta indígena no Congresso para avançar em outras questões.
Bancada ruralista
Atualmente, a bancada ruralista é a mais poderosa do Congresso, contando com mais de 300 parlamentares. Em 2023, liderou diversas derrotas contra o governo Lula, como a redução dos ministérios do Meio Ambiente e dos Povos Indígenas, a aprovação do marco temporal e a derrubada de diversos vetos presidenciais, incluindo o veto a essa lei.
Apesar de Lula ter feito os vetos ao marco temporal, Tuxá afirma que não houve um grande engajamento ou mobilização do Executivo para defendê-los. Segundo ele, apenas o Ministério dos Povos Indígenas se esforçou nesse sentido. Ele espera que haja maior envolvimento de todo o governo, inclusive do presidente.
Tuxá avalia que o Ministério dos Povos Indígenas faz o possível, mas está em desvantagem em relação aos outros ministérios e não recebe apoio suficiente em suas demandas. Ele afirma que a ministra Sonia Guajajara, apesar de fazer parte do governo, ainda é vista como uma aliada e parente.
O coordenador da Apib também alerta para as novas movimentações do STF em relação ao marco temporal e expressa preocupação com as próximas eleições para presidentes da Câmara e do Senado, em 2025. Dependendo das circunstâncias e dos acordos políticos, os povos indígenas podem ser penalizados novamente.
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